Título: CENÁRIOS POSSÍVEIS
Autor: Merval Pereira
Fonte: O Globo, 28/05/2005, O País, p. 4

Qual será o futuro do Brasil até 2007, tempo que abrange o final do primeiro mandato do presidente Lula, o período eleitoral ampliado que já começou e o primeiro ano do próximo governo, cujo presidente será definido em grande parte pelo que acontecerá no próximo ano e meio? Cláudio Porto, economista, diretor da empresa de consultoria Macroplan, especializada em estudos prospectivos, lançou recentemente um livro em que define nosso futuro imediato em quatro cenários possíveis. Com nomes tão sugestivos quanto o otimista cenário 1, ¿A vitória da persistência¿, que ainda é o mais provável, até o alarmante cenário 4, ¿Naufrágio à vista¿, que por enquanto está descartado.

Na verdade, o que parece mais provável neste momento, esclarece Porto, é uma variante menos otimista do cenário 1, ¿com manutenção da política econômica, avanços localizados na gestão pública e na agenda microeconômica, e indicadores econômicos e sociais mais modestos¿. Uma espécie de ¿entrincheiramento¿ das forças hoje hegemônicas no PT, define ele.

A lógica do cenário da vitória da persistência ¿é a combinação de um contexto internacional favorável com a melhoria das condições internas de governança e governabilidade, o que sustentaria a essência da política macroeconômica e o avanço da agenda microeconômica¿, diz o estudo.

Dessa combinação resultariam ¿impactos positivos nos indicadores econômicos e a expansão dos investimentos produtivos, levando a uma trajetória de crescimento da economia e do emprego, o que consolidaria uma ampla coalizão governamental e a popularidade do presidente, e melhoria nos indicadores sociais¿.

Esse cenário otimista, no entanto, ficou contaminado pelo ambiente político dos últimos dias. Uma variante menos otimista dele combina ¿a manutenção da política econômica com avanços modestos na gestão pública e na agenda microeconômica¿, resultando em ¿indicadores econômicos e sociais mais modestos¿. Nesse caso, alerta Cláudio Porto, ¿teremos uma eleição bastante equilibrada¿.

O economista Fábio Giambiaggi, do BNDES, que fez uma análise das alternativas num seminário de lançamento do livro, já acreditou mais no cenário 1, até 2004, ¿quando achava que o governo teria uma agenda de reformas para 2005 e confiava na repetição do show de bola que deu na área política em 2003¿. Com a ausência de qualquer agenda e a enorme confusão política dos últimos tempos, ¿meu otimismo se esvaiu¿, lamenta Giambiaggi.

Para ele, o cenário de sedução do populismo, ¿torna-se mais provável, especialmente em 2006, na medida em que o quadro político e as condições de governabilidade vierem a se deteriorar com maior intensidade, e candidaturas oposicionistas se multiplicarem. Seria uma tentativa de desespero¿, analisa Giambiaggi.

Esse cenário de ¿sedução do populismo¿ está ficando mais próximo: prevê a fragilização da base de sustentação parlamentar do governo; persistências das dificuldades gerenciais do governo, especialmente no campo das políticas sociais; o recrudescimento de pressões por mudanças na política macroeconômica, aliada à rejeição de novos aumentos da carga tributária e do gasto público.

Embora nem nos debates nem no livro esteja explicitado, esse cenário de vitória do populismo traz nas entrelinhas um temor de que uma eventual candidatura de Garotinho pelo PMDB possa criar no país um clima que favoreça teses perigosas como o reescalonamento da dívida pública. A possibilidade de um segundo turno entre Lula e Garotinho, por exemplo, poderia levar ao recrudescimento, dentro do PT e da base aliada que chegar à eleição apoiando Lula, da pressão para mudar a política econômica.

Mesmo pessimista, Giambiaggi acha que ¿evoluímos em relação ao Brasil velho¿, por isso descarta os extremos e fica entre os cenários 2 e 3 do trabalho. O cenário 3, significativamente chamado de ¿Navegando na turbulência¿, prevê uma inflexão no ambiente internacional, com o aumento da aversão ao risco por parte dos investidores externos, redução de liquidez e arrefecimento do crescimento econômico.

O economista Fábio Giambiaggi diz que a frase de James Carville, o marqueteiro do ex-presidente americano Bill Clinton, ¿é a economia, estúpido¿, lembrando que o fator determinante em uma eleição é a economia, pode ser adaptado no Brasil de hoje por ¿é a política, estúpido¿. Ele ressalta que precisamos de novas reformas e isso requer: a) diagnóstico; b) convicção; c) unidade; e d) articulação.

Para ele, ¿FHC até 2000 tinha tudo isso, enquanto que o governo atual não tem um diagnóstico claro, a convicção é escassa (vide programa supostamente de apoio ao Palocci do PT, cheio se `poréns¿), a unidade nem vou falar e a articulação, bom... O resultado é que em matéria de reformas estamos em ponto morto¿.

O cenário 4 é o ¿Naufrágio à vista¿, e prevê total desorganização do quadro político e crise sistêmica e de governabilidade, com inflação e desemprego em alta. Embora considere improvável esse cenário, Porto alerta que também era improvável a crise cambial com a intensidade que atravessamos em 1999 e a crise energética em 2001. Para ele, ¿a existência de grandes incertezas, tanto interna quanto externamente, não nos permite ignorar o que de pior pode acontecer¿. (Continua amanhã)