Título: É A CRISE
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 24/05/2005, Panorama Político, p. 2

O líder do PTB, José Múcio, tentava ontem algo tão difícil como está sendo, para os petistas, impedir a CPI dos Correios: evitar que a executiva do PTB, convocada por seu presidente Roberto Jefferson, aprove hoje o rompimento com o governo Lula. Se isso acontecer, será um duro golpe para o governo. É disso que falam os que acusam a oposição de tramar sua desestabilização.

Sentindo que o ex-presidente Fernando Henrique ultrapassou o diapasão ao comparar o governo a um peru bêbado, os tucanos tratavam ontem de rechaçar a pecha de desestabilizadores que o PT, na defensiva, tratou de lhes aplicar. Em Belo Horizonte, onde a cúpula tucana já tinha uma reunião marcada, que acabou ganhando maior ressonância com a ampliação da crise política, o governador Aécio Neves baixava o tom:

¿ O PSDB não abdica de seu dever de fazer oposição mas não aposta na ingovernabilidade, e já deu provas disso.

A caminho de Minas, o líder Alberto Goldman completava: ¿Não estamos pregando o `Fora Lula¿.¿ O primeiro vice-líder Eduardo Paes emendava em Brasília: ¿Queremos derrotar o PT mas é nas urnas, em 2006¿.

Estes são sinais de que a contra-ofensiva petista ¿ que incluiu declarações fortíssimas de José Dirceu e uma nota oficial do presidente do partido, José Genoino, rechaçando a escalada verbal dos tucanos ¿ produziu algum resultado. As crises políticas, entretanto, ganham dinâmica própria a partir de certo ponto. A de agora já começa a produzir estragos irreparáveis. O eventual rompimento do PTB com o governo, por exemplo, não tornará o governo insustentável nem inviabilizará a reconstrução de uma maioria. Ou sua requalificação, como diz Genoino. Aritmeticamente é possível recosturar a coalizão sem o PTB, mas politicamente o rompimento pode ter o efeito de um estouro de boiada sobre os demais partidos aliados. A reunião do PTB está marcada para esta tarde. Para tirar o partido do governo, o magoado Jefferson precisará do apoio de 50% mais um dos 123 membros da executiva. De modo que ontem, além de correr atrás de signatários da CPI tentando convencê-los a recuar, o governo ainda corria atrás dos petebistas, com a ajuda de José Múcio.

A iniciativa de Jefferson irritou áreas do PT, que lembravam o inútil desgaste do presidente ao lhe prestar solidariedade. Mas pode ser este o início do tal processo de requalificação da aliança governista, agora em bases menores porém mais sólidas, se o governo conseguir superar esta crise preservando boa parte de seu capital inicial.

A oportunidade de minar as forças do governo explica o tom da oposição. A cratera sob os pés, cavada em grande parte pelo próprio PT, explica a exaltação petista na adversidade. Aos dois lados, entretanto, o passado recente, em que estiveram do mesmo lado, na trincheira democrática, não desculpa a facilidade com que se falou em golpe, golpismo e desestabilização nas últimas horas.