Título: INDÚSTRIAS E SUPERMERCADOS: SINAIS DE RETRAÇÃO
Autor: Vagner Ricardo, Aguinaldo Novo e Luciana Rodrigues
Fonte: O Globo, 25/05/2005, Economia, p. 27

RIO e SÃO PAULO. Indústria e comércio deram sinais de desaquecimento em pesquisas divulgadas ontem. A Sondagem Conjuntural da Indústria de Transformação, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), mostrou uma menor disposição do setor para investir. E as vendas dos supermercados brasileiros recuaram 3,22% em abril, na comparação com o mesmo mês do ano passado.

Os juros mais altos e a previsão de um crescimento econômico menor diminuiu o ânimo da indústria. Em abril, 60% das empresas consultadas pela FGV afirmaram que pretendiam investir mais este ano do que em 2004, abaixo dos 63% que tinham a intenção em outubro do ano passado. Também cresceu o número de empresas que se declararam em dúvida sobre a demanda (de 28% para 33%), o maior nível desde 2000.

Setor de cimento prevê consumo menor no país

No mesmo período, também subiu o percentual de empresas dispostas a reduzir os investimentos, de 9% para 11%. Os principais motivos da cautela apontados pela FGV são o ciclo de alta da Selic - que subiu de 16% para 19,75% - e a previsão de menor crescimento do Produto Interno Bruto (PIB, soma das riquezas produzidas no país). Depois dos 5,2% de 2004, agora a expansão está estimada em 3,5%, na média.

- Ainda é uma pequena queda na intenção de investimento, mas não é um cenário de estagnação - destacou o coordenador de Sondagens Conjunturais da FGV, Aloisio Campelo.

A pesquisa da FGV consultou 685 empresas, que responderam às perguntas da sondagem sobre investir mais ou menos que o ano anterior, a cada seis meses, desde outubro de 2004. Apesar do recuo, os dados da última sondagem são superiores às expectativas que os empresários tinham para 2004 - quando 39% das indústrias responderam, ainda em outubro de 2003, que ampliariam investimentos no ano seguinte.

Apesar do resultado da última sondagem, 52% dos empresários disseram que vão aumentar os investimentos em capacidade produtiva. É o melhor resultado desde 1998. Isso, para o economista Samuel Pessôa, da Escola de Pós Graduação em Economia (EPGE) da FGV, é indicação de que a indústria mantém um ritmo de investimento.

A desaceleração da economia também chegou às gôndolas dos supermercados. Dados divulgados ontem pela Associação Brasileira de Supermercados (Abras) mostram que as vendas reais em abril caíram 9,63% frente a março e 3,22% em relação a igual mês de 2004. O acumulado no ano se mantém positivo em 5,45%, mas no menor patamar desde janeiro.

A primeira explicação para esse resultado é o efeito calendário. Este ano, a Páscoa - segunda melhor data em vendas para o setor - foi comemorada em março, esvaziando o movimento de abril. Mas o presidente da Abras, João Carlos de Oliveira, afirmou que o impacto da sazonalidade seria menor se a economia tivesse mantido o mesmo fôlego de 2004.

Um exemplo da desaceleração das vendas vem do Pão de Açúcar, maior varejista do país. As vendas brutas do grupo em abril somaram R$1,289 bilhão, queda de 1,7% na comparação com o mesmo período de 2004.

De acordo com a Abras, as indicações preliminares para maio não são positivas. As vendas devem ser pouco melhores do que em abril, mas ainda inferiores ao mesmo período de 2004. Por enquanto, a entidade mantém a previsão inicial de aumento entre 3% e 3,5% do faturamento no ano, mas admite que poderá rever o número caso a Taxa Selic suba mais.

Outro setor importante termômetro da atividade econômica é a indústria do cimento. O Sindicato Nacional do setor acabou de rever sua projeção para o consumo do produto este ano. Em vez de alta de 3,5% a 4%, o setor agora espera aumento só de 2% a 2,5%.

Economistas vêem sinais contraditórios na economia

Mas apesar das vendas mais fracas dos supermercados e do menor otimismo constatado na sondagem industrial, os analistas ainda não vêem piora no cenário econômico. Tanto na indústria como no comércio, dizem eles, os sinais são contraditórios. Estevão Kopschitz, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), lembra que as vendas do comércio, considerando não só supermercados, continuam fortes. Já o coordenador do Grupo de Conjuntura da UFRJ, Antônio Licha, acrescenta que a maior oferta de crédito e a recuperação, ainda que incipiente, no mercado de trabalho têm ajudado a sustentar a indústria.

Na semana que vem, o IBGE divulga o resultado do PIB brasileiro no primeiro trimestre do ano. A economista Giovanna Rocca, do Unibanco, prevê expansão de 0,3%, na comparação com o último trimestre de 2004, já com ajuste sazonal, contra uma taxa anterior de 0,4%.