Título: CPI começa com ameaças
Autor: Adriana Vasconcelos e Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 10/06/2005, O País, p. 3

Acuado, governo tenta incluir gestão FH na investigação, agravando disputa com a oposição

O embate entre governistas e oposição marcou a abertura da sessão de instalação da CPI Mista dos Correios ontem. A estratégia do Planalto foi exposta logo no início pelo líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP). Ele disse que as investigações não ficarão restritas à gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas atingirão também o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

A determinação do Planalto e do PT para revolver o passado ficou clara também na proposta de uma CPI exclusiva da Câmara, encaminhada pelos petistas, para apurar todas as denúncias de compra de votos de parlamentares desde 1997, o que inclui a suspeita de cooptação de parlamentares para aprovar a emenda da reeleição durante o governo Fernando Henrique.

- O senhor Maurício Marinho, que foi flagrado recebendo R$3 mil de suborno, era funcionário dos Correios há 28 anos. Não acredito que ele tenha começado a agir assim agora. Queremos uma investigação ampla, que inclua os dois anos e seis meses do governo Lula e o passado também - avisou Mercadante na primeira sessão da CPI mista, sob aplausos da base governista.

O líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM), reagiu de imediato:

- Não temos problema de investigar os últimos dez anos e meio da administração dos Correios, os dois anos e meio relativos ao governo Lula e os oito de Fernando Henrique, mas devemos começar pelo presente.

Virgílio lamentou o que chamou de ânsia para investigar o passado:

- Na CPI do Mensalão (proposta na Câmara), também querem investigar a compra de votos da reeleição. Para ouvir o ex-ministro Sérgio Motta será necessária uma sessão espírita, já que ele não está mais entre nós. Podem investigar o que quiserem.

Como titular mais velho da CPI, o senador Jefferson Peres (PDT-AM) comandou a primeira reunião, que acabou suspensa menos de uma hora depois para nova tentativa de acordo para indicação do presidente e do relator da CPI. O impasse permaneceu e a escolha ficou para terça-feira.

- Vamos ver se em 72 horas acabamos com a marcha da insensatez - afirmou Peres.

Com o impasse, governo e oposição iniciaram uma negociação nos bastidores buscando um nome de consenso. Para a presidência da CPI Mista, seria indicado o nome do deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR). O governo indicaria um senador do PMDB ou do PT para a relatoria. Apesar de ter a maioria para eleger o presidente - neste caso seria o senador petista Delcídio Amaral (MS) - o temor do governo era aumentar o desgaste junto à opinião pública com a impressão de que estaria controlando a CPI.

- A CPI não vai acabar em pizza, mas começa em pizza - disse o líder da minoria, senador José Jorge (PFL-PE).

A oposição aceitou adiar a decisão na expectativa de que durante o fim de semana surjam novas denúncias.

- O governo está optando pelo pior. Eles estão com uma hemorragia - disse Arthur Virgílio.

Na primeira parte da sessão, Mercadante pregou um acordo com a oposição. Afirmou que o governo deixara claro que aceitaria entregar uma das vagas ao bloco oposicionista do Senado, desde que este indicasse um nome que tivesse o aval do governo. A escolha da oposição, o senador César Borges (PFL-BA) para a relatoria, foi rechaçada pela base aliada.

- Não tenho nada contra o senador César Borges, mas seria melhor alguém com mais experiência regimental - justificou Mercadante, lembrando que o senador baiano está no seu primeiro mandato.

Representantes da oposição aproveitaram para sugerir a senadora Heloísa Helena (P-SOL-AL).

- Eu aceito - respondeu de pronto a senadora expulsa do PT.

Os governistas tentaram um acordo com o PFL para a presidência da CPI. A proposta era nomear o senador Edson Lobão (PFL-MA), aliado do ex-presidente José Sarney (PMDB-AP).

Diante da resistência do próprio partido à sua indicação, Lobão recusou. Se o impasse continuar, os governistas deverão aprovar, no voto, Delcídio para presidente da CPI e o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR) para a relatoria. O governo tem 19 dos 32 votos da CPI dos Correios.

OS TITULARES DA CPI DOS CORREIOS

SENADORES

PFL/PSDB: Heráclito Fortes (PFL-PI), César Borges (PFL-BA), Sérgio Guerra (PSDB-CE), Álvaro Dias (PSDB-PR) e Demóstenes Torres (PFL-GO)

PMDB: Luiz Otávio (PA), Wirlane da Luz (RR), Maguito Vilela (GO), Ney Suassuna (PB)

PT-PSB-PL-PPS: Delcídio Amaral (PT-MS), Ideli Salvatti (PT-SC), Tião Viana (PT-AC) e Aelton Freitas (PL-MG)

PDT: Jefferson Peres (AM)

PTB: Fernando Bezerra (RN)

P-SOL: Heloisa Helena (AL)

DEPUTADOS

PT: Carlos Abicalil (MG), Jorge Bittar (RJ) e Maurício Rands (PE)

PMDB: Asdrúbal Bentes (PA), Osmar Serraglio (PR) e Fernando Diniz (MG)

PFL: Antonio Carlos Magalhães Neto (BA) e Onyx Lorenzoni (RS)

PSDB: Eduardo Paes (RJ) e Gustavo Fruet (PR)

PP: Nélio Dias (RN) e Nelson Meurer (RR)

PTB: José Múcio Monteiro (PE)

PL: Sandro Mabel (GO)

PPS: Denise Frossard (RJ)

PDT: Álvaro Dias (RN)

Legenda da foto: TENSÃO NA estréia: os governistas Paulo Rocha e Arlindo Chinaglia (de pé, ao centro), e o oposicionista Rodrigo Maia (sentado)