Título: Nem oposição aposta em crise
Autor: Adriana Vasconcelos e Luiza Damé
Fonte: O Globo, 29/05/2005, O País, p. 3
Apesar do desgaste, políticos e analistas dizem que CPI não põe governo em risco
Oestrago político e a fragilização do governo Luiz Inácio Lula da Silva e do PT, a um ano e meio das eleições, são inevitáveis. Mas cientistas políticos, governadores e parlamentares da oposição e do governo concordam que não haverá risco de uma crise institucional com o funcionamento da CPI dos Correios e a apuração de denúncias de esquemas de corrupção envolvendo aliados políticos como o presidente do PTB, Roberto Jefferson (RJ). Nos últimos dias, os líderes do PSDB e do PFL se esforçam para derrubar o discurso governista de que a CPI vai tentar tocar fogo no governo e se transformar em palanque eleitoral.
¿ Não é espírito do PSDB querer crise institucional, que possa acarretar prejuízos para o país na área econômica ou mesmo na área política, com conseqüências mais agudas. Nosso desejo é que haja uma investigação localizada e que o presidente Lula cumpra democraticamente até o fim o mandato para o qual foi eleito ¿ diz o presidente nacional do PSDB, senador Eduardo Azeredo (MG).
O governador do Acre, o petista Jorge Viana, um dos conselheiros do presidente Lula, diz que, diante do fato consumado, chegou o momento de o governo desmistificar as CPIs e mostrar que não teme as investigações. Na sua opinião, a crise que o governo Lula já enfrenta agora não é institucional, mas política e começou com a derrota do PT na eleição para a Mesa da Câmara.
¿ A crise é anterior à CPI. Vem desde a vitória do deputado Severino Cavalcanti (PP-PE) para a presidência da Câmara. E ela ocorre porque estamos lidando mal com nossos aliados e com o Congresso. Temos de tomar uma certa dose de humildade para colocar o trem nos trilhos novamente ¿ aconselha.
¿ O governo percebeu muito tarde os problemas com a base e subestimou essas dificuldades. Quem trabalha na base do fisiologismo não pode ficar só na promessa ¿ diz o cientista político David Fleischer, da ONG Transparência, Consciência e Cidadania.
`Toda a ação do PT daqui para a frente será em vão¿
Um dos fundadores do PT e do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), o sociólogo Francisco de Oliveira, o Chico, diz que não vê saída para o presidente Lula e o PT capaz de reduzir o desgaste político com a CPI. Ele prevê um término de governo medíocre, uma reeleição complicada, mas com a economia funcionando bem e sem riscos de crise institucional.
¿ Toda a ação do PT daqui para a frente será em vão. A opinião pública está convencida de que o governo é ruim e os atos de corrupção serão debitados na conta do PT e do governo, em função da armação ilimitada de alianças. Roberto Jefferson é um personagem secundário e o chumbo grosso irá para cima do governo. Esta crise está mostrando como são ineptos os políticos do PT que sempre se acharam os gênios da raça. O próprio Lula, sempre que entra para resolver uma crise, piora. É um comportamento bisonho, patético ¿ critica Chico Oliveira.
O cientista político e professor da Universidade de Brasília Paulo Kramer vê na ação do governo para evitar a CPI um distanciamento cada vez maior de uma das principais bandeiras do PT, o compromisso com a ética. Isso, diz, vai custar caro ao governo e ao partido.
¿ O PT já se lançou na vala comum dos partidos políticos. Agora não vai haver emenda orçamentária, não vai haver nomeação que dê jeito nisso. O risco é um rompimento do equilíbrio fiscal, com fortes consequências na estabilidade social ¿ diz Kramer.
Durante um jantar oferecido na última terça-feira pelo governador de Minas Gerais, Aécio Neves, à cúpula do PSDB ¿ com todos os presidenciáveis do partido, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o prefeito de São Paulo, José Serra, e o governador Geraldo Alckmin (SP) ¿ os cardeais tucanos chegaram à conclusão de que o governo se fragilizou muito rapidamente e que, se seguir nesse ritmo, pode não chegar ao fim. Como esta é uma hipótese que não interessaria ao partido, a ordem é centrar as investigações nos Correios e evitar a politização dos debates na comissão.
¿ Este governo só se embaraça, num crescente processo de agonia, de descrédito, e isso vai se aguçar até o fim do mandato ¿ diz o líder do PSDB na Câmara, Alberto Goldman (SP).
O PFL está disposto a seguir a mesma linha, mesmo porque o partido acredita que a opinião pública quer a apuração das denúncias de corrupção e não ficar assistindo a um embate político de forças antagônicas.
¿ Temos de ter a opinião pública do nosso lado e por isso mesmo não podemos permitir que a CPI vire uma briga entre o governo e a oposição ¿ alerta o líder do PFL no Senado, Agripino Maia (RN).