Título: `NÃO¿ HOLANDÊS PODE ENTERRAR CARTA EUROPÉIA
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Fonte: O Globo, 30/05/2005, O Mundo, p. 27

Governo de Haia pede que cidadãos não se deixem influenciar. Chefes de Estado da UE se reúnem em junho

BRUXELAS. A rejeição da França à Constituição européia aumenta a expectativa em relação ao referendo na Holanda, na quarta-feira. Assim como os franceses, os holandeses são fundadores da UE e um novo ¿não¿ à Carta, segundo analistas, pode fazer com que os chefes de Estado, numa reunião marcada para os dias 16 e 17 de junho, examinem se devem seguir em frente com os referendos programados.

¿ Provavelmente teremos a maioria na Holanda dizendo ¿não¿ à Constituição. Haverá, nesse caso, um cenário catastrófico, com dois países fundadores recusando a Carta ¿ antecipou John Palmer, diretor do Centro de Estudos Políticos da União Européia.

Carta precisa ser ratificada por todos os membros

Segundo Palmer, existe a possibilidade jurídica de cancelamento dos demais referendos, caso os chefes de Estado decidam por essa opção. A razão para isso é que, para entrar em vigor, a Constituição precisa ser ratificada por todos os 25 países-membros. Mas ele acredita, no entanto, que as consultas devem continuar sendo feitas por uma questão democrática.

¿ É provável que a tradição democrática prevaleça. Um ¿não¿ de França e Holanda acaba com a possibilidade de ratificação, mas não deve ser motivo para impedir que outros povos manifestem suas vontades ¿ disse.

Nove países já ratificaram a Carta, o que, segundo dados da UE, significa que 220 milhões de pessoas votaram ¿sim¿. O apoio mais importante até agora veio da Alemanha, que aprovou a proposta na sexta-feira.

¿ O processo de ratificação deveria continuar sendo feito até pelo menos o final do ano. Até lá, Holanda, Luxemburgo, Dinamarca e Portugal terão manifestado suas opiniões. Se todos disserem ¿sim¿, seria oportuno tentar ouvir os franceses novamente ¿ disse Marco Incerti, analista do Centro de Estudos Políticos Europeus (CEPS), de Bruxelas.

Governo holandês teme influência do voto francês

Na Holanda, o medo de que a rejeição francesa influencie os resultados do referendo no país preocupa o governo. O primeiro-ministro, Jan Peter Balkenende, pediu ontem que a população não leve em consideração o resultado na França ao emitir sua opinião na quarta-feira.

¿ Apesar do ¿não¿, o processo de ratificação continua. Peço a todos os holandeses que não se deixem influenciar pelos resultados na França. O ¿sim¿ da Holanda agora é muito mais importante. A Constituição é muito importante para a Holanda e atende aos interesses da União Européia e do nosso país ¿ declarou.

As pesquisas de opinião, no entanto, apontam até o momento para um resultado semelhante ao da França: 56% dos holandeses declararam que vão votar contra e 44% devem votar a favor.

Mas nem todos os políticos e analistas consideram a rejeição francesa e os resultados das pesquisas na Holanda como a morte declarada da Constituição da UE. Para o primeiro-ministro da República Tcheca (único país que ainda não decidiu qual será o processo de ratificação), Jiri Paroubek, o fato é lamentável mas deve, no máximo, atrasar a entrada em vigor da nova Carta.

¿ Não acredito que o ¿não¿ vá enterrar de vez a proposta da Constituição. Deve atrasar por alguns anos sua entrada em vigor, mas não creio em conseqüências maiores ¿ avalia ele.

A Constituição da UE levou mais de um ano para ter o seu texto pronto. Em outubro de 2004, líderes dos 25 países-membros assinaram o texto final e no mês seguinte foi iniciado o processo de ratificação, com um referendo na Lituânia que aprovou a Carta.

Se a proposta for recusada, a UE continuará sendo regida pelo Tratado de Nice, última das reformas feitas na união e que foi assinado em 2000. Com um complexo sistema de votação, o tratado é considerado por muitos analistas um entrave para a tomada de decisões, transformando a UE num gigante inoperante.