Título: `Ele me pediu R$350 mil¿, denuncia empresário
Autor: Jailton de Carvalho
Fonte: O Globo, 05/06/2005, O País, p. 8

TENTÁCULOS DO PODER: DONO DE FÁBRICA DE LACRES DE SEGURANÇA CONFIRMA PEDIDO DE PROPINA FEITO POR MAURÍCIO MARINHO

BRASÍLIA. Dono da Precision Componentes, empresa que fabrica lacres de segurança para placas de trânsito, o empresário Haroldo Cláudio Marschner pode se transformar numa testemunha-chave nas investigações da Polícia Federal sobre o suposto esquema de fraudes nos Correios. Dois dias depois de fazer uma denúncia em caráter reservado à direção dos Correios, Haroldo afirmou na sexta-feira ao GLOBO que o ex-chefe do departamento de Contratação da estatal Maurício Marinho cobrou propina de R$350 mil para poupar a Precision de duas multas de quase R$900 mil. É o primeiro empresário a declarar ter sido alvo de tentativa de extorsão nos Correios.

Segundo Marschner, o pedido foi intermediado por Júlio Boto, um dos assessores da diretoria de Operações dos Correios, em três encontros que eles tiveram numa churrascaria em São Paulo. O empresário diz que Boto, agindo como emissário de Marinho, pedia recursos para saldar compromissos com o PTB. Marschner disse que pode repetir a denúncia com detalhes no depoimento que deverá prestar ainda esta semana ao delegado da PF Luís Flávio Zampronha, encarregado das investigações:

¿ Ele (Boto) me pedia o dinheiro e dizia que era para o partido, o PTB. Dizia que o partido estava precisando. ¿Nós trabalhamos para eles. E eles estão precisando¿. Era assim que ele falava.

No almoço, pedido de R$350 mil para empresário

O empresário disse que as abordagens começaram numa reunião com Marinho, em novembro de 2004 em Brasília, quando a Precision estava na iminência de sofrer duas multas por atrasar a entrega de um lote de caixetas encomendadas pelos Correios. Marinho não fez qualquer pedido especial. Mas, dias depois, Marschner recebeu uma ligação de Brasília dizendo que Boto iria a São Paulo tratar do problema da empresa.

No almoço com Marschner em São Paulo, Boto teria pedido os R$350 mil para livrar a Precision da punição por descumprimento de contrato.

¿ Ele me pediu R$350 mil. Mas eu não posso pagar. Minha empresa é pequena.

Assessoria dos Correios diz que denúncias são infundadas

O empresário disse que, a partir daí, teve pelo menos mais dois encontros com Boto em São Paulo, mas não chegaram a um acordo. Marschner não gravou as conversas, mas diz que está disposto a participar de uma acareação com Boto para provar que o que diz é verdade. Procurado pelo GLOBO, Boto confirmou que teve pelo menos um encontro com Marschner em São Paulo, em novembro passado, mas negou que tenha cobrado propina. Segundo ele, a conversa se limitou à renegociação dos prazos de entregas das caixetas.

¿ Ele queria conversar em função de um prazo mais adequado (para as pendências da Precision). Foi dado um prazo maior para ele ¿ afirmou Boto.

O assessor alega, no entanto, que nada pediu ao empresário em troca do alongamento dos prazos. A assessoria de imprensa dos Correios considerou infundadas as acusações de Marschner. A explicação é de que, como a multa foi aplicada, o empresário não recebeu qualquer benefício especial.

¿ Ele (Marschner) tinha que entregar 240 caixetas, não entregou e foi multado em R$700 mil ¿ disse um dos assessores do presidente dos Correios, João Henrique.