Título: Deputada: um partido da base ofereceu dinheiro
Autor: Deborah Berlinck
Fonte: O Globo, 14/06/2005, O País, p. 10

Raquel Teixeira, do PSDB de Goiás, confirma tentativa de suborno para que trocasse de legenda e diz que vai à CPI

PARIS. A deputada Raquel Teixeira (PSDB-GO) confirmou ontem que recebeu uma proposta de dinheiro para mudar de partido, feita por um partido da base do governo Lula, e que daria detalhes à CPI. Alegando não ter provas, ela não quis confirmar, mas também não negou a informação de que foi o líder do PL, Sandro Mabel (GO), quem lhe ofereceu R$1 milhão pela mudança, além de R$30 mil a R$50 mil por mês para apoiar o governo no Congresso. Abalada, com os olhos cheios de lágrimas, a deputada confessou estar vivendo um dilema entre o dever da ética e o da responsabilidade. Raquel está em Paris integrando a comitiva do governo de Goiás que participa da divulgação de eventos culturais do estado.

A senhora foi convidada a mudar de partido?

RAQUEL TEIXEIRA: A verdade me obriga a dizer: sim, eu fui convidada a mudar de partido. Mas a responsabilidade também me obriga a parar por aqui, porque não posso falar... Porque vai ser a palavra de uma pessoa contra a palavra de outra que fez o convite.

Foi o Sandro Mabel (líder do PL na Câmara)?

RAQUEL: Fui convidada com condições privilegiadas. Eu fui convidada, claro, a mudar de partido e me foram oferecidas algumas condições das quais prefiro não falar.

Por exemplo?

RAQUEL: De prestígio no partido.

Dinheiro?

RAQUEL: Dinheiro também.

De que partido?

RAQUEL: De um partido da base aliada do governo.

E se a senhora for convidada a depor na CPI?

RAQUEL: Se eu for convidada pela CPI vou com todo o prazer, até porque lá acho que existe uma situação diferente, de proteção jurídica do que falar. Não tenho como provar. Eu falaria com todo o prazer.

A senhora acaba de admitir que a proposta envolveu dinheiro. O que falta para falar?

RAQUEL: Falta falar quem foi, de que jeito foi, entende?

Sandro Mabel a procurou para mudar de partido?

RAQUEL: (sorriso) Parece que ele declarou isso lá em Goiânia. Eu não falei o nome dele em lugar nenhum. Na verdade, eu falei deste assunto, quando aconteceu, com o governador (de Goiás, Marconi Perillo) e com mais ninguém. Todo mundo que falou até agora em meu nome, o fez indevidamente. Mas o governador não falou o meu nome em momento algum.

Quem foi o outro deputado (que recebeu proposta do mensalão)?

RAQUEL: Ah, não sei.

Existe a informação de que Waldomiro Diniz (ex-assessor do Planalto, flagrado cobrando propina do empresário Carlinhos Cachoeira) também falou com a senhora.

RAQUEL: Não.

Ele não tem nada a ver com isso?

RAQUEL: Não, ele não tem nada a ver com isso.

A senhora falou com José Dirceu?

RAQUEL: Sobre isso, não.

Qual a sua avaliação sobre o que está acontecendo?

RAQUEL: (Vejo) com tristeza, lamentando. Mas acho que veio à tona uma coisa que cedo ou tarde ia explodir.

Eles tentaram no partido errado?

RAQUEL: Não sei. Não quero fazer julgamento de outras pessoas. Respondo pelos meus atos. Acho que deve ser apurado até as últimas conseqüências. Acho que é um momento importante da vida política brasileira. Veio à tona um problema muito grave.

A senhora acha que por falta de provas seria impossível acusação e condenação?

RAQUEL: Temos que ver a evolução. Mas acho que podem surgir provas.

A senhora diz que sofreu uma tentativa de suborno. Não pensa processar quem lhe fez esse convite?

RAQUEL: Foi um convite até revestido de um certo prestígio. Eu teria uma situação... eu sou ligada à área da educação. Eu sairia pelo Brasil vinculando a imagem da educação a este partido. Era uma tentativa do partido de repaginar, de dar um aspecto diferente. Eu daria um perfil diferente ao partido. Em momento algum foi coação. Foi realmente um convite.

Mas houve oferta de dinheiro.

RAQUEL: Também.

Como a senhora reagiu?

RAQUEL: Eu agradeci. É o meu primeiro mandato. Por isso que eu fui conversar com o governador. Ele é meu orientador político. Fui tentar entender o que estava acontecendo. Fiquei meio perplexa e fui trocar idéias.

Há a informação de que foi uma proposta de R$30 mil e depois de R$50 mil.

RAQUEL: Não sei.

A senhora confirma ou nega?

RAQUEL: Não confirmo nem nego.

E a informação de que teria tido oferta de R$1 milhão para trocar de partido?

RAQUEL: Não confirmo nem nego.

Se a senhora fala que houve uma oferta de dinheiro, por que não fala o valor?

RAQUEL: É um feeling (sentimento). Não sei.

A senhora consultou um advogado?

RAQUEL: É por isso que eu estou até receosa, entende? Meu cuidado é até este.

Tem conversado com o pessoal do partido?

RAQUEL: Não, vou conversar agora.

A senhora acha que o presidente Lula sabia deste tipo de abordagem no Congresso?

RAQUEL: Não tenho contato com o presidente.

A senhora acredita que outra pessoa do governo sabia?

RAQUEL: Acredito.

Por quê?

RAQUEL: Porque estou lendo os jornais. Parece claro isso.

Isso chocou a senhora?

RAQUEL: Nessa idade, sou mais madura e não me choco facilmente. Mas me surpreendeu profundamente, lógico.

Isso é generalizado na classe política?

RAQUEL: Em hipótese alguma. Um dos riscos deste momento é generalizar. O Congresso é o reflexo do Brasil. É injusto com o Congresso generalizar. Eu tenho muito orgulho de ser deputada. Não foi a carreira que tracei para mim. Escolhi ser professora universitária. A política apareceu por acaso. Tenho feito esforço de manter a coerência que sempre mantive na vida.

Na abordagem, foi falado o nome do Delúbio Soares, do Dirceu ou alguém do PT?

RAQUEL: Não. Não quero entrar em detalhes. Não quero falar de coisas que não posso provar.

Mas na CPI a senhora falaria mesmo sem provas?

RAQUEL: Eu tenho que ver. Acho que na CPI tenho proteção jurídica.

A senhora foi contactada por alguém do Planalto enquanto estava em Paris?

RAQUEL: Prefiro não entrar nisso.

Mas a senhora foi?

RAQUEL: Foi um prazer conversar com vocês.