Título: AMEAÇA MILITAR NA BOLÍVIA
Autor:
Fonte: O Globo, 26/05/2005, O Mundo, p. 28

Grupo de oficiais pede na TV renúncia de Mesa, mas alto comando apóia presidente

LA PAZ

Submersa numa crise política com protestos de rua diários contra a nova Lei de Hidrocarbonetos e pressões autonomistas de quatro departamentos, a Bolívia viu ontem seu estado de confusão aumentar com o pronunciamento de um grupo de militares de média patente pedindo a renúncia do presidente Carlos Mesa e o fechamento do Congresso. O alto comando das Forças Armadas reagiu assegurando que se trata de uma iniciativa isolada e garantiu apoio à ordem institucional.

Em pronunciamento na TV, os tenentes-coronéis Julio César Galindo e Julio Herrera ¿ líderes do autoproclamado Movimento Militar Geracional ¿ afirmaram não estar tentando dar um golpe de Estado, e sim ¿salvar a democracia¿ e ¿mudar as estruturas do país¿. Os dois oficiais criticaram as tentativas de autonomia dos departamentos, mostraram-se favoráveis a uma Assembléia Constituinte e voltaram as baterias contra Mesa, que anteontem à noite descartara qualquer possibilidade de deixar o poder por causa da crise.

¿ Queremos a renúncia do presidente da República, posto que na Bolívia ocorre uma coisa muito singular: acontece que no palácio não temos presidente e a Bolívia não tem governo ¿ acusou Herrera.

Oficiais rebelados não têm tropas

A reação das Forças Armadas e da sociedade civil não se fez esperar. Num comunicado, o comando militar garantiu que os rebeldes querem ¿desprestigiar a instituição com afãs golpistas¿ e que eles ¿não representam o sentimento e o pensamento das Forças Armadas, que se mantêm firmes na defesa do estado de direito, da democracia e da institucionalidade no país¿.

¿ Queremos transmitir tranqüilidade ao país. As Forças Armadas estão coesas e unidas ¿ assegurou o almirante Luis Aranda, comandante das Forças Armadas, ressaltando que os oficiais rebelados não têm tropas sob seu comando.

Por sua vez, os movimentos populares em pé de guerra com o presidente Mesa se apressaram a atacar o pronunciamento do Movimento Militar Geracional.

¿ Quero expressar meu rechaço a qualquer golpe militar e deixar claro que vamos defender a democracia ¿ afirmou o deputado Evo Morales, líder dos cocaleiros e do oposicionista Movimento ao Socialismo (MAS), que tem paralisado o país com bloqueios nas estradas contra a nova Lei de Hidrocarbonetos.

Em El Alto, cidade vizinha a La Paz de onde saem marchas diárias de protesto para a capital, o dirigente comunitário Abel Mamani também se posicionou contra os rebeldes. Em La Paz, o terceiro dia consecutivo de protestos populares paralisou parte da cidade e a manteve isolada por terra do resto do país. Houve novos choques entre policiais e manifestantes.

Em mais um ato da crise, líderes políticos e civis de quatro departamentos ¿ Santa Cruz, Beni, El Pando e Tarija ¿ voltaram a advertir que se o Congresso não marcar os referendos para decidir sobre sua autonomia, eles próprios o farão.