Título: O segredo do cofre do PTB
Autor: Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 19/06/2005, O País, p. 3

Apontado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) como responsável pelo recebimento e distribuição de dinheiro para os candidatos petebistas nas eleições municipais do ano passado, o ex-diretor de Administração e Finanças da Embratur e tesoureiro informal do PTB, Emerson Palmieri, apresenta outra versão para a história. Palmieri confirma que recebeu, com Jefferson, os R$4 milhões mandados pelo PT das mãos do publicitário mineiro Marcos Valério. Mas sua participação teria terminado por aí. Ao GLOBO, ele revelou que entregou todo o dinheiro a Jefferson.

Palmieri nega que tenha feito a distribuição dos R$4 milhões, enviados em duas remessas. Ele conta que, com Jefferson, pôs o dinheiro no cofre do partido, localizado na quadra 303 Norte de Brasília, a sede do PTB. Depois disso, ele entregou a chave do cofre para Jefferson. Essa será a linha de defesa que Palmieri vai adotar junto ao Ministério Público, ao Conselho de Ética da Câmara e à CPI dos Correios. Já há requerimento do PSDB para que ele deponha no Conselho de Ética.

- Recebi o dinheiro junto com Jefferson. Colocamos o dinheiro no cofre do partido e entreguei a chave para ele. Depois disso, não sei o que ele fez com os R$4 milhões. Não participei da distribuição do dinheiro para os candidatos - afirmou Palmieri ao GLOBO, numa conversa informal durante o encontro do diretório do PTB, na última sexta-feira.

MP investiga envolvimento

Palmieri promete revelar mais detalhes em sua defesa nos depoimentos. Na sexta-feira informou que recebeu um questionário do Ministério Público Federal sobre o seu envolvimento no esquema de pagamento de mensalão e sobre a recepção e distribuição de recursos de caixa dois de campanha eleitoral.

Atualmente no cargo de primeiro-secretário do PTB, Palmieri se comprometeu a conceder entrevistas assim que fechar a estratégia de defesa com seu advogado. Alegou ainda estar com problemas de saúde na família.

Com aparência abatida e demonstrando preocupação com a repercussão de seu envolvimento em caixa dois de campanha, ele deixou a diretoria financeira de Embratur na semana passada. Palmieri se mostrou surpreso com a citação de seu nome por Jefferson. Acredita que ele fez isso para ter uma testemunha.

Segundo relato de Jefferson no Conselho de Ética, na primeira quinzena de julho do ano passado, o PTB recebeu do PT R$4 milhões em duas parcelas, uma de R$2,2 milhões e outra de R$1,8 milhão. Palmieri se nega a dar detalhes de como o dinheiro chegou ao PTB. O montante faria parte de um acordo de repasse de R$20 milhões para o partido.

- Não sei por que Jefferson me citou. Isso foi muito ruim para mim. Conversamos rapidamente sobre o assunto. Devemos ter uma nova conversa na próxima semana para esclarecer o assunto - comentou Palmieri.

Ele admite que conhece o publicitário Marcos Valério, a quem chama de Carequinha, e o tesoureiro do PT, Delúbio Soares:

- Lógico que conheço o Marcos Valério, o Carequinha. Mas tratávamos apenas assuntos de interesse partidário.

Sobre Delúbio, o ex-diretor da Embratur nega que tenha feito acerto financeiro. Ele conta que no ano passado teve "uma ou duas reuniões" com o tesoureiro do PT e outros petistas, mas para tratar de alianças e estratégias eleitorais.

- No partido, eu sou um homem administrativo. Não tinha poder para fazer acertos. Quem fazia isso era Jefferson - conta.

Em reportagem da revista "Veja" publicada em setembro do ano passado, Palmieri foi apontado como o "homem da mala" do PTB. Segundo a denúncia, ele teria distribuído em dinheiro vivo para parlamentares petebistas uma parcela do acerto feito com o PT: o reembolso de R$150 mil para cada deputado federal do PTB usar nas campanhas em seus redutos eleitorais.

Palmieri é personagem freqüente em histórias de campanha eleitoral. Em 2002, em reportagens sobre a existência de um caixa dois do então prefeito de Curitiba, Cassio Taniguchi (PFL), Palmieri aparecia como beneficiário de R$560 mil. Na ocasião, ele era um dos coordenadores da campanha presidencial de Ciro Gomes, que o afastou depois do escândalo. Palmieri nega participação no esquema de caixa dois de Curitiba:

- Meu nome sequer foi citado pelo Ministério Público. Fizeram comigo uma injustiça.

Ele conta que começou a carreira como administrador de campanhas ainda em 1986, quando era funcionário do então banqueiro José Eduardo Andrade Vieira, do Bamerindus. Na ocasião, Andrade Vieira queria lançar um candidato para deputado federal e encarregou Palmieri de fazer a campanha.

- Com o bom resultado eleitoral, acabei fazendo a campanha de Andrade Vieira para senador, em 1990, e participei das campanhas de Fernando Henrique em 1994 e depois, em 1998. Em 2002, como o PTB estava na campanha de Ciro, eu também ajudei - diz Palmieri.

A influência de Palmieri nos bastidores da política cresceu ao mesmo tempo em que aumentou seu patrimônio, segundo os adversários. Seu ex-patrão José Eduardo Andrade Vieira - ex-senador e ex-ministro dos governos Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso - é um dos que lançam suspeitas sobre "sinais exteriores de riqueza". Ele lembra que Palmieri era um funcionário de salário modesto no Bamerindus.

No período em que Andrade Vieira foi presidente do PTB, nos anos 90, Palmieri não recebia salário do partido, mas sim, do Bamerindus. Por isso, Andrade Vieira demonstra surpresa ao observar que Palmieri e sua família hoje possuem patrimônio significativo: uma grande fazenda no Paraná, gado, automóveis e motos.

- O Emerson Palmieri era um funcionário de nível médio-baixo e de salário modesto no Bamerindus. Nem ele nem a família nunca exerceram uma atividade econômica. Agora, de uma hora para outra, ele aparece com um grande patrimônio, comprando fazenda no Paraná. São sinais exteriores de riqueza. Com certeza esse dinheiro não vem do salário no PTB nem do salário no governo (Embratur) - afirma Andrade Vieira.

Com a saída de Andrade Vieira da vida pública, em 1998, Palmieri se aproximou do deputado José Carlos Martinez (PTB-PR). Na gestão de Martinez na presidência do PTB, Palmieri se consolidou na posição de tesoureiro informal do partido. Com a morte de Martinez, em 2003, continuou influente na gestão de Roberto Jefferson.

Palmieri no foco da CPI

A oposição avalia que Palmieri pode ser um dos principais focos de investigação da CPI dos Correios. O objetivo é investigar a conexão Delúbio-Valério-Palmieri. Será pedida a quebra dos sigilos fiscais, bancários e telefônicos dos três.

- As linhas de investigação estão chegando em personagens como Palmieri, Delúbio e Marcos Valério. Essa conexão poderá ser comprovada com a quebra dos sigilos telefônico, fiscal e bancário - observa o deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ), integrante da CPI.

- Temos que verificar o crescimento patrimonial de acusados como o tesoureiro do PTB, Emerson Palmieri. São indícios que podem ajudar a elucidação dos fatos - afirma a senadora Heloísa Helena (PSOL-AL), também integrante da CPI.