Título: Interventor diz que não vai aceitar pressões políticas em seu trabalho
Autor: Rodrigo Vargas
Fonte: O Globo, 04/06/2005, O País, p. 4

`Todos os gerentes anteriores foram indicados por questões políticas¿

CUIABÁ. Escolhido pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, como interventor no Ibama em Mato Grosso depois do afastamento de funcionários envolvidos com a máfia da exploração ilegal de madeira, o procurador federal Elielson Ayres disse ontem que não vai aceitar a partidarização de seu trabalho. O ex-gerente Hugo Werle, preso pela Operação Curupira e exonerado na quinta-feira, ocupava o cargo por indicação da executiva estadual do PT.

Ayres diz que pretende, ao fim dos dois meses de intervenção, entregar o comando do Ibama a um funcionário de carreira e com capacidade técnica, sem influência política.

¿ Todos os gerentes anteriores foram indicados por questões políticas. Mas não vou aceitar qualquer interferência. Enquanto eu estiver aqui, ninguém vai falar em partidarização. E, se falar, vou embora no mesmo instante ¿ ameaçou Ayres, que tem 23 anos de serviço público, nove deles no Ibama.

Ayres disse que a investigação ainda está começando e que novas fraudes poderão vir à tona:

¿ Nem todo o esquema foi atingido. Há muita coisa a ser revelada e a investigar. Temos outras fraudes que ainda estão sendo investigadas e que chegarão ao conhecimento público em breve. Ainda falta abrir alguns lacres.

O primeiro destes lacres foi aberto por sua iniciativa em 2001, quando esteve em Mato Grosso para comandar processo disciplinar contra um antigo gerente do órgão:

¿ Na época, nossa ouvidoria recebeu uma denúncia anônima e, aproveitando a viagem, comecei a investigar.

Fraude evidente à primeira vista

A denúncia envolvia funcionários do Ibama, despachantes e madeireiras fantasmas em uma rede destinada a burlar o sistema de controle da exploração de madeira. Ayres conta que, logo no primeiro processo examinado, a fraude ficou evidente:

¿ Pedi autorização ao então presidente do Ibama, Hamilton Casara, para seguir adiante, mas recebi a recomendação para que não me envolvesse com esse tipo de coisa.

Mesmo sem autorização, Ayres conta ter continuado informalmente o trabalho e que acabou comprovando a denúncia.

¿ Independentemente da autorização, tinha a obrigação de fazer alguma coisa. Então fui levantando os dados internamente, reuni tudo o que tinha e enviei ao Ministério Público Federal. Depois, não ouvi falar mais.

Em julho de 2004, à frente de outro processo administrativo, Ayres tomou novamente contato com a corrupção no Ibama:

¿ O descaramento era tanto que eles já nem tentavam dissimular. Vi relatórios de despachantes que, em dezembro de 2003, já contabilizavam ATPFs que só seriam pagas em 2004.

Desta vez, autorizado a continuar a investigação, Ayres coordenou o envio da diversas equipes de fiscalização. Os fiscais constataram a existência de fraudes que, apenas na rota Cuiabá-Santarém, envolveram cerca de 300 mil metros cúbicos de madeira ¿ o equivalente à carga de dez mil carretas.

¿ E isso apenas entre outubro de 2003 e janeiro de 2004.

O interventor não esconde que se considera uma ¿espécie rara em seu ofício¿.

¿ Não me submeto a pressões ¿ disse Ayres, em meio a pilhas de provas do esquema de fraudes desmantelado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal.