Título: Ex-araponga ajudou empresário a gravar conversa com chefe dos Correios
Autor: Rodrigo Rangel
Fonte: O Globo, 13/06/2005, O País, p. 4

BRASÍLIA. Peça-chave na gravação do vídeo da propina nos Correios, Jairo Martins, que se apresenta como jornalista, trabalhou para o extinto Serviço Nacional de Informações (SNI) e para a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), o serviço secreto do governo federal, entre os anos de 1993 e 2001. Martins, que na verdade é cabo da Polícia Militar do Distrito Federal, foi um dos articuladores do flagrante. Foi ele, por exemplo, que forneceu a mala com câmera usada para gravar o ex-chefe dos Correios Maurício Marinho. Também foi o responsável por entregar a gravação à revista "Veja".

A descoberta da participação do espião, conjugada com seu histórico de serviços prestados à comunidade de inteligência, contribui para tornar ainda mais nebulosa a verdadeira intenção da gravação. Se por um lado a Polícia Federal e o MP reforçam a desconfiança de que setores da Abin possam estar envolvidos com a gravação, por outro a agência, que tem a função oficial de assessorar o presidente da República, levanta a suspeita de que, por detrás da trama, estejam interesses políticos.

Abin tem policiais em seus quadros desde a ditadura

Desde os tempos da ditadura o serviço secreto brasileiro possui em seus quadros policiais civis e militares de Brasília. A Abin suspeita que parte desses funcionários possa estar envolvida em trabalhos paralelos destinados a prejudicar o governo. Como parte dessa vertente de investigação, o diretor-geral da agência, Mauro Marcelo de Lima e Silva, cita o envolvimento desses agentes-policiais com casos rumorosos que deram dor de cabeça ao Planalto nos últimos meses - o escândalo protagonizado por Waldomiro Diniz é um deles.

- A Abin já vem avaliando há algum tempo a extensão desse problema - diz Lima e Silva.

Para o Ministério Público Federal, as reais ligações de agentes da Abin com a gravação nos Correios ainda são um mistério. A PF já havia flagrado conversas de um experiente investigador da agência com o ex-araponga José Fortuna, preso desde quinta-feira por envolvimento no esquema. A Abin garantiu que seu agente estava em missão oficial. O MP pediu comprovação, mas o procurador Bruno Acioli disse que até agora os documentos não chegaram.

- Nós pedimos que o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (ao qual está vinculada a Abin) apresentasse os documentos secretos e não-secretos produzidos nos últimos seis meses que possam ter algum relação com o caso. O prazo para o envio desses documentos já se esgotou e, até agora, nada - disse Acioli.

Jairo Martins, que até então se apresentava como jornalista, seria ouvido ontem à noite pela Polícia Federal e pelo Ministério Público. Ele concordou em prestar esclarecimentos após negociar com os investigadores. A previsão era de que o depoimento dele entrasse pela madrugada.

Segundo Joel dos Santos Filho, um dos suspeitos de fazer a gravação, preso desde quinta-feira, o empresário Artur Washesk Neto, dona da Comam, foi quem lhe apresentou Jairo Martins, com quem aprendeu a operar a maleta-câmera que flagrou Marinho. Ele também contou que foi a Martins que entregou a fita.

O deputado Roberto Jefferson foi procurado pela PF, que quer ouvi-lo. Ele mandou dizer por seu advogado que só prestará depoimento após ser ouvido na Câmara dos Deputados.

Filmagem a R$5 mil

O bacharel em Direito Joel dos Santos Filho admitiu ontem que filmou, por R$5 mil, a conversa com o ex-diretor dos Correios Maurício Marinho. À PF, Santos Filho disse ter ouvido de Artur Washesk, empresário que teria encomendado a gravação, que o objetivo era derrubar Marinho. O ex-diretor teria contrariado interesses seus nos Correios.

Santos Filho disse que o militar da reserva Arlindo Molina, também preso, tentou negociar a gravação com Roberto Jefferson. E que foi Washesk quem lhe apresentou a Jairo Martins, que o ensinou a usar a maleta-câmera. Foi a Martins que ele entregou a fita.