Título: Prisões provocam comemoração no governo
Autor: Rodrigo Rangel
Fonte: O Globo, 03/06/2005, O País, p. 4
CORRUPÇÃO NA FLORESTA: MINISTROS DA JUSTIÇA E DO MEIO AMBIENTE E DIRETOR-GERAL DA PF APRESENTARAM A OPERAÇÃO
'Temos a necessidade, para investigar, de deixar roubar. Nós precisávamos reunir elementos de prova', diz Bastos
BRASÍLIA. Na berlinda nas últimas semanas por causa de denúncias de corrupção e do impasse em torno da CPI dos Correios, o governo procurou tirar ontem o máximo proveito dos resultados da Operação Curupira, da Polícia Federal, que desbaratou um megaesquema de exploração ilegal de madeira em terras indígenas e reservas ambientais da Amazônia, com a participação de funcionários do Ibama.
A tentativa do governo de impor uma agenda positiva envolveu uma verdadeira tropa de choque: o anúncio da operação foi feito em conjunto pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, pelo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, e pelo diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Lacerda. Em comum, o discurso de que o governo tem sido intransigente com a corrupção.
Marina: "Ninguém aqui está sendo surpreendido"
Marina Silva defendeu a postura da direção nacional do Ibama diante das denúncias, que eram de conhecimento da atual administração do órgão desde o fim de 2003. Como O GLOBO mostrou anteontem, só nas últimas semanas é que o Ibama começou a suspender as autorizações irregulares de exploração de madeira em áreas indígenas e reservas florestais. Indagada se o governo não demorou a tomar providências, a ministra foi enfática:
- Ninguém aqui está sendo surpreendido. Pelo contrário, foi uma ação proativa de nossa parte. Não se pode tirar o foco dos bandidos e colocar nas pessoas que estão investigando - disse Marina Silva.
O diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Lacerda, também respondeu à crítica. Disse que a demora na adoção de providências às vezes é proposital.
- Temos a necessidade, para investigar, de deixar roubar. Nós entendemos que deveria ser assim, na medida que precisávamos reunir elementos de prova - disse.
Bastos: "Quadrilha agia antes da criação do Ibama"
Márcio Thomaz Bastos comemorou a operação como mais uma vitória do governo no combate à corrupção. Indiretamente, ele criticou os governos anteriores por não terem sido intolerantes com a corrupção.
- Era uma quadrilha que vinha agindo desde antes da criação do Ibama, e só agora temos uma operação deste tamanho. Antigamente isso vinha ocorrendo, talvez pelo fato de não haver essa atitude de intransigência com a corrupção - disse Bastos. - O pior é empurrar a corrupção para debaixo do tapete.
Ministério Público acha que houve exagero do governo
Se sob os holofotes os discursos exaltavam a integração entre Polícia Federal, Ibama e Ministério Público Federal, nos bastidores o ambiente não era tão amigável assim. Para o Ministério Público, o governo exagerou ao tentar atrair para si o mérito da investigação. Os primeiros passos para a deflagração da operação foram dados por procuradores da República em Cuiabá, com base em estudos que o próprio Ibama guardava desde 2003.
Combate ao crime ambiental
Em entrevista ao GLOBO publicada em 2 de janeiro, o diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Lacerda, mostrou preocupação com o problema e revelou que a repressão aos crimes ambientais seria prioridade este ano. Cinco meses antes da operação de ontem, ele já dizia que a PF tinha condições de dar uma grande contribuição no combate aos crimes ambientais. Lacerda observou ainda que havia grande cobrança em relação a uma atuação mais dura do governo nesta questão.
"Verifica-se de novo o agente público envolvido na corrupção. Criamos o Centro Integrado de Aperfeiçoamento em Polícia Ambiental (Ciapa), uma experiência única no mundo. Um policial sem consciência ecológica para combater esse tipo de delito é perda de tempo. Ele vai dizer: 'Tinha é que estar prendendo traficante e não o cara com periquitos', afirmou Lacerda na entrevista.
O diretor da PF disse ainda que, para combater o crime ambiental, é preciso formar o policial.