Título: Nova guerra das geladeiras
Autor: Janaína Figueiredo* e Eliane Oliveira
Fonte: O Globo, 19/10/2004, Economia, p. 23

Omal-estar provocado pela constatação de que a limitação da venda de geladeiras fabricadas no Brasil para a Argentina abriu espaço para exportações do produto provenientes do México e do Chile pode levar o Itamaraty a rever o acordo fechado em julho passado entre fabricantes brasileiros e argentinos. Pelo acerto, o Brasil concordou em limitar suas exportações para o vizinho a 18.160 unidades por mês, de forma a dar impulso à produção local.

Segundo uma fonte da Secretaria da Indústria da Argentina, mês passado o Chile exportou 2.700 geladeiras para o país, sendo que em 2003 suas exportações para o mercado argentino somaram apenas 689 unidades. Entre janeiro e setembro deste ano, o México vendeu 2.400 geladeiras para a Argentina. Em 2003, foram exportadas apenas 70 unidades.

Os técnicos do governo brasileiro estão analisando se existe mesmo uma tendência de queda da participação de produtos brasileiros no mercado argentino. Mas a luz amarela já foi acesa no Itamaraty, e o assunto foi tratado pelo ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, na semana passada, com o ministro da Economia do país vizinho, Roberto Lavagna. Amorim, segundo uma fonte do Itamaraty, também expressou sua preocupação ao chanceler argentino, Rafael Bielsa, durante a reunião da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi) ontem em Montevidéu, no Uruguai.

¿ Estamos de olho no comércio bilateral. Vamos examinar o caso com cuidado, pois os dados de que dispomos são das últimas semanas. Se realmente estiver ocorrendo algum tipo de descumprimento do acordo assinado em julho, vamos rever as cotas brasileiras ¿ disse uma graduada autoridade diplomática brasileira.

Uma das grandes preocupações de Amorim, transmitidas a Lavagna no último sábado, é que o Brasil, ao aceitar restringir suas vendas ao mercado argentino, tinha a intenção de ajudar as indústrias locais a se fortalecerem. Ou seja, o governo brasileiro não aceita em hipótese alguma beneficiar exportadores de terceiros mercados.

Na visão de economistas argentinos, como o ex-secretario da Industria Dante Sica, o governo Néstor Kirchner deverá avaliar com o Brasil a evolução do comércio bilateral de geladeiras na próxima reunião de monitoramento do comércio entre os dois países.

¿ O desvio existe e deve ser estudado com muito cuidado. Os problemas que existem não poderão ser resolvidos apenas com restrições comerciais ¿ disse Sica.

Briga também de máquinas de lavar

Como se não bastasse a chamada ¿guerra das geladeiras¿, o conflito entre fabricantes de máquinas de lavar também parece longe de ser resolvido. Segundo empresários argentinos, atualmente cerca de oito mil lavadoras brasileiras estão presas na alfândega argentina, à espera de uma autorização do governo para entrar no país. O fim do licenciamento automático, implementado pela Argentina em julho passado, paralisou o comércio de máquinas de lavar entre os dois países.

¿ O Brasil nos pede uma cota de 191 mil máquinas de lavar por ano e nós não podemos aceitar mais do que 173 mil unidades. Neste momento as negociações estão estagnadas ¿ disse o empresário José San Juan, membro da Câmara Argentina de Fabricantes de Aparelhos Elétricos e Mecânicos.

Antes do acordo de julho, a Argentina importou 14.500 máquinas de lavar brasileiras. Em agosto, o volume caiu para três mil unidades. Mês passado, confirmou San Juan, não entrou sequer uma máquina de lavar brasileira no mercado argentino.