Título: O RISCO DA CPI
Autor:
Fonte: O Globo, 19/06/2005, Opinião, p. 6

Governos não gostam de comissões parlamentares de inquérito, como se sabe. E quando elas são inevitáveis, tratam de procurar controlá-las. A comissão instalada para investigar as evidências de corrupção nos Correios não escapou à norma, e o governo do PT, pelo menos na fase de montagem da CPI, agiu como qualquer outro.

Opondo-se à indicação do senador César Borges, do PFL baiano - liderado por Antonio Carlos Magalhães, hoje distante do Planalto - para presidir a comissão, o PT atropelou a tradição de se dividir o comando das CPIs entre situação e oposição. Foi para a disputa no voto e tomou conta dos postos de comando da comissão - que será pressionada a alargar a amplitude dos trabalhos para abranger o escândalo do mensalão.

Mesmo numa votação apertada, 17 a 15 - termômetro da desunião que reina nas hostes petistas - o partido escalou Delcídio Amaral (MS), líder petista no Senado, para presidir a CPI e entregou a relatoria da comissão ao peemedebista paranaense Osmar Serraglio. Com isso espera - ou esperava - impedir a ampliação da CPI, como deixou claro o relator aliado, após ser escolhido para o posto na votação de quarta-feira.

Mas o presidente da CPI tem sido conciliador. Delcídio tem prometido ouvir a oposição e admite ser inevitável tratar-se do mensalão. Afinal, ele se vincula à corrupção em estatais. Declara-se também consciente da importância da comissão para propostas de medidas que saneiem e modernizem a administração pública e o seu relacionamento com a política.

Que seja assim. Caso contrário, se a operação deflagrada para controlar a CPI - chamada por isso mesmo de "chapa-branca" - resultar no cerceamento das investigações, será grande a frustração na opinião pública, com desgaste ainda maior que o atual para governo, políticos, Congresso e instituições em geral.

Será impossível para a militância petista afastar a suspeita de que a determinação de Lula para que tudo seja esclarecido, custe o que custar, não passa de discurso vazio e dissimulador. O senador Delcídio Amaral tem razão. A CPI pode ajudar a aperfeiçoar o sistema político porque, na verdade, a partir do caso dos Correios, ela trata de algo bem mais amplo: a degradação da vida política, em que o mensalão é apenas uma das deformações.

Cercear as investigações é contrariar a opinião pública