Título: O BRASIL ESTÁ JOGANDO DINHEIRO PELO RALO
Autor: João Sabóia
Fonte: O Globo, 18/05/2005, Opinião, p. 7

O leitor certamente tem acompanhado de alguma forma a discussão sobre as elevadas taxas de juros no país. Afinal de contas, este é um tema que não sai do noticiário há muito tempo. Para testar a opinião do leitor sobre a questão, apresentamos a seguir uma lista de dez perguntas bastante simples.

1) O leitor acha razoável que as taxas de juros no país sejam conhecidas como as mais elevadas do mundo?

2) O leitor acha razoável que ao elevar taxa de juros básica da economia - a famosa Selic - o Banco Central (BC) esteja dificultando o crescimento econômico do país?

3) O leitor acha razoável que ao aumentar a taxa Selic o BC aumente indiretamente todas as taxas de juros do país que chegam atualmente à incrível marca de 150% ao ano no caso do cheque especial?

4) O leitor acha razoável que o BC continue elevando a taxa de juros, argumentando que está combatendo a inflação e, após nove meses de aumento da Selic, a inflação se recusa a cair?

5) O leitor acha razoável que o BC continue aumentando a taxa de juros para conter o crescimento econômico e a inflação quando grande parte da inflação se deve a preços administrados pelo próprio governo (tarifas públicas, combustíveis, telefonia etc.)?

6) O leitor acha razoável que o governo continue pagando cerca de 8% do PIB (valor de tudo que o país produz) em juros da dívida pública?

7) O leitor acha razoável que ao elevar a taxa de juros o governo dificulte a realização de novos investimentos tão necessários ao país na medida que o custo para financiá-los fica muito elevado?

8) O leitor acha razoável que ao aumentar a taxa de juros do país, o Banco Central está incentivando a valorização do real e com isso o país corre o risco de ter suas exportações menos competitivas no mercado internacional?

9) O leitor acha razoável que o programa Bolsa Família receba apenas 5% do que o governo paga de juros da dívida pública a cada ano?

10) O leitor acha razoável que mesmo com todo o esforço fiscal (aumento dos impostos e corte dos investimentos públicos) o superávit obtido pelo governo mal dá para pagar metade dos juros da dívida pública?

Provavelmente, o leitor respondeu negativamente às dez perguntas acima e deve estar se perguntando como seria possível alguém continuar defendendo a atual política de juros altos.

A resposta é relativamente simples. Aqueles que defendem a atual política monetária do BC acham que o governo está gastando muito e que deveria fazer um esforço fiscal ainda maior, especialmente na redução de seus gastos, para mostrar à sociedade (leia-se, ao mercado) sua capacidade de pagamento da dívida pública no futuro.

A alternativa à atual política monetária seria o governo apontar claramente ao mercado sua intenção de reduzir a taxa básica de juros. Em vez de o BC ajustar mensalmente a taxa Selic às expectativas do mercado, o mercado passaria a se ajustar à taxa oferecida pelo BC. Simultaneamente, deveria ser introduzido algum mecanismo de controle na conta de capitais para evitar que o país ficasse refém de eventuais ameaças de fugas de capitais.

Não há nada que possa justificar o país continuar jogando pelo ralo enormes volumes de recursos públicos ao pagar taxas de juros reais de 12% a 13% ao ano. Trata-se de um desperdício não encontrado em qualquer lugar no mundo que impede o crescimento econômico e compromete o futuro do país.

JOÃO SABÓIA é diretor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Não há justificativa ao desperdício de recursos para pagar juros de 13% ao ano