Título: 'O ponto é fazer crianças e adolescentes saberem do risco¿
Autor: Fernando Duarte
Fonte: O Globo, 22/05/2005, O Mundo, p. 41

Acima de tudo, os adolescentes britânicos são vítimas da falta de um esforço coordenado entre governo, escola e pais em prol da educação sexual. O diagnóstico é de Samantha Guy, diretora de saúde reprodutiva e sexual juvenil da Marie Stopes International, ONG especializada numa gama de serviços que variam do aconselhamento ao encaminhamento para procedimentos de aborto. A especialista alega que o daisy-chaining é, sobretudo, uma conseqüência da falta de maior informação sobre os riscos da promiscuidade sexual.

A senhora já tinha ouvido falar do daisy-chaining?

SAMANTHA GUY: Não tinha ouvido falar da expressão, mas o caso apontado pelo Royal College of Nursing tem de ser levado bastante a sério, pois é o indicativo de alterações graves no padrão de comportamento de adolescentes e que certamente envolve o consumo de álcool e drogas.

Não chama a atenção que um país culturalmente envolvido com a derrubada dos tabus sexuais hoje se mostre incapaz de controlar os exageros cometidos pelas camadas mais jovens de sua população?

GUY: O Reino Unido percebeu o problema, mas não é um exemplo em termos de políticas de solução, ainda mais em comparação com a Holanda, país em que uma ênfase na educação sexual nos últimos anos tem diminuído não apenas os casos de gravidez juvenil, mas também o envolvimento de adolescente em relações sexuais. O maior problema é a falta de acesso à informação e acompanhamento, sobretudo nas escolas. Há estabelecimentos educacionais britânicos que se limitam aos aspectos da biologia humana, em vez de uma abordagem mais aberta.

Escolas enfrentam resistência de pais e alunos?

GUY: A situação é paradoxal. Ao mesmo tempo em que crianças e adolescentes são submetidos a um bombardeio de mensagens sexuais por parte da mídia, e muito raramente tais mensagens pregam o sexo seguro, há uma espécia de cortina-de-ferro moral que impede o assunto de ser abordado de maneira mais eficiente pelos educadores. Certos pais e certas escolas acreditam que falar sobre sexo vai encorajar crianças e adolescentes a transar, quando os estudos provam o contrário. Não há equilíbrio no tipo de mensagem que chega a elas.

Mas há estudos que indicam uma maior predisposição ao ato sexual de crianças e adolescentes em situações familiares não muito estáveis, certo?

GUY: O poder do contexto é muito forte e não se pode apenas exigir uma maior abertura na sala de aula. Adolescentes precisam aprender que o sexo seguro, por exemplo, não é apenas uma questão de saber como usar camisinha ou pílula, mas sim algo que envolve sensibilidade e emoções. Os pais são parte da solução e não podem se sentir embaraçados em discutir esses assuntos com os filhos, ainda que seja compreensível que eles não tenham tido o mesmo acesso a tal tipo de informação quando eram mais jovens.

O governo Blair tem se comprometido com ações para combater problemas como a gravidez juvenil. O que falta ser feito em sua opinião pelas autoridades?

GUY: Informar. O ponto não é fazer crianças e adolescentes terem medo do sexo, mas sim saber dos riscos que envolvem uma prática insegura e não-salutar. (Fernando Duarte)