Título: BERZOINI RESOLVE DUELAR COM TESOURO PARA FINANCIAR SETOR DE SANEAMENTO
Autor: Geralda Doca
Fonte: O Globo, 30/05/2005, Economia, p. 24

Restrições impedem aplicação de R$2,7 bi do FGTS destinados à área

BRASÍLIA. O ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini, decidiu enfrentar uma queda-de-braço com o Tesouro Nacional para fazer deslanchar os recursos que o FGTS destinou ao setor de saneamento este ano. São R$2,7 bilhões que estão paralisados por causa das restrições ao endividamento do setor público. A primeira investida do ministro será esta semana, quando entregará ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva o relatório do Conselho Curador do FGTS, do qual é presidente, com críticas ao conservadorismo da equipe econômica e à atuação da Caixa Econômica Federal.

Documento sugere ao CMN alterações a partir deste mês

O documento, feito para identificar problemas que emperram o orçamento do FGTS, sugere alterações em resoluções do Conselho Monetário Nacional (CMN) este semestre. ¿Mantida a situação atual, o setor de saneamento terá experimentado nova bolha de crescimento, em 2003/2004, com redução abrupta das contratações em 2005¿, diz o documento.

O relatório afirma ser necessário e urgente que o CMN adote já uma resolução, permitindo ao Sistema Financeiro Nacional a ¿contratação de operações de crédito com tomadores públicos¿ até o teto de R$3,3 bilhões dos recursos do BNDES e FGTS destinados ao setor de saneamento.

Em dezembro de 2003, a equipe econômica abriu exceção e o CMN ampliou o limite de endividamento do setor público para permitir à CEF contratar até R$ 2,9 bilhões em saneamento. Berzoini defende que medida similar seja tomada nas reuniões do CMN em junho e julho.

Segundo o relatório, a resolução 2.827/2001 do CMN e suas alterações vedam toda e qualquer operação de crédito para saneamento com tomadores públicos. Os conselheiros também fazem críticas ao Tesouro por ter fechado em 2004 as brechas que vinham sendo usadas pela Caixa para driblar o limite de endividamento, como licitações internacionais, que permitiram ao banco a contratar cerca de R$1,5 bilhão em 2003.

O Tesouro também barrou as operações extralimite que não afetavam o superávit primário, previstas nos Programas de Ajuste Fiscal (PAF) dos estados e municípios, diz o relatório. Neste caso, quem tinha margem de endividamento podia fazer as contratações e repassar os recursos às concessionárias.

Segundo dados do Ministério das Cidades, 2.500 municípios têm condições de tomar empréstimos. Entre 2003 e 2004, 15 estados, seis companhias estaduais, além de 104 municípios, foram considerados aptos e assinaram com a Caixa.

O relatório pede mudanças na regra que fixa o limite de crédito para operações para o setor público em 45% do Patrimônio Líquido de Referência (PLR) das instituições financeiras. É que a Caixa Econômica (o principal agente do setor) já atingiu essa meta. Capitalizar a CEF ou credenciar bancos privados para operar o FGTS são opções para enfrentar a questão.

O documento diz ainda que o Tesouro barrou as liberações para os estados do Maranhão, Piauí, Paraíba, Bahia e Distrito Federal no valor total de R$500 milhões, alegando que eles não cumpriram o prazo de contratação (30/04/2004), previsto numa regra do CMN. O que, na avaliação do grupo, não é um aspecto primordial.

Outra proposta do Conselho para driblar as restrições é recorrer à Sociedade de Propósito Específico (SPE). Por este mecanismo, a empresa que ganhar a licitação de uma concessionária abriria uma empresa privada para receber o financiamento e daria como garantia recebíveis com a receita pela prestação dos novos serviços.

Reclamações também sobre o crédito habitacional

Segundo o secretário Nacional de Habitação do Ministério das Cidades, Aberlardo de Oliveira Filho, o presidente determinou que as áreas envolvidas encontrem saídas para dar continuidade às contratações.

O documento não poupou a atuação da Caixa nos empréstimos voltados à habitação com recursos do FGTS. O texto critica o modelo de análise de risco da CEF, que é fragmentado e limitado a poucas empresas do setor (crédito à produção).

Dos R$6,6 bilhões que o Fundo destinou ao setor este ano, a Caixa emprestou apenas R$1,2 bilhão e, mesmo assim, deu ênfase aos financiamentos de imóveis usados e de material de construção. A assessoria de imprensa da Fazenda e Caixa não quiseram se manifestar.