Título: Mensalão: um segredo que o Congresso todo sabia
Autor: Isabel Braga e Bernardo de la Peña
Fonte: O Globo, 07/06/2005, O País, p. 15

Denúncia formal sobre pagamento de propina feita à Corregedoria da Câmara, em 2004, foi arquivada em 14 dias

BRASÍLIA e SALVADOR. O pagamento de propina a deputados federais já havia sido citado, em diferentes momentos, pelo prefeito do Rio, Cesar Maia (PFL), pelo deputado Miro Teixeira (PT-RJ), ex-ministro e ex-líder do governo, e pelo ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP). Outros parlamentares e integrantes do governo também afirmaram já ter ouvido falar do caso.

A suspeita de que o governo teria pagado mesadas a deputados aliados em troca de apoio no Congresso foi alvo de uma denúncia formal na Corregedoria da Câmara em 24 de setembro do ano passado. A investigação não avançou: acabou arquivada 14 dias depois, sem ter sido apurada. O motivo: o ex-ministro e ex-líder do governo deputado Miro Teixeira (PT-RJ), citado como fonte da denúncia, recuou e negou ter dito que havia pagamento de mesada.

O assunto veio a público numa reportagem do ¿Jornal do Brasil¿ que atribuía ao ex-ministro a confirmação da denúncia. Na época, ele teria sido procurado por Jefferson. No mesmo dia em que o jornal divulgou a história, Miro encaminhou um e-mail ao então presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-RJ). Miro classificou como falsas as referências atribuídas a ele na reportagem. O jornal foi processado e teve de publicar direito de resposta.

Com base na negativa de Miro, no dia 6 de outubro, o corregedor da Câmara à época, deputado Luiz Piauhylino (PDT-PE), deu parecer pelo arquivamento do processo. Piauhylino afirma no parecer que nenhum nome de deputado, além de Miro, que nega a autoria da denúncia, é citado no texto como envolvido no suposto esquema.

¿Concluo que carece a denúncia feita pressuposto básico para seu conhecimento e conseqüente abertura de sindicância, que é a indicação do nome do deputado a quem pudesse ser atribuído comportamento infringente do decoro parlamentar. Somos, assim, pelo arquivamento do expediente em causa da iniciativa do senhor deputado Miro Teixeira¿, diz o parecer do corregedor.

Procuradoria pediu na Justiça direito de resposta

Embora o parecer pelo arquivamento só tenha sido dado em 6 de outubro, a Procuradoria da Câmara, acionada por João Paulo, enviou ao jornal no mesmo dia 24 de setembro pedido de direito de resposta com o mesmo destaque conferido à reportagem ¿ que foi manchete do jornal ¿ e atribuía a Miro a autoria da denúncia. O pedido não foi atendido. Depois do arquivamento, a Procuradoria pediu na Justiça o direito de resposta que foi publicado no dia 30 de outubro do ano passado.

João Paulo mandou ofício ao procurador-geral da República, Claudio Fonteles. O deputado não pediu a apuração da denúncia de suposto pagamento de mesada a deputados, mas providências por considerar que a honra da Câmara fora ofendida, o que configuraria, em tese, crime de difamação previsto no artigo 21 da Lei de Imprensa.

A acusação de que havia um esquema de pagamento de mesadas a deputados da base aliada também já havia sido feita no início deste ano pelo prefeito do Rio, Cesar Maia, em entrevista ao jornal ¿Folha de S. Paulo¿. Neste caso, dois deputados, Raul Jungmann (PPS-PE) e José Eduardo Cardozo (PT-SP), pediram providências ao procurador da Câmara, deputado Ney Lopes (PFL-RN). Na semana passada, depois de receber uma retratação do prefeito carioca, Lopes decidiu arquivar o caso. Cesar respondeu dizendo que não tinha intenção de ofender a imagem da instituição.

¿ Entendi como uma retratação cabal. Ele disse que não teve intenção de ofender ¿ explicou Lopes.

O presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), disse ontem que todo mundo no Congresso sabia da existência do ¿mensalão¿.

¿ Eu já sabia disso e todo mundo no Congresso também sabia, só não tínhamos como comprovar ¿ disse o senador ao embarcar para Brasília.

ACM afirma que vai rezar pela permanência de Palocci

Para ACM, a instalação da CPI para apurar denúncias de corrupção nos Correios, que o governo vinha tentando evitar, tornou-se inevitável.

¿ Agora não tem mais jeito, tem que ter CPI, e não somente a dos Correios. Tem que ser instalada a da Infraero, do Instituto de Resseguros do Brasil, e todas as que estiverem pendentes ¿ afirmou.

Na avaliação do senador baiano, é impossível que a imagem do governo fique mais desgastada do que está. Ele assinala que a única saída para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva é mudar radicalmente sua equipe.

¿ Em minhas orações, vou rogar a Deus pelo Palocci, que, pelo menos para mim, é o único da equipe que escapa ¿ ironizou, completando que, sem mudanças, Lula não se reelege.

COLABOROU Heliana Frazão