Título: TCE PEDE INSPEÇÃO EM FUNDO DE COMBATE À POBREZA CRIADO PELO ESTADO
Autor: Carla Rocha e Luiz Ernesto Magalhães
Fonte: O Globo, 20/05/2005, Rio, p. 15

Prestação de contas do governo é aprovada, mas conselheiro faz 13 ressalvas

O Tribunal de Contas do Estado decidiu ontem fazer uma inspeção especial dos gastos, em 2004, do Fundo de Combate à Pobreza e às Desigualdades Sociais do governo do estado. A decisão foi tomada em sessão, ontem, em que os conselheiros aprovaram por unanimidade as contas da governadora Rosinha Garotinho do ano passado, mas com 13 ressalvas e 42 recomendações em vários setores da administração. O TCE quer investigar se todos os recursos do fundo - criado sob forte polêmica em 2002 e que arrecadou no ano passado R$1,4 bilhão - foram investidos em programas sociais.

A análise dos gastos não foi possível porque, no decreto 36.837, assinado em 29 de dezembro do ano passado, mas publicado apenas em janeiro deste ano no Diário Oficial, a governadora Rosinha Garotinho extinguiu do orçamento do estado a chamada Fonte 22, onde as despesas do fundo eram discriminadas por programa. Todo o dinheiro passou a fazer parte da Fonte 00, que centraliza toda a receita de impostos e não permite um acompanhamento detalhado. São contemplados pelo fundo programas como Cheque-Cidadão, Restaurante Popular e o Morar Legal.

Para deputado, decreto permite maquiagem

A suspeita de irregularidades na aplicação dos recursos do fundo também é levantada em ação apresentada à Justiça pelo deputado Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB) que denunciou o fato ao TCE. Membro da Comissão de Orçamento e Finanças da Alerj, Luiz Paulo alega, na ação judicial, que o decreto, que impede o acompanhamento do fundo, pode estar sendo usado para maquiar os gastos:

- O objetivo pode ser encobrir gastos indevidos, inclusive com pessoal.

O conselheiro Aloísio Gama do TCE, que foi o relator das contas, também observou em seu relatório que, sem o detalhamento das contas, não é possível determinar se houve pagamento indevido a servidores que não participam dos programas do fundo. "'É de fundamental importância que seja promovida uma inspeção (...) para a garantia de que os recursos utilizados no pagamento de despesas com pessoal referem-se às ações e programas constantes na legislação pertinente", escreveu o conselheiro.

O secretário estadual de Finanças, José Henrique Bellúcio, disse que a decisão de unificar as fontes ocorreu porque nos dois casos a origem dos recursos é comum. Mas afirmou que, na prestação de contas deste ano, voltará a detalhar as contas do fundo.

- No total, investimos R$2,237 milhões em projetos sociais em 2004 já que não usamos apenas recursos do fundo. Também usamos o superávit financeiro de 2003 e verba de outras secretarias - explicou.

Bellúcio nega que tenha usado os recursos do fundo para pagar pessoal a não ser aqueles ligados a projetos da área social. Segundo ele, o pagamento desses servidores consumiu 42% do total gasto nos programas sociais - cerca de R$920 milhões.

Setecentos milhões não foram explicados

Mas, na ação, Luiz Paulo alega que o estado não explicou como foram aplicados

R$728.626.727,43 do fundo. No documento, ele detalha como chegou a esse total. O deputado diz que não há indicação de como foi gasta a diferença entre R$1.400.439.782,45 arrecadados pelo fundo e R$1.030.856.400,38 empenhados e liquidados, num total de R$369.583.382,07. Também não teriam sido esclarecidas as despesas referentes à diferença entre os R$1.030.856.400,38 empenhados e os R$671.813.055,02 pagos, o que acrescenta mais R$359.043.345,36 ao total de recursos sem destino declarado pelo governo estadual.

O TCE também decidiu auditar os contratos que o estado mantém com empresas para o fornecimento de pessoal a órgãos públicos. O objetivo é identificar se há casos em que essas despesas estejam classificadas como gastos com prestação de serviços, e não em despesas com pessoal, como determina a Lei de Responsabilidade Fiscal. A LRF fixou os gastos com pessoal em 49%.

PROBLEMAS EM 2002

A análise da prestação de contas do estado referente ao ano de 2002 - quando Benedita da Silva e Anthony Garotinho dividiram o poder - deu panos para a manga. Apesar de o Tribunal de Contas do Estado (TCE) ter rejeitado, pela primeira vez em sua história, as contas de uma gestão, a Assembléia Legislativa do Rio, que precisa referendar a decisão do órgão, juntou forças em 2003 para acionar seu rolo compressor. E conseguiu. Contrariando o parecer técnico, prevaleceu a pizza meio Benedita, meio Garotinho, e os deputados acabaram aprovando as contas. O TCE havia rejeitado as contas de 2002 porque considerou que não haviam sido cumpridos os investimentos mínimos em determinadas áreas. Além disso, o governo não havia pago o 13º salário, deixando um déficit de quase R$2 bilhões.

Legenda da foto: DECRETO DE Rosinha Garotinho impede acompanhamento dos gastos