Título: SABÃO EM PÓ E AMACIANTE SOB INVESTIGAÇÃO
Autor: Ana Cecília Santos
Fonte: O Globo, 08/06/2005, Economia, p. 29

Ministério Público apura denúncia de que produtos usam componentes nocivos à saúde e ao meio ambiente

O Ministério Público (MP) do Rio iniciou uma batalha contra os fabricantes de sabão em pó e amaciante porque os produtos têm componentes - fósforo e quaternário de amônia, respectivamente - que oferecem risco à saúde do consumidor e ao meio ambiente. A partir de uma denúncia feita pela Associação Brasileira de Defesa do Consumidor Pro Teste, o MP abriu inquérito civil para investigar o problema. O promotor Rodrigo Terra, da promotoria de Defesa do Consumidor do MP, enviou aos principais fabricantes de sabão em pó e amaciante do país uma notificação, propondo a assinatura de um termo de ajustamento de conduta (TAC) para que retirem de suas fórmulas os componentes prejudiciais ao meio ambiente e ao consumidor.

Segundo a Pro Teste, ambos os componentes ameaçam a vida marinha de rios e lagos, e podem causar alergias e irritações na pele e olhos. Se ingeridos, são altamente tóxicos e podem matar.

- A maioria dos fabricantes informa na embalagem que o produto é perigoso e não deve ser manuseado por crianças. No entanto, o alerta está em letras miúdas, de difícil leitura. Já os riscos ao meio ambiente sequer são mencionados - afirma Alessandra de Macedo, coordenadora de testes comparativos da Pro Teste.

MP considera propaganda abusiva e enganosa por omitir informação

A Pro Teste realizou uma análise em 11 marcas de sabão em pó, e em oito - Ace, Ariel, Bold, Biju, Brilhante, Minerva, Omo Multiação e Surf (ex-Campeiro) - verificou a presença de fósforo na fórmula. Não foi encontrado fósforo nas marcas Pop, Sendas e Extra. Já o teste dos amaciantes, feito em 15 marcas (Great Value, Fleur de Ypê, Baby Soft, Extra, Compre Bem, Kokino's, Mon Bijou, Mazal, Comfort, Urca, Fofo, Plush, Big Soft, Minuano e Sendas), encontrou quaternário de amônia em todas.

Para Terra, a propaganda desses produtos não obedece ao Código de Defesa do Consumidor (CDC).

- A propaganda é abusiva porque omite que o produto desrespeita valores ambientais. E também é enganosa, porque não alerta corretamente o consumidor dos riscos a que ele está exposto - afirma.

Segundo o promotor, a falta de informação sobre os danos que os produtos podem causar impede o consumidor de exercer corretamente o seu direito de escolha:

- Sem saber que o produto é nocivo ao meio ambiente, o consumidor é impedido, por exemplo, de optar por outro, que seja biodegradável.

O promotor afirma que, se as empresas não aceitarem assinar o TAC, vai entrar com uma ação civil pública contra os fabricantes de sabão em pó e amaciante. As empresas têm dez dias para se pronunciar a partir do recebimento da notificação. Segundo o MP e a Pro Teste, o Ministério do Meio Ambiente publicou em abril a resolução 359, que prevê uma redução na quantidade de fósforo na fórmula dos sabões em pó. A Pro Teste reclama que, mesmo assim, a legislação brasileira é atrasada, pois na Europa o uso de fósforo em detergentes em pó é proibido.

- Os dois maiores fabricantes do país, Unilever e Procter & Gamble, produzem em outros locais do mundo detergentes sem fósforo. Será que é uma questão de legislação, já que aqui não é proibido e lá é, ou as empresas só têm preocupações ambientais fora do Brasil?

O químico José Eduardo Bevilacqua, gerente da Divisão de Qualidade das Águas da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) de São Paulo, e relator, no Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama, do Ministério do Meio Ambiente), do grupo técnico de discussão da elaboração da resolução 359, reconhece que muitos países já aboliram o uso do fósforo, mas diz que a resolução foi um primeiro passo no controle do problema. Segundo Bevilacqua, o fósforo limita os processos ecológicos e provoca o enriquecimento da água com nutrientes que favorecem a proliferação de algas, algumas tóxicas.

- O uso do fósforo em detergentes em pó já é proibido na Alemanha, Itália, Suíça, Holanda, no Japão e em 27 estados americanos. Durante a elaboração da resolução 359, os fabricantes do setor alegaram que não seria economicamente viável para a indústria nacional abolir o uso do fósforo. Para avançarmos na discussão, buscamos um consenso. A redução será gradativa, com um cronograma inicial de três anos, período em que o limite máximo de fósforo na formulação dos detergentes em pó cairá dos atuais 6,7% para 4,8% - explica Bevilacqua.

Abolição do fósforo em detergentes em pó não está descartada

O químico diz que os resultados da medida provocarão uma redução na quantidade diária de toneladas de fósforo lançadas no ambiente, mas garante que os órgãos continuarão atentos ao problema.

- Estima-se que vamos passar de 64 toneladas/dia para 46 toneladas/dia, o que ainda é muito, já que o fósforo é uma substância cumulativa, o que aumenta progressivamente seu efeito danoso ao meio ambiente. Se a redução não tiver um impacto positivo, podemos partir para abolição do uso do fósforo - afirma Bevilacqua.

A Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Limpeza e Afins (Abipla) informou em nota que nem as empresas de sabão em pó, nem as de amaciantes, citadas no teste da Pro Teste, receberam a notificação do MP do Rio. A Abipla nega que o fósforo seja uma substância nociva às pessoas e ao meio ambiente. A entidade ressalta que as medidas adotadas pela resolução 359 permitirão um ganho ambiental sem qualquer ônus para o consumidor, nem quanto à qualidade dos produtos, nem quanto aos preços.

Sobre o uso de quaternário de amônia em amaciantes, a Abipla informa que este composto não é proibido em nenhum país. Segundo a entidade, as dosagens usadas nos amaciantes nacionais estão absolutamente adequadas para o uso dos consumidores, sem representar qualquer risco à saúde das pessoas. Em relação a problemas de informação na embalagem, a Abipla diz que as empresas obedecem às determinações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

DEFESA DO CONSUMIDOR

ONDE RECLAMAR A Promotoria de Defesa do Consumidor do Ministério Público, na Avenida Nilo Peçanha, 26, tel. 2240-2081, atende a problemas coletivos, como propaganda enganosa, queixas contra planos de saúde, entre outros