Título: HELICÓPTERO: TESTEMUNHA VIU TURBINA EM CHAMAS
Autor: Dimmi Amora/Marcelo Dutra/Taís Mendes
Fonte: O Globo, 29/06/2005, Rio, p. 21

Marinha descarta falta de manutenção, pericia destroços e espera concluir investigações sobre acidente em 60 dias

Piloto sênior de helicópteros, Evio Correia de Oliveira, de 72 anos, viu da janela de seu apartamento, na Rua Marquês de Abrantes, no Flamengo, o momento exato em que a aeronave da Marinha perdeu potência e caiu sobre o auditório do Instituto Bennett, anteontem à noite. A testemunha conta que a turbina do helicóptero já estava em chamas antes da queda e, segundos antes, ouviu uma explosão.

¿ Após o estrondo, o helicóptero começou a cair num ângulo de 30 graus, já com a turbina em chamas. Ao atingir o prédio, explodiu e partiu-se ao meio. O piloto foi hábil, evitou uma tragédia ¿ disse Evio, que tem 13 mil horas de vôo.

O vice-almirante José Antônio de Castro Leal, comandante do 1º Distrito Naval, descartou a hipótese de falta de manutenção. As investigações sobre a causa do acidente devem ser concluídas em 60 dias. Os destroços já estão sendo periciados na base da Marinha em São Pedro da Aldeia. Além da investigação técnica, a Marinha abriu um IPM para investigar as circunstâncias em que os pilotos Adriano Emerim Pinna e André Estácio de Freitas morreram.

Prédio do Bennett não sofreu abalo estrutural

O comandante do 2º BPM (Botafogo), tenente-coronel Ricardo Quemento, negou que o helicóptero tenha sido atingido por um tiro de fuzil, como chegou a ser especulado. O vice-almirante Castro Leal também considerou a hipótese improvável. O diretor de Aeronáutica da Marinha, vice-almirante José Carlos Cardoso, disse que nenhuma hipótese será descartada. A Infraero informou que a gravação da conversa do piloto com a torre de comando do Aeroporto Santos Dumont é sigilosa e foi entregue à Marinha. Segundo o Departamento de Aviação Civil (DAC), desde 2003 este foi o oitavo acidente com helicópteros no estado e o quinto na cidade.

Castro Leal esteve ontem no Bennett e ofereceu ajuda técnica para os reparos no prédio atingido. Nove oficiais da Diretoria de Obras Civis da Marinha vistoriaram o local. Técnicos da Defesa Civil do município também inspecionaram o prédio, mas não constataram qualquer abalo estrutural.

Para outros pilotos de helicóptero ouvidos pelo GLOBO, possivelmente um defeito mecânico fez o Bell Jet Ranger III cair. Segundo o piloto Aécio Malaguti, ex-piloto policial e instrutor da FAB, os tripulantes estavam fazendo um vôo de instrução visual noturno sem instrumentos, numa rota normal. Para Malaguti, provavelmente os pilotos não tiveram tempo de pousar na Praia do Flamengo.

¿ O piloto teve muita perícia, mesmo tendo perdido o controle ¿ avaliou.

Fontes da Aeronáutica disseram ao ¿Jornal Nacional¿ da Rede Globo que o plano de vôo era São Pedro da Aldeia-Santa Cruz-São Pedro da Aldeia. O helicóptero voltava de Santa Cruz quando o piloto pediu autorização para se aproximar do Cristo Redentor e, depois, para pousar no Santos Dumont.

O presidente da Associação de Pilotos de Helicóptero do Rio, Gustavo Ozolins, disse que há um acordo entre DAC e os pilotos para que os aparelhos voem naquela região a mil pés de altitude (350 metros), cerca de 300 pés (105 metros) mais alto que o permitido, para evitar incomodar com o barulho. Mas os helicópteros militares e da polícia podem voar mais baixo e em outras rotas.

As vítimas do acidente ¿ os capitães-tenentes Adriano Emerim Pinna e André Estácio de Freitas ¿ foram sepultadas ontem com honras militares. Laudos do IML concluíram que os dois militares morreram por ação contundente (pancada) seguida de carbonização.

Pilotos, embora jovens, eram experientes, diz Marinha

Piloto do 1º Esquadrão de Helicópteros de Instrução da Força Aeronaval, André foi enterrado no Cemitério Jardim da Saudade, em Sulacap. Ele faria 32 anos amanhã. A família, consternada, não quis dar entrevista. Amigos, que preferiram não se identificar, disseram que o piloto comentara recentemente que estava preocupado com as dificuldades financeiras da Marinha, citando o acidente com o porta-aviões São Paulo no mês passado. O capitão-de-corveta Carlos Alberto Macedo, do 1º Distrito Naval, garantiu que nenhuma crise financeira prejudicaria a manutenção de uma aeronave em missão.

Macedo explicou que o Bell Jet Ranger III pode ser bipilotado e os dois ocupantes tinham o mesmo nível de experiência, cerca de sete anos de vôo.

¿ Os pilotos se formam com aproximadamente 24 anos. Ambos já haviam participado de diversas missões de adestramento ¿ afirmou.

André tinha passado os últimos quatro anos fazendo cursos de pilotagem em bases aeronavais dos EUA, graças a um convênio. Ele era casado há quatro anos, morava na Zona Norte e não tinha filhos.

Já Adriano, também de 31 anos, foi sepultado no Cemitério Parque da Colina, em Niterói, aos brados de herói. O pai do militar, Luís Ancelmo Góis Pinna, não conseguiu acompanhar o cortejo e uma tia desmaiou. O vôo de anteontem foi um dos últimos de Adriano no Rio, antes de sua transferência para o 3º Esquadrão de Emprego Geral no Amazonas, onde ficaria por três anos. Segundo parentes, ele estava animado com a carreira e estava pronto para se mudar da casa onde morava com a mulher e a filha de 4 anos, em São Pedro da Aldeia.

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