Título: Dirceu: 'Lula, eu só errei numa coisa: deveria ter saído no caso Waldomiro'
Autor: Ilimar Franco e Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 17/06/2005, O País, p. 5
'Estou perdendo meu braço direito', reagiu o presidente ao ouvir o discurso
BRASÍLIA. O chefe da Casa Civil, José Dirceu, estava decidido a deixar o governo desde a noite do último domingo, quando entregou o cargo para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva numa longa reunião na Granja do Torto, como antecipou O GLOBO na edição de segunda-feira. Na reunião também estava o presidente do PT, José Genoino. Lula deixou o ministro livre para tomar sua decisão, mas avaliou que era preciso esperar até o depoimento do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), que ocorreu terça-feira. Ontem, Dirceu reconheceu que deveria ter saído ano passado, quando estourou o caso Waldomiro Diniz.
No despacho que teve com Lula na manhã de ontem, Dirceu chegou com a carta de demissão. Segundo relato de Dirceu a petistas e ministros, Lula ainda relutou:
- Você tem certeza que é isso mesmo? - perguntou o presidente.
- Lula, eu só errei numa coisa: deveria ter saído no ano passado, quando estouraram as denúncias contra Waldomiro Diniz (ex-assessor do Palácio flagrado cobrando propina de bicheiro). Ao me transformar em alvo, o objetivo da oposição é sangrar o seu governo. Fora do Planalto, estou livre para defender o governo, a minha honra e o PT - disse Dirceu.
Lula ficou emocionado:
- Obrigado por tudo.
Lula ofereceu a Dirceu o cargo de líder do governo. O ministro recusou. Ficou acertado que Dirceu voltaria como apenas mais um deputado da bancada. Ele também não vai ocupar a presidência do PT. Deve apoiar a reeleição de Genoino. Interinamente, fica no cargo de chefe da Casa Civil o secretário-executivo Swedenberger Barbosa.
Segundo amigos, a carta de demissão estava pronta desde sexta-feira da semana passada. O ministro só não saiu na quarta-feira para não parecer que estava acuado com o depoimento de Jefferson. O petebista disse que se Dirceu não saísse rápido, transformaria Lula em réu. No fim da tarde de ontem, Lula determinou que todos os ministros fossem ao Planalto. Vários deles chegavam surpresos ao 4º andar, onde fica o Gabinete Civil. Lula assistiu ao discurso de despedida pela televisão. Segundo um assessor, ele ficou com os olhos marejados, mas achou que Dirceu tomou a decisão certa.
- Ele teve grandeza. Estou perdendo o meu braço direito - comentou Lula.
A saída de Dirceu concretizou-se sete dias após o início de um debate interno sobre qual a melhor saída para enfrentar a artilharia da oposição. As opiniões se dividiam entre os que achavam que a saída do ministro é uma concessão à oposição e aqueles que consideram que isso levará a crise para longe do presidente Lula.
Dirceu bateu o martelo em almoço com Aldo Rebelo
As últimas horas de Dirceu como ministro foram marcadas por reuniões com Lula, ministros e com assessores. Ontem à tarde, pouco antes de anunciar sua saída, teve tranqüilidade de acompanhar Lula numa audiência com a seleção masculina de vôlei do Brasil, no gabinete do presidente.
Apareceu com semblante tranqüilo, apesar dos momentos tensos dos últimos dias. Pela manhã, ao chegar para a cerimônia, Dirceu demonstrava bom humor. Ao ser perguntado se ficaria ou não, respondeu:
- Quero falar e quero falar muito. Mas vou falar amanhã (hoje, nas reuniões do PT em São Paulo).
Pouco depois, foi irônico ao falar sobre sua saída:
- Alguém está preocupado comigo? Não sou tão importante assim!
Dirceu bateu o martelo em almoço com os ministros Aldo Rebelo (Coordenação Política) e Luiz Gushiken (Secretaria de Comunicação de Governo). Depois, intercalou encontros com Lula, quando entregou a carta de demissão, e sua equipe.
COLABORARAM: Monica Tavares e Cristiane Jungblut
Legenda da foto: DIRCEU: "Alguém está preocupado? Não sou tão importante assim!"