Título: DEPUTADOS EMPREGAM PARENTES EM GABINETES
Autor: Maria Elisa Alves
Fonte: O Globo, 29/05/2005, Rio, p. 26

Vinte e oito de 56 parlamentares admitiram já terem nomeado familiares para cargos de até R$6.099

Para muitos deputados fluminenses, acabar com o nepotismo pode terminar dando briga em família. Em duas semanas será apreciado em segunda votação o projeto de emenda constitucional que proíbe a contratação de parentes de até terceiro grau nos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. O GLOBO ouviu esta semana 56 dos 70 parlamentares e metade deles (28 deputados) admitiu ter tido em algum momento dos seus mandatos parentes trabalhando na Casa. Dos 28, catorze confessaram que atualmente abrigam familiares em seus gabinetes (com salários que podem variar entre R$3.127, o mais baixo, a R$6.099, o mais alto). Dez disseram que já exoneraram os parentes ou que eles receberam cargos em comissão em outros mandatos, no caso dos reeleitos.

Quatro parlamentares alegaram que os filhos trabalham em outros setores da Alerj e que não tiveram influência na hora de arrumar uma vaguinha para a prole. Um parlamentar está licenciado e não opinou; outro, recém-empossado, disse que ainda não montou o gabinete. Vinte e oito juraram que nunca nomearam parentes. O presidente da Alerj, Jorge Picciani, que tem um irmão em seu gabinete, calcula que metade dos deputados tenha algum membro da família na Casa. Geraldo Moreira (PSB) vai além:

¿ Tem gente que montou uma verdadeira árvore genealógica aqui dentro.

Dos parlamentares ouvidos pelo GLOBO, os que admitiram empregar maior número de parentes foram José Nader (PTB) e Samuel Malafaia (PMDB).

¿ Tenho três ou quatro parentes, não lembro. Não sou hipócrita, não peço para pôr a família no gabinete dos outros A prata da minha casa fica comigo ¿ diz Nader, único dos entrevistados contra o projeto. ¿ É um jogo para a platéia.

Entre os deputados que confessaram ter nomeado parentes, as justificativas para o nepotismo são variadas.

¿ Meu filho faz campanha comigo desde que tem 8 anos. Entende muito de política ¿ diz Cidinha Campos (PDT).

A deputada Waldeth Brasiel, que morava em Três Rios antes de ser eleita, é sincera ao explicar porque nomeou o marido chefe de gabinete:

¿ Sou do interior, não ia ficar sozinha no Rio. Trouxe meu marido e não seria justo se não o nomeasse.

Edna Rodrigues (PMDB) também não tem papas na língua ao comentar a emenda:

¿ É óbvio que há parentes competentes, que vão pagar pelos pecadores. A emenda proíbe contratar a esposa, mas permite que a amante continue.

Samuel Malafaia, que tem três parentes no seu gabinete, vai propor uma emenda ao projeto, sugerindo que cada deputado possa contratar três familiares:

¿ Na hora de montar o gabinete, sempre tem alguém da família que você quer prestigiar.

Ao saber que a cota para parentes pode ser aprovada, Ely Patrício (PSL), que disse não ter nomeado ninguém, brincou:

¿ Oba, vou botar minha madame.

Para o cientista político Eurico Lima Figueiredo, coordenador da Pós-Graduação em Ciência Política da UFF, nada que aconteça na Alerj surpreende:

¿ A política brasileira tem um caráter pessoal, clientelista, baseado na nomeação de parentes, desde a Colônia.