Título: AGRICULTORES BLOQUEIAM ESTRADAS EM VÁRIOS ESTADOS DO PAÍS
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Fonte: O Globo, 01/06/2005, Economia, p. 26

Produtores querem recursos do FAT para quitarem empréstimos com setor privado. Ajuda financeira poderia chegar a R$9 bi. Se não houver resposta, ameaçam tomar Brasília

PORTO ALEGRE, CUIABÁ, CAMPO GRANDE, LONDRINA, RIBEIRÃO PRETO, TERESINA e BRASÍLIA. O país foi ontem palco de diversos protestos de agricultores, na chamada "Mobilização no Campo". Reclamando de prejuízos com a estiagem, o real valorizado e as importações de países vizinhos, os produtores exigem providências do governo. Caso não haja resposta às suas reivindicações, os agricultores ameaçam levar o movimento até Brasília - numa reedição do "caminhonaço" de 1999, quando a Esplanada dos Ministérios foi invadida por caminhões e tratores. Na época, parte das dívidas foi convertida em títulos do Tesouro.

Entre as reivindicações está o refinanciamento de uma dívida de R$8 bilhões a R$9 bilhões que os produtores têm com os fornecedores. Como 70% dos débitos são com o setor privado, a categoria quer que o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) empreste recursos aos agricultores, que quitariam o que devem às empresas, pagando uma taxa de juros de 8,75%. A diferença entre essa taxa e o índice cobrado no mercado seria coberta pelos próprios credores.

- O governo deve entrar nessa questão comercializando, resgatando o preço mínimo ou criando um fundo de comercialização - disse o deputado Ronaldo Caiado (PFL-GO), que participou de uma manifestação em Goiás.

Mais de 10 mil rizicultores pararam ontem a Grande Porto Alegre e o Centro da capital gaúcha, com tratores, caminhões e ônibus. Eles pediram uma revisão dos acordos do Mercosul, a suspensão imediata das importações de arroz de Uruguai e Argentina e a compra do 1,5 milhão de toneladas excedentes de arroz pelo governo pelo custo de produção.

O "tratoraço" partiu de manhã do Parque de Exposições Assis Brasil em Esteio, a 30 quilômetros de Porto Alegre, seguindo pela BR-116, causando um congestionamento de 15 quilômetros, até a capital gaúcha.

- O presidente da Argentina reclama de lá, nós temos reclamações aqui em relação ao arroz, trigo e vinho - disse o presidente da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), Carlos Sperotto, que hoje tenta uma audiência com o ministro da Fazenda. - Todos estão descontentes com o Mercosul. Por isso exigimos mudanças.

No Mato Grosso, agricultores fecharam rodovias em oito das principais cidades produtoras do estado, num movimento chamado SOS Rural. O protesto teve a participação do governador Blairo Maggi (PPS), o maior produtor de soja do mundo e acusado por ONGs de ser um dos responsáveis pelo desmatamento na Amazônia.

O protesto foi organizado pela Famato, que reúne os sindicatos rurais, e pela Associação dos Produtores de Soja do estado. Em Alto Taquari, cerca de 300 produtores interditaram a MT-100 e o terminal da Ferronorte. Em Rondonópolis, os manifestantes fecharam a BR-163 e a BR-364 - a principal ligação de Mato Grosso com as regiões Sul e Sudeste - em cinco pontos. Em Primavera do Leste, um dos principais pólos produtores de soja e algodão, a BR-070, que liga a cidade a Cuiabá, foi interditada. Segundo a Famato, os protestos reuniram cerca de cinco mil produtores.

No Mato Grosso do Sul, o protesto provocou congestionamento em várias rodovias. Na BR-163, os manifestantes colocaram na pista tratores, máquinas agrícolas e caminhões. Também houve bloqueios nas BRs-163, 376 e 060. Em Campo Grande, os ruralistas se reuniram na sede da Associação dos Criadores de Mato Grosso do Sul (Acrissul) e foram até a Câmara municipal, no Centro. Além da renegociação das dívidas, eles querem um seguro contra acidentes climáticos.

Já a Federação da Agricultora do Paraná (Faep) afirmou que o governo federal precisa agir imediatamente para conter a crise do agronegócio sob pena de comprometer seu programa econômico. Segundo a Faep, os protestos reuniram oito mil agricultores em Londrina.

- A política agrícola não foi abandonada por esse governo. Obviamente, nós estamos com um problema de quebra de safra este ano. São Pedro, por enquanto, não trabalha no Ministério da Fazenda, então não temos controle sobre o clima - disse o secretário de Política Econômica, Bernard Appy.

Em Ribeirão Preto, 600 produtores de milho, algodão e soja da região interditaram a rodovia Anhangüera, que liga o estado de São Paulo ao Sul de Minas Gerais, por meia hora. Eles também distribuíram panfletos aos motoristas que passaram pelo pedágio e queimaram cerca de dez quilos de algodão.

Na região dos Cerrados do Piauí, os produtores de soja distribuíram 26 toneladas de arroz para a população de Uruçuí e Bom Jesus (632 km de Teresina), bloquearam estradas e agências do Banco do Brasil (BB) em protesto contra a política cambial. Os protestos se estenderam por seis municípios da região.

Legenda da foto: PRODUTORES RURAIS se reúnem no Parque Assis Brasil, em Esteio (RS), para começar o "tratoraço"