Título: A CPI no Planalto
Autor: Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 27/05/2005, Panorama Político, p. 2

A CPI no Planalto

O chefe da Casa Civil, José Dirceu, e o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, ao assumirem a linha de frente da operação para impedir a CPI dos Correios podem ter cometido um grande erro político. O deputado Francisco Dornelles (PP-RJ), que integrou os governos Geisel, Figueiredo, Sarney e Fernando Henrique, considera que eles levaram a CPI para dentro do Palácio do Planalto.

O mais adequado, na sua avaliação, teria sido deixar o comando da operação-abafa para os ministros políticos e os líderes dos partidos aliados. Era assim no governo Fernando Henrique: o chefe da Casa Civil não se envolvia nas refregas parlamentares. Para estes embates eram acionados os ministros políticos: Eliseu Padilha, do PMDB, Francisco Dornelles, do PP, e Roberto Brant, do PFL.

No governo Lula não é assim. Os ministros Eunício Oliveira, do PMDB, Eduardo Campos, do PSB, Ciro Gomes, do PPS, e Alfredo Nascimento, do PL, ficaram na retaguarda. Walfrido Mares Guia, do PTB, foi para o Japão e outros, como Miguel Rossetto e José Fritsch, ambos da esquerda do PT, e Agnelo Queiroz, do PCdoB, sequer vestiram a camisa.

O resultado concreto é que os ministros José Dirceu e Aldo Rebelo, com gabinetes no quarto andar do Planalto, saíram derrotados da batalha para tentar impedir a criação da CPI. Dornelles não compartilha da tese segundo a qual José Dirceu entrou em campo para ofuscar Aldo Rebelo, e que este foi à luta para mostrar que está vivo. Ele considera que os ministros palacianos tiveram que assumir o combate devido à excessiva centralização de poder na Casa Civil.

¿ No governo Fernando Henrique os ministros setoriais tinham poder de demitir, de nomear e de mandar pagar emendas. Os ministros deste governo não têm poder para nada. O PT está pagando o preço por uma administração centralizada na Casa Civil. Os ministros políticos não têm força para atuar porque eles não têm liderança sobre suas bancadas ¿ diz Dornelles.

A falta de autonomia dos ministros aliados e a tutela petista sobre seus atos, apontadas aqui, fornecem uma pista sobre as reais razões que levaram à desarticulação da base governista. A derrota mostrou ainda que a reconstrução da maioria no Congresso requer medidas mais abrangentes do que uma simples troca no comando da Coordenação Política. O contestado Aldo Rebelo não perdeu sozinho. A nau do invencível José Dirceu também foi a pique.

Frase do ministro José Dirceu durante reunião do Campo Majoritário do PT: ¿Só tem CPI dos Correios por causa da aliança entre a oposição, o Garotinho e a esquerda do PT¿.

A oposição, a praxe e a sociedade

Os partidos de oposição consideram que é um direito do bloco PSDB-PFL, maior bancada no Senado, indicar o presidente ou o relator da CPI dos Correios. O líder do PFL, deputado Rodrigo Maia (RJ), lembra que esta tem sido a praxe nas CPIs mistas. Na CPI do Banestado o bloco indicou o presidente, senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT), e o PT o relator, deputado José Mentor (SP). O mesmo ocorreu na CPI da Terra: o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) é presidente e o deputado João Alfredo (PT-CE) é o relator.

¿ Se o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), respeitar o rodízio, cabe ao bloco PSDB-PFL indicar o relator da CPI dos Correios e ao PT indicar o presidente da comissão ¿ diz Rodrigo Maia.

A oposição até admite uma inversão de papéis, mas considera inaceitável ser alijada do comando por decisão da maioria governista. Tucanos e pefelistas não acreditam que o governo consiga impedir o funcionamento da CPI. Avaliam que o governo não suportará a pressão da sociedade, favorável à investigação.

Rebelião

Enquanto o governo lutava para impedir a CPI, a esquerda do PT se lamentava. Para Walter Pinheiro (PT-BA) o governo errou demais e deveria ter tomado a iniciativa de propor a CPI. Já Ivan Valente (PT-SP) não engoliu a visita que os ministros José Dirceu e Aldo Rebelo fizeram ao presidente do PTB, Roberto Jefferson (RJ). Para ele, está na hora de colocar esses caras (os aliados incômodos) para fora do governo Lula.

O PRESIDENTE do PT, José Genoino, reage às críticas de petistas aos aliados e à política de alianças do governo Lula: ¿As declarações equivocadas de petistas contra as alianças e contra o presidente do PTB, Roberto Jefferson (RJ), não têm o aval da direção do PT. O nosso partido não faz prejulgamentos¿.

COMO DIZ o líder do PSDB na Câmara, Alberto Goldman (SP): ¿No mínimo esta CPI vai afetar as relações entre os aliados do governo Lula¿.

Estocada

A oposição entrou a semana falando de crise institucional e o governo aproveitou a deixa para chamá-la de golpista. O governo termina a semana tendo que justificar por que é contra uma CPI investigar os Correios e a oposição tendo que afirmar que é democrata. Na tribuna do Senado, José Jorge (PFL-PE) foi irônico ao negar que a oposição seja golpista: ¿O nosso lema não é `Fora Lula!¿ O nosso lema é ¿Governa, Lula!¿ ¿.