Título: EMPREENDEDORES DISTANTES DO CRÉDITO
Autor: Flávia Oliveira e Luciana Rodrigues
Fonte: O Globo, 20/05/2005, Economia, p. 23

Nove em dez empresas não tomam empréstimos e 83% não têm dívidas

A informalidade brasileira cresce à margem também do sistema financeiro. Nos três meses anteriores à pesquisa divulgada ontem pelo IBGE, 94% das empresas do setor informal não haviam tomado empréstimos. E 83% delas não tinham dívidas em 2003, proporção idêntica à de seis anos antes. Nem na hora de se constituírem as empresas recorrem aos bancos: apenas 179.611 dos 10,3 milhões de empreendedores tomaram crédito para iniciar suas operações.

- Não é possível afirmar se isso ocorre por falta de acesso a crédito ou porque os juros altos inibem a demanda. É instinto de sobrevivência as empresas evitarem financiamento bancário numa conjuntura tão imprópria - diz o economista Marcelo Neri, da FGV.

Metade inicia negócio com recursos próprios

Na pesquisa, o IBGE observou que o principal meio de financiamento para iniciar os negócios são recursos próprios (52%), como indenizações, poupança e venda de bens ou imóveis. Em seguida, aparecem os empréstimos, na maior parte dos casos feitos com parentes. Um terço dos empreendedores diz que, no início, não precisou de capital.

A economista Adriana Fontes, do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), diz que a participação modesta do crédito nos empreendimentos está relacionada à falta de oferta. Os programas de microcrédito são crescentes, mas ainda não existem em escala suficiente para se destacar num levantamento nacional. E como não enxergam a possibilidade de obter recursos em bancos, os empresários preferem contar com recursos próprios.

- Os informais estão excluídos do acesso a financiamentos, da bancarização e da seguridade social - conclui Luiz Carlos Barbosa, diretor-técnico do Sebrae.

Prova disso é que, ao citarem a principal dificuldade enfrentada nos últimos 12 meses, só 359.904 (4%) mencionaram a escassez de crédito. Outros 16% queixaram-se de falta de capital próprio. Para Neri, é sinal de que a demanda por recursos é maior do que os empresários sugerem ao se referirem aos bancos.

Segundo o IBGE, das 636.617 empresas que obtiveram empréstimos - 6% do total em 2003, contra 4,98% em 97 - 58% recorreram aos bancos. Também não é baixo o número de empreendimentos com acesso a contas bancárias (40%), cheque especial (22%) e cartão de crédito (27%). (Flávia Oliveira e Luciana Rodrigues)