Título: Em busca dos arquivos perdidos
Autor: Cristiane Jungblut e Isabel Braga
Fonte: O Globo, 21/10/2004, O país, p. 3

Um dia depois de o ex-araponga José Alves Firmino afirmar que o Exército ainda mantém arquivos da ditadura, o ministro da Defesa, José Viegas, admitiu ontem ser possível que nem todos os documentos do período tenham sido destruídos. Viegas insistiu, no entanto, que os registros oficiais sobre a Guerrilha do Araguaia foram destruídos na década de 80. O ministro acrescentou que desconhecia a informação de Firmino, mas afirmou que vai apurar se é verdade o que diz o ex-araponga.

¿ Não conheço o cabo Firmino. Todas as minhas declarações sobre o arquivo se referem ao Araguaia e não a outros arquivos. Desconheço se há outros arquivos, não fiz essa pesquisa. Se for necessário (fazer a pesquisa), evidente que (será feita) sim ¿ disse Viegas.

Mas o ministro foi enfático ao dizer que não há motivação para "revolver os casos do passado":

¿ Preciso ler as declarações e vou procurar me informar a esse respeito. Mas não tenho motivação de ficar revolvendo os casos do passado. Eles pertencem à História e devem ser analisados por historiadores. Isso não faz parte da preocupação imediata do ministro da Defesa.

O ministro disse ainda que a nota divulgada anteontem pelo Exército sobre o caso Vladimir Herzog foi necessária para "corrigir distorções e enfoques errôneos publicados na nota de domingo". Viegas disse esperar que não haja seqüelas nem reação de setores militares depois da divulgação da segunda nota lamentando a morte de Herzog. Para o ministro, o caso está encerrado.

¿ Sempre tive e continuo mantendo confiança no profissionalismo das Forças Armadas, de maneira que não prevejo nenhuma seqüela.

Segunda nota causou polêmica

Mas militares ligados ao Palácio do Planalto admitem que a retratação e o pedido de desculpas do comando do Exército podem ter desagradado a setores das Forças Armadas, principalmente entre os militares da reserva.

A Presidência da República considerou o episódio encerrado, por enquanto. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva analisou possíveis demissões, mas concluiu que isso só aumentaria a crise. De qualquer maneira, Viegas e o comandante do Exército, Francisco Albuquerque, saíram enfraquecidos do episódio.

No Rio, a vice-presidente do Tortura Nunca Mais, Cecília Coimbra, disse que as informações de Firmino confirmam o que a entidade sustenta há mais de 20 anos: que os arquivos sobre os mortos e desaparecidos ainda existem. ¿Desde a época em que Itamar Franco era presidente nós insistimos nisso. A última negativa recebemos pessoalmente do secretário nacional de Direitos Humanos, Nilmário Miranda¿, disse ela, em nota.

Segundo Cecília, hoje deverá estar pronto o documento que o Tortura preparou para lançar uma campanha internacional pela abertura dos arquivos da ditadura militar.

Viegas participou ontem de sessão solene na Câmara em homenagem ao Dia do Aviador e da Força Aérea Brasileira (FAB), ao lado dos comandantes da Aeronáutica, brigadeiro Luiz Carlos da Silva Bueno, e da Marinha, almirante Roberto de Magalhães Carvalho. O comandante do Exército mandou o general José Felipe Biasi, subsecretário de Economia e Finanças, para representá-lo, porque estaria numa reunião do Alto Comando.

O chefe do Centro de Comunicação da Aeronáutica, brigadeiro Antonio Telles Ribeiro, afirmou que os arquivos da Aeronáutica da época da ditadura foram destruídos.

¿ Os arquivos ficavam no Aeroporto Santos Dumont e foram destruídos quando o aeroporto pegou fogo ¿ disse Telles Ribeiro.