Título: FALTA CONSCIÊNCIA SOBRE OS RISCOS
Autor: EDNA STRAUSS
Fonte: O Globo, 23/06/2005, Opinião, p. 7

A saúde pública no mundo enfrenta hoje uma situação muito séria em relação às doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) e suas conseqüências. A Aids, por exemplo, transformou-se num verdadeiro flagelo na África, estimulada pela ignorância, a crendice e a falta de recursos. No Brasil, apesar dos avanços registrados no controle e no tratamento da Aids, outras DSTs não recebem a mesma atenção por parte da mídia e das autoridades. É o caso das hepatites virais, especificamente o da hepatite B, uma doença altamente contagiosa, silenciosa em seus efeitos e potencialmente mortal.

Para que todos tenham uma idéia de sua gravidade, basta dizer que a hepatite B é dez vezes mais contagiosa do que a Aids e afeta hoje cerca de 400 milhões de pessoas no mundo, alcançando a posição de nona principal causa de mortalidade do planeta. Só no Brasil, 6 mil pessoas a cada ano descobrem que foram contaminadas pelo vírus.

Por conta dessa progressão, a estimativa do Ministério da Saúde é de que existam atualmente dois milhões de brasileiros portadores crônicos do vírus da hepatite B. Desses, pelo menos 300 mil precisariam de tratamento contínuo. Mas apenas 9 mil deles - isso mesmo, somente 3% - recebem assistência pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

A maior causa da falta de tratamento para esses pacientes é a desinformação. A hepatite B pode ser extremamente silenciosa e somente apresentar sintomas em seu estágio mais avançado. Isso significa que qualquer um de nós pode estar contaminado. Até porque o contágio pode ocorrer nas situações mais prosaicas possíveis: relações sexuais sem camisinha, manicures, dentistas, cirurgias, tatuagens, piercings etc.

Efetivamente a mais contagiosa das hepatites virais, a hepatite B é uma doença inflamatória e fibrosante que compromete as funções do fígado. Caso não seja diagnosticada em tempo e tratada adequadamente, a hepatite B pode levar a graves conseqüências, como cirrose e câncer hepático. A hepatite B é, portanto, potencialmente mortal. Vale a pena ressaltar que existe vacina eficaz para evitar a hepatite B, estando disponível para recém-nascidos, crianças e jovens até 19 anos.

Por tudo isso, a Sociedade Brasileira de Hepatologia (SBH) decidiu lançar nacionalmente a campanha "Hepa! Hepatite B: Preste Atenção", com o objetivo de conscientizar a população sobre a gravidade da doença. É importante realizar o teste para sua detecção, fazer o acompanhamento dos casos crônicos, estipulando tratamento quando necessário, e continuar alertando para a necessidade da vacinação.. A campanha está sendo estrelada pelo casal de atores Stênio Garcia e Marilene Saade, que têm um importante testemunho a dar aos brasileiros.

Marilene se contaminou com o vírus da hepatite B ao fazer uma tatuagem e passou por momentos de angústia e incerteza por não saber se sua doença se tornaria crônica. Nesse período, teve de abdicar de sua carreira para se tratar. Felizmente, graças aos cuidados adequados prescritos por um hepatologista, Marilene se curou e pode hoje ser uma ativa porta-voz da importância da conscientização pública sobre o risco da hepatite B. Stênio, ao fazer o exame diagnóstico, descobriu que tivera contato com o vírus, mas se livrara da doença, estando imunizado.

A campanha tem agora uma série de instrumentos para informar a população. Quem quiser mais informações sobre a doença pode acessar o nosso site (www.hepab.com.br) ou ligar para o nosso telefone 0800 286 8888. A ligação é gratuita.

Nosso objetivo é fazer com que as pessoas percebam o risco a que estão expostas, protejam-se e, caso considerem necessário, façam o teste para saber se estão infectadas. Avanços médicos oferecem atualmente uma boa notícia para os pacientes com hepatite B: o controle da doença pode ser conseguido com medicamentos, cada dia mais eficazes e com menos efeitos adversos, permitindo aos indivíduos com hepatite crônica viver suas vidas de forma praticamente normal.

Não podemos nos enganar. Apenas a educação e a consciência dos riscos a que estamos expostos podem levar a uma redução considerável da cadeia de transmissão de DSTs. A informação é seguramente a nossa maior aliada.

EDNA STRAUSS é médica e presidente da Sociedade Brasileira de Hepatologia (SBH).