Título: Lula foi avisado de mensalão
Autor: Cristiane Jungblut, Adriana Vasconcelos, Gerson C.
Fonte: O Globo, 07/06/2005, O País, p. 3

Planalto confirma ter sido informado de propina e PT nega

Adesarticulação entre Planalto e PT marcou ontem a reação do governo Lula à mais grave crise que já enfrentou desde a posse. Era preciso responder à denúncia do presidente do PTB, Roberto Jefferson, que em entrevista à ¿Folha de S.Paulo¿ disse ter avisado a Lula em janeiro sobre esquema de pagamento de mesada a deputados da base pelo PT. Mas a direção do partido, de manhã, soltou nota negando tudo e chamando de fantasias as declarações de Jefferson. Horas depois, num descompasso que tem marcado a relação do governo com o Congresso, após longa e tensa reunião no Palácio do Planalto com a presença de Lula, o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, confirmou que o presidente ouviu comentários de Jefferson sobre a mesada a parlamentares.

Aldo alegou que Jefferson falou sobre o assunto apenas ¿de passagem e de forma genérica¿ durante reunião em março, no Planalto, e que, ao fim desse encontro, o presidente Lula pediu que ele e o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), averiguassem a informação.

Numa tentativa de proteger o governo e principalmente o presidente Lula das acusações, Aldo disse várias vezes que o alvo das denúncias não é o governo, e sim partidos políticos, tomando o cuidado de não citar o PT. Nas consultas ao longo do dia e na reunião da coordenação política, Lula demonstrou indignação com a forma pela qual Jefferson tentou apresentar à opinião pública um relato que teria sido feito de maneira superficial.

¿ Não vamos esconder nada. Temos que contar tudo o que aconteceu. Jefferson não fez qualquer denúncia para mim, ele falou de um boato. Não dá para mandar investigar, sem ter indício ou prova, todas as futricas que as pessoas vêm aqui me contar ¿ disse Lula, segundo um dos participantes da reunião de ontem.

¿ Não quero saber de mensalão e não tenho medo de investigação. Se tiver alguém do PT envolvido, não quero nem saber, que se investigue. Não quero mentiras sobre nada ¿ completou.

Na reunião, Lula teria perguntado ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci, se ele conversara com Jefferson sobre o assunto, mas o ministro negou:

¿ Nunca. Conversei com Jefferson algumas vezes mas nunca sobre isso ¿ respondeu Palocci.

O presidente Lula passou o dia em reuniões. Até mesmo o chefe da Casa Civil, José Dirceu, que está na Espanha, foi acionado.

¿ Não há uma acusação contra o governo. O que há é uma denúncia envolvendo pagamento a outros partidos. E esses partidos, portanto, são o alvo dessa denúncia e não o governo. Não há acusação que relacione o pagamento a parlamentares por parte do governo. Portanto, o governo não sofreu qualquer tipo de acusação. É bom que fique claro ¿ disse Aldo.

Aldo disse que a reunião do presidente Lula com os dirigentes do PTB foi em março. Segundo Jefferson, foi em janeiro. Na agenda de Lula, consta um encontro com dirigentes do PTB no dia 23 de março, às 16h30m. Segundo Aldo, participaram Lula, Jefferson, o líder do PTB na Câmara, José Múcio Monteiro (PE), o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), e o ministro do Turismo, Walfrido Mares Guia, além dele.

¿ Estou aqui para esclarecer as circunstâncias nas quais o deputado Roberto Jefferson fez um comentário sobre o suposto pagamento a parlamentares, durante reunião com o presidente da República, com a participação de dirigentes do PTB, com minha presença e na presença do líder Arlindo Chinaglia. Quando se discutia a relação entre o governo e o PTB, de passagem, durante essa conversa, o deputado Roberto Jefferson fez referência ao pagamento a parlamentares ¿ disse Aldo Rebelo, acrescentando:

¿ E, encerrada esta reunião, durante a qual não foi feito nenhum comentário por nenhum dos presentes sobre a fala do deputado Jefferson, o presidente solicitou a mim e ao líder Chinaglia informações sobre o comentário do deputado.

Segundo Aldo, por causa dos comentários de Jefferson, ele e Chinaglia procuraram informações e souberam que a Câmara abrira processo na Corregedoria com base em entrevista dada do deputado Miro Teixeira ao ¿Jornal do Brasil¿, depois desmentida por ele; que havia outro procedimento na Procuradoria da Câmara e que um ofício foi encaminhado ao Ministério Público.

¿ Essas informações foram passadas ao presidente Lula, que solicitou a mim e ao líder que o mantivesse informado de qualquer novidade relacionada a esse comentário do deputado Jefferson ¿ contou Aldo Rebelo.

O ministro disse ainda que na ocasião da conversa não se fez qualquer pergunta a Jefferson porque se entendia que o deputado ¿teria espaço para fazer suas denúncias na Câmara¿. Aldo não quis responder se o governo vai investigar o PT e disse que era fantasia a informação de que Lula teria chorado ao saber das denúncias.

O vice-presidente José Alencar, do PL, também saiu em defesa do presidente Lula:

¿ Toda denúncia deve ser investigada rigorosamente. Como é que posso falar uma coisa que não sei? Se ele falou, deve ser investigado. O presidente é um homem público absolutamente correto. Eu não acredito que nada possa afetar o presidente, porque ele não tem nada a ver com isso.

O discurso de Aldo foi repetido pelos líderes do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), e na Câmara, Arlindo Chinaglia. Mercadante negou ontem a versão de Jefferson:

¿ Esta versão não corresponde aos fatos. Não houve denúncia. Houve um comentário sobre boatos que corriam na Câmara ¿ disse ele, que negou que Lula teria chorado:

¿ Quem conhece o presidente sabe que ele não é afeito a chorar, especialmente diante de fatos como este.

A primeira reação de Chinaglia foi negar que Jefferson tivesse dito a Lula que deputados recebiam mesada do tesoureiro do PT, Delúbio Soares:

¿ Claro que não! ¿ disse.

Horas depois, quando o Planalto confirmou a conversa, Chinaglia voltou atrás e também confirmou.

COLABOROU: Ilimar Franco