Título: MESA DEIXA PASSAR LEI DE HIDROCARBONETOS
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Fonte: O Globo, 18/05/2005, O Mundo / Ciencia e Vida, p. 34

Bolívia volta a ser dona das jazidas de petróleo e gás. Petrobras deve rever investimentos no país

LA PAZ. Numa inesperada decisão, o presidente da Bolívia, Carlos Mesa, decidiu ontem enviar de volta ao Congresso sem alterações a Lei de Hidrocarbonetos já aprovada pelo Legislativo no início do mês. A lei foi promulgada logo em seguida pelo presidente do Congresso, Hormando Vaca Diez, em meio a uma onda de protestos em que os movimentos populares acusam o governo de favorecer as multinacionais, uma vez que eles preferiam uma proposta mais radical.

A legislação aprovada aumenta a renda da Bolívia na exploração do petróleo e do gás natural, recupera para o país a propriedade das jazidas, recria uma empresa estatal para atuar na área e obriga as multinacionais a formularem um modelo de produção compartilhada com o Estado.

- Esta lei é melhor do que a que estava vigente - disse Vaca Diez.

No Rio, uma fonte ligada à diretoria da Petrobras disse que a empresa reveria todos os seus investimentos na Bolívia, avaliando os impactos da nova carga tributária em seus negócios. A Petrobras é a maior empresa na Bolívia, onde já investiu US$1,5 bilhão atuando em produção, transporte de petróleo e gás, refino e distribuição de combustíveis.

Evo Morales diz que apresentará emendas

A Petrobras poderá será afetada, principalmente, como produtora de gás natural. Segundo a fonte da empresa, o aumento de impostos não deverá afetar os preços do gás natural importado da Bolívia, que tem preços fixos firmados em contratos com o consórcio produtor. O contrato é de 30 milhões de metros cúbicos por dia e atualmente está em 22 milhões de metros cúbicos.

A expectativa era de que Mesa alterasse o texto da lei aprovada pela Câmara dos Deputados, pois ela institui a cobrança de 32% de impostos sobre a produção sem qualquer desconto - o presidente queria 32% de impostos, mas permitindo que as multinacionais descontassem desse montante outras taxas pagas. As duas propostas previam a cobrança de 18% de royalties.

Cinco deputados do MAS em greve de fome no Congresso

Já os movimentos populares querem 50% de royalties, além dos 32% de impostos não-dedutíveis - o que tanto o Congresso quanto Mesa rejeitavam por acharem que afugentaria do país investimentos estrangeiros - e do direito às comunidades indígenas de decidirem sobre a exploração em suas terras. O Movimento ao Socialismo (MAS), do líder cocaleiro Evo Morales, já anunciou que vai apresentar emendas.

A nova lei substitui a de 1996, que privatizou a exploração do petróleo e do gás natural no governo de Gonzalo Sánchez de Lozada em troca de 16% de impostos e 18% de royalties. Para tentar manter o apoio dos parlamentares, Mesa cedeu e deixou passar a proposta intermediária do Congresso que havia rejeitado anteriormente.

As manifestações populares retomadas nos últimos dias continuaram ontem, mas em menor intensidade. Houve um novo protesto no centro de La Paz encabeçado pela Central Operária Boliviana e prosseguiu a marcha dos cocaleiros que rumam para a capital saídos da localidade de Caracollo, a 200 quilômetros de distância. No Congresso, cinco deputados do MAS se declararam em greve de fome em protesto contra a nova lei. O Congresso e o Palácio Quemado continuaram cercados por soldados para protegê-los contra tentativas de invasão.

Legenda da foto: BOLIVIANOS em protesto contra a Lei de Hidrocarbonetos marcham em La Paz: Estado acusado de favorecer multinacionais