Título: Em busca do centro
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 25/06/2005, O Globo, p. 2

O presidente Lula buscou o caminho natural, ainda que pedregoso, de uma aliança mais sólida com o PMDB depois que sua coalizão parlamentar foi detonada pelas denúncias de corrupção e o espectro ainda não materializado do mensalão. A primeira abordagem ocorreu ontem num clima sóbrio e aparentemente propício, mas ninguém ignora as dificuldades da costura. A premissa essencial foi colocada pelo próprio presidente, agora atuando pessoal e mais diretamente na administração de seus problemas políticos. A aliança se daria neste momento em torno da governabilidade, resultando naturalmente em maior participação dos peemedebistas no governo, mas não implicará em compromisso de natureza eleitoral em 2006. Sabe ele que, se ainda for o favorito na disputa, serão grandes as chances de ter o PMDB ao seu lado. Mas se estiver com a reeleição ameaçada, não haverá acordo feito hoje que resista quando chegar a hora H. Como desta vez seria um acordo institucional, reunindo as duas alas do partido, a proposta terá que ser aprovada por alguma instância da direção nacional. O presidente do partido, Michel Temer, e o presidente do Senado, Renan Calheiros, esperam que isso possa ser feito através de consulta às duas bancadas, Câmara e Senado, e à comissão executiva. Lula pediu pressa, eles pediram um prazo. Mas pelo menos a semana que vem deve ser consumida nessas consultas, atrasando a reforma ministerial que se espera ampla, podendo remover todos os ministros que serão candidatos em 2006. Isso significa que os ministros do PMDB, não sendo técnicos, serão senadores com mandato até 2010. ¿ Faremos o rito mais breve possível, entendemos as urgências do governo, mas até para a segurança de qualquer acordo, teremos que observar estes procedimentos ¿ dizia Renan, muito satisfeito com a conversa de ontem. Outra compreensão de Lula é a de que, para amarrar esta aliança, terá que garantir também o apoio dos sete governadores do partido. Se a contrapartida para as bancadas é a participação no governo, aos governadores o que é interessa é boa vontade federal para com suas administrações, tenha isso a forma de liberação de recursos ou mesmo de solução para problemas regionais. Lula pretende se reunir com todos eles, separadamente, ou em pequenos grupos. Não fará uma reunião coletiva com governadores. O grau de relacionamento varia, assim como as demandas de cada um. Mas chamará todos ao diálogo, inclusive Rosinha Garotinho, do Rio, apesar de seu marido, o secretário Garotinho, estar ameaçando ir à Justiça exigir que o PMDB cumpra a decisão anterior de deixar o governo. Fácil não será, por tudo que se conhece do PMDB. Mas nesta altura, Lula não tem alternativa dentro do sistema partidário. Pode até preservar apoios individuais no PP, no PL e mesmo no PTB. Mas agora, o governo carece de uma âncora mais segura ao centro. Os partidos acusados de receber mensalão não eram o centro e sim a margem movediça que deu no que deu. Ruralistas: as contas na crise A bancada ruralista é uma força considerável no Congresso e costuma arrancar concessões dos governos em horas de aperto. Ontem o presidente Lula ouviu reivindicações do setor, mas lá estiveram dois grupos distintos. O que representa a agroindústria tem queixas diversas, que vão do dólar depreciado, que prejudica as exportações, a questões tributárias, de crédito, cobertura para perdas etc. Já o grupo de proprietários rurais, mais diretamente representados pela bancada ruralista, quer novamente renegociar suas dívidas já tantas vezes roladas e negociadas. Isso, o governo repele, aparentemente unido. Logo depois da implantação do Plano Real, numa conjuntura desfavorável ao setor agrícola, o governo FH fez uma renegociação, a chamada securitização. Atendeu aos que deviam até R$200 mil. Trocou suas dívidas em bancos privados por títulos federais e concentrou os débitos no Banco do Brasil. Deu-lhes carência de cinco anos e 25 anos para o pagamento, a juros de 3%. Em 1997, entraram os que deviam mais do que esse valor. Em 2001, nova negociação trocou a correção monetária pela variação do preço do produto. Já no governo Lula (2003) instituiu-se o desconto de 30% para os que pagassem em dia. A inadimplência, entretanto, prosseguiu ao ponto de, neste mês de maio de 2005, 52 mil produtores (49 mil do primeiro grupo e 3 mil do segundo) estarem devendo mais de R$6,3 bilhões. ¿ Os números mostram que a pressão não vem de pequenos, mas de grandes e contumazes devedores, que não aproveitaram o bom momento da agricultura para começar a pagar ¿ diz o assessor presidencial José Graziano. Segundo ele, os que devem mais de R$100 mil hoje são responsáveis por 84% da dívida e representam apenas 40% dos devedores. O governo ameaça inscrevê-los na dívida ativa da União, mas pode sofrer conseqüências políticas na Câmara. Na próxima semana, haverá um ¿tratoraço¿, que promete reunir 15 mil agricultores na Esplanada. Em hora de crise, é facada de todo lado. AS SECRETARIAS temáticas, ameaçadas de extinção e fusão com a Secretaria-Geral da Presidência no enxugamento do governo, não dispõem de 2.500 cargos de confiança, como dizem os defensores da medida. Quem garante é a Secretaria da Mulher, que mandou fazer o levantamento, alegando que a economia de palitos não compensaria o desgaste político. Nesta secretaria os cargos de confiança são 42, na de Integração Racial, 43; na de Direitos Humanos, 93, e na de Pesca, 241. Mas o assunto voltou mesmo às considerações do presidente.