Título: NÓ BOLIVIANO
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Fonte: O Globo, 09/06/2005, Opinião, p. 6
A julgar pela declaração sobre a Bolívia que a OEA emitiu em Fort Lauderdale, a participação da entidade hemisférica no desfecho da crise política em que se acha mergulhado o país andino será modesta, para dizer o mínimo. No documento, os 34 países-membros se limitaram a fazer um apelo às autoridades bolivianas, pedindo calma e respeito aos direitos humanos e recomendando o diálogo.
A verdade é que, uma vez aceita pelo Congresso a renúncia do presidente Carlos Mesa, a OEA não tem muito mais a oferecer para assegurar o cumprimento dos preceitos constitucionais bolivianos, ou mesmo para afastar a ameaça de desmembramento territorial do país.
A Carta Democrática Interamericana de 2001, pela qual os países-membros da OEA se comprometem a proteger a ordem constitucional nas Américas, só pode ser invocada pelo país que se sinta ameaçado, nunca pelos outros. E, tanto quanto se sabe, mesmo acuado por violentos protestos de rua, Mesa preferiu apresentar sua renúncia ao Congresso boliviano uma segunda vez a pedir socorro à OEA.
É evidente, entretanto, que a Bolívia necessita de ajuda para preservar sua ordem constitucional, e os vizinhos não podem se dar ao luxo da omissão. O pedido de renúncia do presidente paralisou o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, e semanas de manifestações em la Paz e de estradas bloqueadas resultaram em desabastecimento e num clima generalizado de desordem e excessos que beira a anarquia. Que condições terá o sucessor de Mesa de manter a estabilidade necessária para realizar eleições? Como convencer o deputado e líder cocaleiro Evo Morales, aspirante à Presidência, a negociar com o governo central para garantir a governabilidade?
O Brasil é parte do imbróglio boliviano, o que dificulta a ação diplomática direta. Mas por que não se juntar a Argentina, Paraguai e Uruguai para invocar a cláusula democrática do Mercosul, do qual a Bolívia é membro associado? Como ficou demonstrado no Paraguai, o dispositivo é um instrumento de pressão que, bem usado, pode persuadir os protagonistas do drama boliviano a fazerem concessões, ponto de partida para qualquer solução negociada.
Mercosul pode ser decisivo numa solução para a crise