Título: Petista presidente da CPI reclama de fogo amigo do PT
Autor: Adriana Vasconcelos
Fonte: O Globo, 18/06/2005, O País, p. 9

'O maior adversário do PT não é a oposição. O maior adversário do PT somos nós mesmos', diz Delcídio, líder do partido

BRASÍLIA. O senador Delcídio Amaral (PT-MS), líder do PT e presidente da CPI dos Correios, manifestou ontem da tribuna sua indignação com o que chamou de fogo amigo do PT e cobrou a demissão do diretor de Gás e Energia da Petrobras, Ildo Sauer, uma indicação do partido. O líder petista atribuiu a Sauer informações publicada no "Estado de S.Paulo", que o responsabiliza por um contrato fechado pela Petrobras com as termoelétricas Eletrobolt e Macaé Merchant, controladas pelas companhias americanas Enron e El Paso, que teria provocado um prejuízo de pelo menos R$2 bilhões à estatal brasileira.

O contrato foi assinado quando Delcídio era diretor da Petrobras, no governo Fernando Henrique Cardoso.

- O que aconteceu hoje é um reflexo sublime do fogo amigo. No momento em que tenho uma responsabilidade extraordinária de conduzir, talvez, a presidência da CPI mais importante do Congresso, recebo, como lealdade e como respeito à minha honra pessoal, uma reportagem como esta. Por isso, precisamos fazer uma avaliação clara do nosso comportamento (do PT) - atacou Delcídio. E continuou:

- O maior adversário do PT não é a oposição. O maior adversário do PT somos nós mesmos, alguns companheiros que nos acusam injustamente, que querem pôr nas manchetes homens dignos. Esses bacanas que plantam dossiês sistemáticos em revistas e jornais nunca saíram de São Paulo. E essa molecagem tem nome e sobrenome: chama-se Ildo Sauer. Espero que a lucidez do presidente Lula neutralize esse elemento absolutamente nocivo à vida da Petrobras e à vida do governo.

Ao fim do discurso, Delcídio foi chamado ao Palácio do Planalto para uma conversa com o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo. Antes, porém, ele assinou um requerimento convidando Sauer e o presidente da Petrobras, José Eduardo Dutra, para prestarem esclarecimentos sobre a denúncia.

O petista disse esperar a solidariedade de seus companheiros de partido, sobretudo num momento em que teve a coragem de atender a um apelo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e assumir a presidência da CPI dos Correios:

- Para quem não sabe, estou me expondo à opinião pública tendo uma candidatura ao governo de Mato Grosso do Sul. Mas para defender o governo do presidente Lula, assumi com coragem, determinação e, tenham certeza, isenção.

Dilma ficou preocupada e prometeu estudar saída

O discurso de Delcídio teve repercussão imediata no Palácio do Planalto e, sobretudo, entre os petistas. Um dos primeiros a lhe telefonar foi o próprio presidente Lula, que pediu calma ao líder petista e admitiu já ter ouvido outras reclamações de Ildo Sauer. Outra que ficou preocupada com a reação de Delcídio foi a ministra das Minas e Energia, Dilma Rousseff, que prometeu estudar a sugestão de afastamento do diretor de Gás e Energia da Petrobras. O senador recebeu a solidariedade ainda do ex-chefe da Casa Civil José Dirceu e do ministro Jaques Wagner, do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Em todas as conversas, Delcídio deixou claro que não aceitará mais provocação:

- Não aceito mais esse tipo de coisa - avisou.

Procurado pelo GLOBO, Ildo Sauer não respondeu às ligações.

Em seu discurso de quase uma hora, Delcídio explicou as condições em que os contratos com as termoelétricas foram feitos, ressaltando que eles poderiam ter sido renegociados em 2003, quando o mercado de energia elétrica caiu 25% em função do racionamento.

- Quando falam que os contratos dessas usinas deram prejuízo de R$2 bilhões, eu pergunto: se o contratos já estabeleciam sua rediscussão a qualquer momento, inclusive por arbitragem, por que a diretoria responsável não chamou os parceiros para rediscutir esses contratos? Esta é a resposta que precisa ser dada e não acusações levianas - disse.

Em sua opinião, as pessoas que o acusam hoje, se não são incompetentes, têm má-fé:

- O presidente, hoje, mostra claramente o desejo de mudanças. Ele precisa olhar com carinho a necessidade de mudanças na diretoria da Petrobras. O presidente José Eduardo Dutra é um homem sério, mas precisa olhar algumas áreas com mais atenção, para que não criem confusões corporativas numa companhia tão séria e para que não fabriquem dossiês contra pessoas da casa, contra pessoas que já foram da casa e até contra parlamentares.

Delcídio recebeu a solidariedade tanto de colegas de bancada quando de representantes da oposição.

- Vossa Excelência fez parte do governo Fernando Henrique com honradez, numa atividade técnica. Conhecemos o ex-senador José Eduardo Dutra e tenho certeza de que ele será o primeiro a tomar medidas administrativas que permitam a correção dessa injustiça - observou o senador Tião Viana (PT-AC).

- Isso é fogo amigo de pessoas ligadas ao seu partido que desejam desestabilizá-lo. Com que objetivo? O de tirar a credibilidade do presidente da CPI ? É isso que um petista quer para o outro? Vossa Excelência tem a minha solidariedade - emendou o líder do PFL, Agripino Maia (RN).

Legenda da foto: DELCÍDIO: "O que aconteceu hoje é um reflexo sublime do fogo amigo"