Título: Marinho tentou fraudar compra de 70 mil pares de tênis para carteiros
Autor: Francisco Leali
Fonte: O Globo, 29/05/2005, O País, p. 4

Ex-chefe de Contratação dos Correios quis repartir pedido entre fornecedores

BRASÍLIA. Até mesmo a compra de tênis para carteiros foi alvo do esquema operado pelo ex-chefe do Departamento de Contratação e Administração dos Correios Maurício Marinho. Gravado por falsos empresários confessando que recolhia dinheiro para o PTB, Marinho também se envolveu numa negociação irregular para tentar repartir entre grandes empresas do setor o fornecimento de 70 mil pares de calçados para os Correios. Empresários consultados pelo GLOBO confirmaram a negociação comandada por Marinho com aval do então diretor de Administração dos Correios, o ex-deputado do PTB da Bahia Antônio Osório Batista.

A reunião teria ocorrido no fim de abril, no mesmo dia em que Marinho foi gravado pelos falsos empresários. Eles foram recebidos no primeiro andar da sede dos Correios. No 17ª , onde despacha Osório, Marinho recebera pouco antes dirigentes de empresas calçadistas. Segundo dois dos participantes, estavam na reunião diretores da Marluvas Comercial (MG), da Protelyne Calçados (RS) e da Fujiwara Equipamentos de Proteção Individual e da Bracol (SP).

¿ Perguntaram se quem ganhasse poderia fazer a gentileza de dividir com os outros para que o prazo de entrega fosse menor. Mas não houve pedido para pagar comissão para ninguém. Sempre nos trataram com o maior rigor ¿ contou Ivacir Tortelli, dono da Protelyne, que participou da reunião.

¿ A conversa foi para criar uma alternativa, porque os Correios estavam há dois anos sem comprar tênis. Ele (Marinho) queria saber se seria possível, após o pregão, cotizar o fornecimento com as demais empresas. Ia consultar o jurídico para ver se poderia fazer isso ¿ confirmou o diretor comercial da Marluvas, Denilton José da Silva.

O diretor da Marluvas deu um outro detalhe da conversa:

¿ O diretor (Osório) abriu a reunião. Disse que os Correios estavam precisando comprar os tênis e pediu que chegássemos a um entendimento.

Depois de dar o recado, Osório, segundo Denilton, saiu da sala e os representantes das empresas ficaram sozinhos com Marinho. As declarações dos empresários confirmam o que Marinho relatou na conversa gravada. Na fita, ele fala da licitação e mostra preocupação em fechar um acordo.

¿Não precisa brigar e se matar. Nós dividimos¿

¿Vou investir R$11 milhões. Como é que vamos fazer? Tenho os quatro principais fornecedores, cadastrados e certificados, há interesse dos quatro. Se eles estão brigando, o preço vai lá para baixo e ninguém sai ganhando nada. (...) Hoje os quatro empresários estão aí em cima (...) Não precisa brigar e se matar. Nós dividimos.Você fica aqui, você fica ali¿, diz Marinho, na gravação.

A conduta de Marinho e de Osório é irregular. Segundo a procuradora do Tribunal de Contas da União Cristina Machado, servidores públicos não podem fazer ajuste prévio privilegiando um determinado grupo.

¿ O servidor tem sempre que zelar pelo interesse da administração. Isso fere o princípio da moralidade na administração pública ¿ disse.