Título: ORA, DIREIS, OUVIR ESTRELAS NA FLIP!
Autor: Rachel Bertol
Fonte: O Globo, 01/06/2005, Segundo Caderno, p. 1

Rushdie, Suassuna e Jô são destaques na festa literária de Paraty

A Bienal do Livro mal acabou e, para os amantes da leitura, outro evento já se aproxima: a III Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que acontecerá entre 6 e 10 de julho na charmosa cidade colonial e cujos ingressos começam a ser vendidos na próxima segunda-feira. No início da conversa sobre o que esperar dos convidados deste ano - nos dois primeiros anos, participaram estrelas como Chico Buarque, Paul Auster, Eric Hobsbawm, Don DeLillo - a própria Ruth Lanna, responsável com Samuel Titan pela programação, chega a observar que o elenco deste ano pode não parecer, à primeira vista, assim tão estelar. No entanto, ao comentar sobre os participantes, Ruth destaca que, sim, Paraty terá estrelas - se é que o termo é plenamente válido para a literatura - como o anglo-indiano Salman Rushdie, que lançará na festa o seu mais novo romance, "Shalimar, o equilibrista", o qual sairá no Brasil antes de chegar a livrarias americanas e inglesas.

- Vai ser algo sem precedentes, inusitado. É um livro inédito do Rushdie e alguns jornalistas vêm de fora só para acompanhar o lançamento. Quem quiser conhecer a história terá de lê-la primeiro em português - conta Ruth.

As demais estrelas estrangeiras (dos 36 autores convidados, 16 vêm de fora), embora não tão resplandescentes por aqui quanto Rushdie, também possuem seu brilho, às vezes intenso, no mundo literário. Um dos destaques é Michael Ondaatje, escritor do Sri Lanka radicado no Canadá, que despontou com "O paciente inglês", romance premiado e adaptado para o cinema. Ondaatje falará numa mesa com David Grossman, considerado um dos grandes autores israelenses da atualidade.

Clima mediterrâneo na cidade colonial

Outro estrangeiro importante é Enrique Vila-Matas, espanhol que tem sua legião de fãs no Brasil, com obras lançadas aqui pela Cosacnaify. De seu país também virá Juan Goytisolo, consagrado com o Prêmio Juan Rulfo, que debaterá com o brasileiro Alberto Mussa. Participam mais dois escritores de língua espanhola: José Latour, cubano autor de policiais, e a argentina Beatriz Sarlo, crítica cultural muito lida na universidade. O tempero latino vai ser reforçado pelos portugueses - os escritores José Luiz Peixoto, Gonçalo M. Tavares e o jornalista Pedro Rosa Mendes - e pelo italiano Marcello Fois, também autor de policiais.

- Não temos a dominância de nenhum país mais evidente na programação, mas de fato há um clima mediterrâneo - afirma Ruth.

Entre os brasileiros - além da homenagem a Clarice Lispector - os destaques são Ariano Suassuna, Luiz Alfredo Garcia-Roza e Jô Soares (cuja mesa, com a historiadora Isabel Lustosa, será mediada por Luis Fernando Verissimo, que participa da Flip desde o início). O rapper MV Bill e o antropológo Luiz Eduardo Soares, autores de "Cabeça de porco", apresentam-se numa mesa com Arnaldo Jabor. Este ano, só haverá um estreante, o baiano João Filho, autor de "Encarniçado".

- Vão participar pessoas que, apesar da carreira, não são muito conhecidas, como Claudia Roquette-Pinto, poeta mais lida no Rio.

Telão ainda não está garantido

Assim como no ano passado, os escritores falarão na Tenda dos Autores, para cerca de 500 pessoas, na beira do Rio Perequeaçu. Mas o evento - que tem o Unibanco como patrocinador master - ainda não possui recursos para a Tenda da Matriz, com capacidade para cerca de mil pessoas, onde os debates eram retransmitidos por telão. No ano passado, 70% dos visitantes viram os debates no telão. A organização evitou repetir o financiamento obtido em 2004 com a Biblioteca Nacional.

- Fomos criticados por usar dinheiro público. Estamos duros, procurando patrocínio, mas preferimos evitar a intriga do ano passado - afirma, otimista, a diretora executiva da Flip, Belita Cermelli.

Novamente, a festa não vai se restringir à Tenda dos Autores. O show de abertura será feito por Paulinho da Viola. No cafés, apresentam-se, entre outros, Teresa Cristina e Danilo Caymmi. Haverá exibição de filmes, atividades para crianças e encontros Off-Flip, em bares e restaurantes. A ong Associação Casa Azul, responsável pela festa, também realiza em escolas da cidade, ao longo do ano, atividades com alunos, que apresentam trabalhos e participam de eventos.

- Quanto mais democrática for a Flip, melhor. Tivemos a preocupação de ter uma programação ampla, para um público variado - diz Ruth.

Uma das novidades criadas por Ruth e Samuel Titan foi a série Mar de Histórias, em que se discutirão os clássicos "Dom Quixote", por Goytisolo; "As mil e uma noites", livro que ganhou este ano no Brasil sua primeira tradução feita diretamente do árabe e será comentado pelo turco Orhan Pamuk, autor de "Meu nome é vermelho"; e a Bíblia, pelo crítico americano Robert Alter.

A editora inglesa Liz Calder, presidente e idealizadora da Flip, não tem dúvida de que as pessoas que forem a Paraty vão ter boas surpresas ao descobrir autores como a ficcionista Jeanette Winterson, que falará sobre arte. Liz também está entusiasmada com o livro de Rushdie.

- É um grande romance sobre política, amor, Segunda Guerra, Inglaterra, Paquistão. Um épico, seu melhor livro desde "Os filhos da meia-noite" (de 1981). Vai ser um enorme sucesso - aposta ela.

www.oglobo.com.br/cultura