Título: Na Câmara, clima de Copa do Mundo com telões instalados nos corredores
Autor: Isabel Braga e bernardo de la Peña
Fonte: O Globo, 15/06/2005, O País, p. 4

Senado também parou, mas funcionários evitaram críticas ou aplausos

BRASÍLIA. O plenário da Câmara ontem abriu apenas para que os deputados registrassem a sua presença. Por corredores e salas de comissões, dezenas de pessoas se reuniam em torno dos telões instalados para transmitir o evento. O clima que cercou o depoimento do presidente do PTB, Roberto Jefferson (RJ), no Conselho de Ética da Câmara não foi diferente dos que antecedem as finais de Copa do Mundo. O Senado também parou à tarde, só iniciando a sessão depois da primeira parte do depoimento.

Mas, diferentemente de uma disputa de futebol, a torcida era discreta. Poucos espectadores se atreveram a aplaudir ou criticar Jefferson e seus colegas deputados. O clima ainda é de cautela.

- Onde é que você vai ver o jogo? - brincava o líder do governo no Congresso, senador Fernando Bezerra (PTB-RN), numa tentativa de descontrair o clima.

Forte esquema de segurança na chegada do deputado

Com esquema de segurança similar ao de um cantor famoso, Jefferson - que completou 52 anos ontem - chegou à Câmara escoltado por dois carros da Polícia Legislativa e outro da Polícia Militar do Distrito Federal por volta das 14h. Ele entrou por uma passagem discreta e diferente da usada pela maior parte dos visitantes, funcionários e parlamentares e foi direto para uma sala ao lado da comissão, onde ficou esperando por aproximadamente 40 minutos pelo início da reunião.

Depois que começou a falar, foram quase 55 minutos de discurso ininterrupto, com todas as atenções da Casa voltadas para ele. As declarações de Jefferson provocaram reações irônicas entre os deputados na sala do depoimento e servidores, lobistas e jornalista que estavam numa sala ao lado, onde tinha um telão. Os acusados reagiram indignados. O espetáculo chamava atenção até dos mais humildes funcionários:

- Você viu? Ele falou na cara do Valdemar que ele recebia dinheiro! - surpreendeu-se um funcionário terceirizado da Câmara, que interrompeu as suas tarefas diárias de limpeza para assistir ao depoimento, numa referência ao presidente do PL, Valdemar da Costa Neto (SP).

Bate-boca entre Jefferson e Costa Neto resvala a baixaria

No plenário da comissão o clima era de tensão nas primeiras horas, devido ao tom contundente de Jefferson. O bate-boca foi intenso e chegou a resvalar para a baixaria quando o embate ocorreu entre Jefferson e Valdemar. Quando o primeiro acusava o segundo de gostar de jogo e mulheres, com certa ironia no tom de voz, e o presidente do PL reagia insinuando que Jefferson gostaria de rapazes, os demais deputados levantaram a voz para pedir respeito e que a discussão não fosse para a baixaria.

Quando o líder do PL na Câmara, Sandro Mabel (GO), também acusado de ser o intermediário para o pagamento de mensalão a deputados na sua bancada, queria falar e o presidente do Conselho, Ricardo Izar (PTB-SP), pediu que ele se apressasse, também houve reação:

- Deixa ele falar - gritaram deputados do fundo do plenário.

E Mabel falou muitas e muitas vezes que é um trabalhador honesto, que já empacotou e carregou muitas caixas de biscoitos em sua vida e que não precisa da política para sobreviver.

O clima, por fim, era de grêmio colegial. Já por volta das 20h15m, quando algumas perguntas já se repetiam, os deputados também comemoraram quando a deputada Luciana Genro (PSOL-RS) interrompeu as perguntas que a deputada Angela Guadagnin (PT-SP) fazia ao presidente do PTB.

- É isso aí, Luciana! - apoiaram os parlamentares mais no fundo da sala.

"Por que eu ia envenenar com essa conversa um jantar?"

Jefferson ainda provocou risos em alguns momentos. Num deles, ele explicava por que não apresentou a denúncia - que está fazendo agora - ao presidente Lula, por exemplo, em um jantar na sua casa em outubro do ano passado. Jefferson disse que se tratava de uma questão de gentileza, porque Lula conversava com seus convidados outros assuntos que não referentes a política:

- Lá, ele relaxou. Ficou feliz. Por que eu ia envenenar com essa conversa um jantar na minha casa? - disse o deputado provocando risos.

De manhã, antes do depoimento, Jefferson recebeu uma cesta de café da manhã, flores, chocolates e um presente enviado pelos Correios. E teve aula de canto para relaxar.

Legenda da foto: COSTA NETO, presidente do PL, durante o discurso de Jefferson