Título: LIBERDADE COMERCIAL, COM MODERAÇÃO
Autor: Armando Monteiro Neto
Fonte: O Globo, 19/05/2005, Opinião, p. 7

No mundo globalizado, o aumento da participação no comércio internacional não depende apenas de políticas e investimentos que melhorem a qualidade e a competitividade dos produtos e estimulem as exportações. É fundamental também que se tenha estratégias definidas para a integração econômica.

Com uma pauta diversificada de exportações e acentuadas diferenças regionais, o Brasil precisa contar com um forte sistema multilateral de comércio. Por isso, a Organização Mundial do Comércio (OMC), que reúne 148 países e permite a construção de alianças variadas nos diversos setores de atividades, constitui-se atualmente no fórum negociador mais importante para o país.

Esse fórum ganha importância na medida que os negociadores brasileiros enfrentam dificuldades para obter avanços significativos em temas relevantes, como a liberalização do comércio agrícola e regras para adoção de medidas antidumping, nos acordos com a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) e a União Européia. Em ambos os casos, os Estados Unidos e os países europeus condicionam concessões nessas áreas aos avanços nas negociações multilaterais.

Há, portanto, fortes evidências de que os avanços na integração econômica bilateral com os países desenvolvidos dependem do acordo na OMC. É nessa arena que os negociadores brasileiros precisam se concentrar e defender com equilíbrio os interesses comerciais dos diversos setores de atividades.

O ritmo dos trabalhos da Rodada de Doha, lançada em 2001, está sendo acelerado nos últimos meses. O objetivo é fechar o acordo até o final de 2006. Para que as negociações tenham um desfecho no próximo ano, é imprescindível que os países definam os pontos relevantes nas áreas de agricultura, bens industriais, serviços, regras comerciais e desenvolvimento.

O esboço de um acordo para esses cinco setores envolvidos na negociação deve ficar pronto para apreciação na Reunião Ministerial da OMC, marcada para dezembro deste ano em Hong Kong. A expectativa é que as regras de liberalização do comércio internacional de produtos agrícolas e industriais sejam definidas até julho deste ano.

Ao longo das negociações, o Brasil tenta obter vantagens comerciais para produtos agrícolas e enfrenta pressões para oferecer concessões nas áreas industrial e de serviços. A partir de agora, entretanto, o país não poderá mais concentrar as pressões na agricultura sem uma contrapartida em outros setores, porque os acordos em todas as áreas deverão avançar em conjunto.

Mesmo assim, os negociadores brasileiros devem considerar os desequilíbrios produzidos pela Rodada Uruguai, em que os compromissos de liberalização comercial assumidos pelos países em desenvolvimento não foram compensados com maior abertura dos mercados das nações desenvolvidas.

A coalizão empresarial, um grupo de empresários criado em 1996 pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) para acompanhar as negociações de acordos internacionais, dedica especial atenção às propostas do Brasil e dos demais sócios da OMC na área de aceso a mercados para produtos industrializados.

Nas últimas rodadas de negociações no fórum multilateral, os países desenvolvidos têm apresentado posições ambiciosas em relação à abertura dos mercados de renda média para os bens industriais. Entretanto, a expectativa da indústria brasileira é que a liberalização comercial dos produtos industrializados seja graduada por fórmulas e cronogramas de redução tarifária que permitam a adequação dos setores sensíveis à concorrência internacional.

A CNI, que vem produzindo estudos e estimulando os debates para subsidiar os negociadores oficiais brasileiros, acredita que a integração dos mercados é decisiva para a manutenção do crescimento econômico. Mas o país precisa ter clareza dos objetivos e dos compromissos gerados pelos acordos internacionais.

É essencial que os movimentos de abertura acertados na Rodada de Doha para os produtos industriais e os serviços sejam compensados por ganhos relevantes no acesso a mercados para a agricultura e maior disciplina na aplicação de medidas antidumping. Ou seja, que o acordo final da OMC equilibre as forças comerciais dos diversos países envolvidos nas negociações e promova o desenvolvimento econômico e social.

ARMANDO MONTEIRO NETO é deputado federal (PMDB-PE) e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).