Título: SERENIDADE
Autor:
Fonte: O Globo, 16/06/2005, Opinião, p. 6

Economia e política não estão desassociadas, mas os mercados, felizmente, ainda não se deixaram contaminar pelo clima que envolve Brasília, com uma profusão de denúncias de corrupção. E a razão para essa reação serena é só uma: a economia brasileira de fato está menos vulnerável a crises de ordem financeira. Essa blindagem, como dizem os analistas de investimento, baseia-se nos excelentes resultados das exportações, que levam o país hoje a dispensar financiamentos em moeda estrangeira para equilibrar as contas do balanço de pagamentos, e na manutenção do superávit primário nas finanças públicas.

Com isso, as autoridades monetárias não precisam ter suas atenções desviadas do esforço para neutralizar a pressão inflacionária que se verificou nos últimos meses. Esforço bem-sucedido, como demonstram os últimos índices e a decisão do Copom de interromper o ciclo de alta dos juros, estabilizados em 19,75% anuais.

Mesmo com todo esse ambiente de crise política em Brasília, os analistas de investimento são quase unânimes em projetar uma queda nos índices de preços, em especial o IPCA, calculado pelo IBGE, usado como parâmetro para as metas de inflação definidas pelo governo.

Desse modo, já se poderia vislumbrar um alívio na política monetária no segundo semestre, permitindo que a economia respire e imprima um ritmo de crescimento ligeiramente mais acelerado. Talvez já não seja possível alcançar a almejada expansão de 4% no Produto Interno Bruto (PIB) de 2005. O primeiro semestre teve de ser sacrificado pela necessidade de se conter a pressão inflacionária. Havia de fato o risco de os índices de custo de vida voltarem ao patamar de dois dígitos, e os brasileiros sabem muito bem que a partir desse ponto a inflação ganha uma dinâmica muito mais difícil de ser controlada.

Os problemas estruturais da economia brasileira obrigam o Banco Central a adotar uma política de juros elevados para dominar a inflação. O nível atual das taxas de juros é certamente temporário, pois, além de ser suficiente para inverter a trajetória da inflação, como se vê, gera efeitos colaterais nocivos. Dependendo do comportamento dos índices de preços em junho e julho, os juros básicos poderão trilhar a rota de descida, dando ânimo ao mercado interno, atualmente ofuscado pelas exportações.

Copom melhora perspectivado segundo semestre