Título: LÓGICAS
Autor: Luis Fernando Verissimo
Fonte: O Globo, 23/06/2005, Opinião, p. 7

O senador Pedro Simon foi o último brasileiro a acreditar na lógica. Durante muito tempo batalhou para que CPIs como a que expôs os corruptos do esquema PC Faria tivessem seu complemento lógico, uma CPI dos corruptores. Batalhou sozinho. Pensou que tinha a lógica do seu lado. A lógica - pelo menos como sinônimo de raciocínio comum, ou pseudônimo do óbvio - é que não tinha mais ninguém do lado dela. Prevaleceu uma versão do curioso princípio brasileiro segundo o qual só o parceiro passivo é homossexual, o outro é no máximo um oportunista. Finalmente até o senador Pedro Simon se deu conta de onde estava e desistiu da lógica. Nenhum dos grandes empresários que colaboraram com o sultanato do PC para terem favores do governo precisou se preocupar com uma CPI ou sequer um tapa na mão. Estavam apenas cuidando dos seus negócios. Sendo, no máximo, práticos.

Corruptores a salvo da lógica, habituados a comprar favores de políticos sem risco, tendem a confundir sua impunidade com superioridade moral e dar maus exemplos. Na compra de apoio ao governo no Congresso, se houve, o PT teria agido com o mesmo desdém do empresariado pelos políticos, convencido de que não é antiético pagar picaretas para fazerem o bem como não é imoral pagá-los por bons negócios. Se foi assim, não pegaram o espírito da coisa. Não podem se queixar por não estarem sendo julgados como os empresários, apenas homens práticos fazendo o que fazem todos para prosperar no Brasil. São o partido da ética ostentada, da alternativa nova a velhos maus hábitos - enfim, tudo que os outros não perdoam. O PT era temido por ser, ou se proclamar, diferente e vai ser condenado por ser igual a todo mundo. Ou um mau imitador de todo mundo.

E depois que até o senador Simon abandonou a lógica, parece que caímos no reino do ilógico. É ilógico pensar que estamos em meio a um golpe conservador contra um governo que, mais do que o anterior, faz a alegria da classe rentista - e não é necessariamente errado. Mas o senador pode se sentir desagravado em pelo menos um ponto, nesta crise. Enquanto corruptos confessos passam por paladinos da moralidade, desta vez todas as atenções estão nos corruptores.