Título: ERROS E CUSTOS
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 26/05/2005, O Globo, p. 2

Muito do que o PT não aprendeu ou compreendeu quando a manhã era dourada, ou mesmo depois nas tardes nubladas dos tempos recentes, está aprendendo agora, na trovoada da crise. Mesmo sabendo que o governo ainda vai sangrar muito, com CPI ou sem CPI, daqui para a frente tudo será diferente na vida interna do partido, na relação com os aliados, no controle interno do governo.

Virou sessão terapêutica a reunião de Genoino e Dirceu com parte dos deputados do chamado Campo Majoritário, na noite de anteontem num hotel em Brasília. Dirceu, principalmente, abriu o peito e não mediu palavras ao apontar falhas, omissões, negligências e equívocos. Não poupou ninguém. Mas traçaram rumos para os dias difíceis que ainda virão.

Se barrada a CPI ¿ o que só seria esclarecido à meia-noite de ontem ¿ o desgaste será grande, mas virá de uma só vez. Ficará a marca de que o governo do PT também nisso se igualou ao governo passado, sufocando o ímpeto investigativo do Congresso e o desejo da opinião pública. A oposição ganhará mais um discurso. Pior seria, dizem os petistas, dar-lhes um palanque no Congresso.

Ontem mesmo, na leitura do requerimento, os tucanos endossaram esta avaliação com um gesto infantil: quatro deputados ergueram atrás do líder Alberto Goldman, que ia discursar, um cartaz mostrando Genoino e Miro Teixeira diante do varal de denúncias contra o governo FH, pedindo CPI. ¿PT, quem te viu, quem te vê.¿ O presidente do Senado, Renan Calheiros, energicamente desmontou a encenação. O discurso de Goldman também endossou o argumento governista, ao encerrar com um brado eleitoral de que vão derrotar Lula em 2006.

Se a operação desmonte tiver fracassado, ainda haverá recurso à Comissão de Constituição, alegando a inconstitucionalidade da CPI, por incluir nove itens de investigação não relacionados com o caso dos Correios. Frustrado também este esforço, a tática será a de sabotar seu funcionamento.

O artigo 108 do regimento comum exige a presença de maioria dos membros para que a comissão eleja seu presidente e comece a funcionar efetivamente. Estas manobras trarão desgaste contínuo, expondo os 16 representantes do PT e dos aliados.

Mas se não perder o controle da situação, se a crise não transbordar ¿ pois crise institucional definitivamente não está havendo ¿ as lições começarão a ser aplicadas.

Relativamente ao PT, finalmente prevalece a evidência de que a bancada não conta com 100 deputados. ¿A dura verdade é que somos 80¿, diz um dos participantes da reunião de anteontem. Os 20 ou 21 da chamada esquerda petista, dentre os quais muitos assinaram o pedido de CPI, serão deixados no limbo. Daqui para a frente, não serão punidos nem agraciados. Deve ter se incluído neste grupo o senador Suplicy, ao apoiar a CPI, contrariando a decisão da bancada do Senado.

Quanto aos aliados, Dirceu avaliou que, diante da situação anterior, de debandada, o governo recuperou terreno. Se não tiver obtido o número exato de desistências, terá sido por pouco. Quem não retirou será tratado como rebelde e infiel. E para o futuro, está claro que algumas cargas terão de ser lançadas ao mar.

Dos ministros, petistas ou não, será exigida mais solidariedade política. Dirceu lembrou que Francisco Dornelles, quando ministro de FH, chegou a deixar o cargo duas vezes para retomar o mandato e afastar suplentes que haviam assinado CPIs. Entre os ministros de Lula, só ele, Aldo, Jaques Wagner e Eunício Oliveira enfrentaram as chamas.

Elas continuarão altas, mesmo depois da pausa do feriadão. Da maioria, não se ouviu um pio.