Título: BC FINALMENTE INTERROMPE CICLO DE ALTA DOS JUROS
Autor: Énio Vieira e Patricia Eloy
Fonte: O Globo, 16/06/2005, Economia, p. 29

Após nove meses de elevações, Copom mantém Selic em 19,75% ao ano diante de claros sinais de recuo da inflação

BRASÍLIA e RIO. O Banco Central (BC) encerrou uma das mais longas seqüências de alta dos juros básicos da economia (taxa Selic) ao mantê-los ontem em 19,75% ao ano, após nove meses sob bombardeio do setor produtivo, das entidades de trabalhadores e até mesmo de membros do governo e parlamentares da base aliada. O Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu por unanimidade segurar os juros após os sinais de recuo nos índices de preços - cuja pressão nos meses anteriores motivou o aperto monetário. Mesmo com a interrupção, o atual nível da taxa é o mais alto desde setembro de 2003.

Apesar da manutenção dos juros no mesmo patamar do mês passado, a taxa de juro real (isto é, descontada a inflação) subiu em relação a maio por causa da redução da inflação, e continua sendo a mais alta do mundo. O Brasil ostenta um juro de 13,9% ao ano no ranking global dos países com taxas reais mais elevadas, elaborado pela consultoria GRC Visão. O patamar é quase duas vezes e meia superior ao do segundo colocado no ranking, a Turquia, com juros de 5,9% ao ano.

No cenário, inflação em queda e expansão menor

Na equação analisada pela diretoria do BC, estava a recente queda da estimativas de mercado para a inflação em 2005, de 6,39% para 6,21% no último mês, ficando mais próxima da meta de 5,1% fixada pelo governo (cujo teto é 7%). A previsão para o IPCA - que orienta o sistema de metas de inflação - em 12 meses já está em 5,1%. A melhoria no cenário foi provocada pela forte valorização do real frente ao dólar, que tem impacto sobretudo sobre alimentos e preços administrados, e pela desaceleração do crescimento econômico no primeiro trimestre deste ano.

O comunicado distribuído após a reunião Copom não trouxe argumentação clara para a manutenção da taxa Selic. A decisão será explicada apenas na ata da reunião, a ser divulgada na próxima semana. No mesmo dia, o Conselho Monetário Nacional (CMN) define a meta de inflação para 2007. A de 2006 é de 4,5%.

"Avaliando as perspectivas para a trajetória da inflação, o Copom decidiu, por unanimidade, manter a taxa Selic em 19,75% ao ano, sem viés", diz a nota dos diretores do BC. Nas atas da últimas reuniões, o Banco Central alertou que, quando interrompesse a subida nos juros, iria manter a taxa básica estável por um período. As apostas são que os juros caiam a partir de setembro próximo e terminem 2005 em 18% ao ano.

Para mercado, juros caem noinício do segundo semestre

Mais otimista que a média do mercado, o economista Antonio Licha, coordenador do Grupo de Conjuntura da UFRJ, acredita que os juros já possam cair em julho ou agosto, ficando abaixo de 18% até o fim do ano:

- A inflação pelo IPCA ficou muito fraca em maio, em 0,49%, e para junho as projeções apontam para uma taxa de 0,30% a 0,35%. Esses dados, somados às últimas altas dos juros, que continuarão influenciando a economia nos próximos meses, fundamentam a possibilidade de redução da Selic já em julho.

O também economista Alexandre Póvoa, diretor da Modal Asset Management, avalia que o BC demorou demais para interromper o ciclo de alta dos juros e agora corre o risco de ver uma queda ainda maior na atividade econômica:

- O BC pode ter uma surpresa negativa nos próximos meses, com uma retração acima do esperado para a economia no segundo semestre. Mesmo sem novas altas de juros, o aperto monetário recente continuará influenciando negativamente a economia. O crescimento de 3,5% em 2005, de piso, virou teto das projeções, mas não acho improvável que fique abaixo dos 3% - estima.

Hugo Penteado, economista-chefe do ABN Amro Asset, ressalta que, apesar dos riscos para a economia, o BC precisa ser bastante cauteloso com o início da trajetória de queda:

- Se os juros caírem rápido demais, o dólar pode valorizar-se num ritmo acelerado, o que poderia gerar novas pressões inflacionárias.