Título: Informais sentiram no bolso uma perda maior de renda: queda de 20%
Autor: Luciana Rodrigues e Flávia Oliveira
Fonte: O Globo, 20/05/2005, Economia, p. 21

Receita encolheu entre 1997 e 2003. Enquanto isso, a jornada cresceu

Os informais sentiram com mais força o golpe sofrido na renda dos trabalhadores pelas sucessivas crises econômicas que assolaram o país nos últimos anos. A receita do setor encolheu quase 20% entre 1997 e 2003. No mesmo período, a renda média dos brasileiros caiu 18,8%, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do próprio IBGE. Nos pequenos negócios informais, o recuo nos rendimentos veio acompanhado de jornadas de trabalho mais longas, contratos mais precários e maior dificuldade para a venda de produtos.

Os trabalhadores por conta própria viram seus ganhos diminuírem 19,50%, de uma média de R$1.446 em 1997 para R$1.164 em 2003. Entre os empregadores, o recuo foi de 8,89%. Além disso, 93% dos negócios informais eram lucrativos em 1997. Em 2003, essa taxa caiu para 73%.

Adriana Fontes, do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), não se surpreende com a acentuada queda de renda do segmento. Os microempreendedores, diz ela, têm mesmo mais dificuldades em manter o nível de rendimento em conjunturas desfavoráveis, já que não têm salário fixo ou proteção legal:

- Eles são mais vulneráveis às oscilações macroeconômicas. Além disso, se o número de trabalhadores neste setor cresceu 8%, a concorrência aumentou. A renda só pode ter caído.

Cresceu o percentual dos que ganham por tarefa

O economista Marcelo Neri, da FGV, lembra que 1997 marca um momento especialmente bom para o mercado informal. Nos primeiros anos do Plano Real, os trabalhadores que mais ganharam foram os prestadores de serviço. Já no período pós-desvalorização cambial, eles lideraram as perdas. Significa dizer que a pesquisa toma como referência o pico e o vale do rendimento dos informais no período pós-Real.

- O IBGE tirou a melhor e a pior foto de cada um dos momentos. Por isso a queda é tão acentuada - diz Neri.

Mesmo dentro do já precário mercado informal, cresceu a precariedade das relações de trabalho. Em 1997, 72% dos empregados no setor, à exceção dos proprietários, tinham uma relação de trabalho por tempo indeterminado. Em 2003, só 61% tinham esse vínculo. Enquanto isso, cresceu de 7% para 10% os que ganhavam por tarefa.

O vínculo mais frágil com o trabalho ocorreu em meio a um aumento da já elevada carga horária. Enquanto em 1997 apenas 4% dos empreendedores diziam ter elevado sua jornada nos últimos 12 meses, na pesquisa de 2003 esse número chegou a 9% entre os conta própria e 10% entre os empregadores. Uma parcela significativa (14,49% do total) tem jornada superior a 60 horas semanais.

Vaníssia Moreira Alves, de 22 anos, conhece na pele a expressão trabalhar muito, ganhar pouco. Ela é funcionária de uma banca de camelô, das 7h30m às 19h30m de segunda-feira a sexta-feira. Aos sábados vai até as 16h30m. São 69 horas semanais a R$80. Vaníssia estudou até o primeiro ano do antigo segundo grau. Saiu da escola e foi trabalhar quando engravidou do filho, hoje com 3 anos.

- Já tentei procurar emprego, mas não consigo porque não tenho segundo grau - conta.

A pesquisa do IBGE mostra que, dentro do setor informal, o rendimento mais baixo é justamente o das mulheres que são empregadas sem carteira: R$275, pouco acima do salário-mínimo de R$240 em 2003.

A maioria dos empreendedores informais não tem qualquer tipo de proteção social. Entre os que trabalham por conta própria, 20,19% não contribuem para a Previdência oficial.

A pesquisa traça um perfil do setor de baixa instrução, idade mediana e longo tempo de permanência na informalidade. Entre os conta própria, 39,03% têm apenas primeiro grau incompleto. No conjunto total, 45,62% têm entre 40 e 59 anos e 37,33%, entre 25 e 39 anos.

Chama atenção a longevidade dos pequenos negócios informais: 31% existem há mais de dez anos.

inclui quadro: saiba mais sobre a pesquisa