Título: PF prende nove no Rio, entre eles um fiscal da Fazenda do estado
Autor: Mirelle de França e Carlos Vasconcellos
Fonte: O Globo, 16/06/2005, Economia, p. 26

Parede falsa com cofre foi encontrada em distribuidora ligada à cervejaria

RIO, RECIFE, BELO HORIZONTE, VITÓRIA e MARANHÃO. No Rio, a Operação Cevada prendeu ontem nove pessoas, de um total de 12 mandados de prisão expedidos pela 1ª Vara Federal de Itaboraí. Entre estes - a maioria de distribuidoras ligadas à Schincariol - está Paulo Fadigas de Souza, fiscal da Secretaria de Fazenda do estado. A operação, que no Rio contou com 200 policiais federais e 34 fiscais da Receita, também executou 21 mandados de busca e apreensão de documentos em endereços de pessoas físicas e jurídicas investigadas pelos crimes de formação de quadrilha, sonegação fiscal e fraude no mercado de distribuição de bebidas.

Foram presos Carlos Alberto Britto Vieira, diretor-regional da PR Distribuidora e da distribuidora Disbetil, em Itaboraí; Claydson de Souza Ferreira, gerente administrativo da Disbetil; Fernando de Carvalho, funcionário da distribuidora Dismar; José Carlos Barbosa Filho (Dismar), Mirtes Fabiana Temóteo Ribeiro (Disbetil); Neilson de Oliveira Ribeiro (Disbetil do Paraná); Roberto Borges de Almeida, gerente da Transpotencial Sudoeste; e Robson de Almeida Pinto, da Primo Schincariol.

Segundo o superintendente da Polícia Federal no Rio, José Milton Rodrigues, além de sonegação fiscal, os presos responderão por formação de quadrilha e fraude. No fim da tarde de ontem, eles foram transferidos da sede da PF para os presídios Ary Franco, Nélson Hungria e para a Polinter.

Superintendente: esquema pode ser internacional

O superintendente da Receita Federal no Rio, Cesar Augusto Barbiero, disse que ainda não é possível afirmar o quanto foi sonegado pela empresa, mas estima-se que, em alguns casos, a sonegação de impostos chega a 25% de cada operação.

Em frente à fábrica da Schincariol em Cachoeiras de Macacu, no Bar do Mazaropi, de Marlene Araújo das Neves, foram encontradas 87 placas de caminhão, a maioria sem indicação de cidade e estado ou lacre. Além das placas, Marlene tinha originais e cópias de documentos de veículos, além de contratos para aluguel de veículos de transporte de carga.

O bar era ponto de encontro dos caminhoneiros que serviam a Schincariol. Muito nervosa, Marlene alegou que apenas guardava as placas e os documentos a pedido de um amigo, um ex-caminhoneiro conhecido como "Alemão", que teria morrido num acidente.

Segundo a PF, a simples posse das placas não caracteriza crime, mas é um indício importante, pois elas podem ter sido usadas para simular a distribuição de cerveja em estados com ICMS menor, o que permitiria a entrega das bebidas a preços baixos. Já na distribuidora Disbetil, em Itaboraí, foi encontrado um cofre dentro de uma parede falsa.

Barbiero disse que as investigações apontam o envolvimento de dez agentes públicos no esquema. Há indícios de que fiscais da Fazenda e até policiais militares (que carimbavam notas como fiscais) estejam envolvidos. O superintendente da Receita afirmou que o esquema é sofisticado e envolve empresas no exterior:

- A rede montada pode ser até internacional, porque já estamos falando em crimes transnacionais, ligados à importação e exportação de um mesmo grupo (Schincariol).

O esquema internacional de sonegação acontecia tanto nas operações de importação quanto nas de exportação. Barbiero explica que eram feitas exportações fictícias, ou seja, a mercadoria ficava no Brasil. Já nas importações, há indícios de majoração de preços de insumos como cevada e malte.

No Estado do Rio, as 18 equipes da Receita e da PF chegaram à fábrica da Schincariol em Cachoeiras de Macacu às 6h, para apreender documentos, notas fiscais e computadores. Não havia executivos da empresa no local. Segundo os técnicos da Receita, os dados da unidade haviam sido transferidos para a sede da empresa, em Itu (SP).

Em Pernambuco, cinco pessoas foram presas: Eduardo José Lins Belém, João Severino dos Santos, Irlândia de Lemos Oliveira, João Rodrigues da Silva Júnior e João Rosendo de Oliveira. Mas o homem acusado pela PF de chefiar o esquema da Schincariol no estado, o empresário Marinaldo Rosendo Albuquerque, foi detido em São Paulo com seu contador, Luís Carlos Alves Soares. A PF não divulgou detalhes sobre o esquema no estado, mas informou que está investigando a Distribuidora de Bebidas Timbaubense (Disbetil) e a Surubim Bebidas e Alimentos (Subeal).

Em Minas Gerais, foram presas 11 pessoas nas cidades de Belo Horizonte, Contagem e Ipatinga. Entre eles há nove sócios-diretores e acionistas da Schincariol, além de dois funcionários públicos. Os nomes não foram divulgados.

Já em Vitória, no Espírito Santo, foram presas seis pessoas, incluindo o advogado Beline Salles Ramos, considerado o articulador do esquema no estado. Segundo a PF, ele conseguia liminares para reduzir o valor do IPI e, assim, diminuir a base de cálculo do ICMS (25%).

- Chegavam as notas fiscais "viajadas" e não as mercadorias. A diferença de ICMS era desviada para um caixa dois da Dismar Comercial Ltda., a maior distribuidora da Schincariol no estado - disse a delegada da Receita Laura Gadelha.

Em Imperatriz, no Maranhão, foi presa a empresária Cláudia Aparecida de Azevedo, proprietária da Dismar Brahma Distribuidora de Bebidas. Em sua casa foram apreendidas 25 caixas de notas fiscais em branco e documentos.

COLABORARAM Letícia Lins, Paula Rangel*, Aline Andrade* e Raimundo Garrone*(*) Especial para O GLOBO

inclui quadro: os principais pontos da operação