Título: UMA SANGRENTA TERRA DE NINGUÉM
Autor: José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 29/06/2005, O Mundo, p. 30

LONDRES. Um ano atrás, a suposta entrega de poder pelos EUA a um governo interino iraquiano liderado por Iyad Allawi foi rotulada de marco na violenta História do Iraque pós-Saddam. Não foi o que aconteceu. A maior parte do Iraque é hoje uma sangrenta terra de ninguém sitiada por insurgentes cruéis, gangues de bandidos selvagens, patrulheiros americanos prontos para atirar e forças do governo saqueadoras.

As notícias vindas do Iraque são apenas deprimentes. Todas as estradas para sair da capital estão cortadas. A segurança iraquiana e os soldados americanos só conseguem circular em comboios fortemente armados. Há uma onda de assassinatos de altos funcionários iraquianos baseada em inteligência acurada. Ao todo, 52 importantes figuras religiosas e do governo iraquiano foram mortas desde a entrega do poder aos iraquianos. Em junho de 2004, insurgentes mataram 42 soldados americanos. Este mês, até agora, mataram 75.

A ¿entrega de poder¿ sempre foi um termo impróprio. Grande parte do poder permaneceu nas mãos dos EUA. Seus 140 mil soldados mantiveram o novo governo ocupado. Os membros do Gabinete de Allawi ficaram conhecidos pela quantidade de tempo que passaram fora do país. Seguros no exterior, freqüentemente fizeram discursos otimistas prevendo o eminente fim da insurgência. Apesar disso, o número de militares e policiais iraquianos mortos a cada mês aumentou de 160, na entrega do poder, para 219, hoje.

Houve dois outros supostos marcos importantes ao longo do ano. O primeiro foi a captura por fuzileiros navais americanos da fortaleza rebelde de Faluja, em novembro, após um banho de sangue que deixou a maior parte da cidade de 300 mil moradores em ruínas. Em janeiro, houve eleições gerais, nas quais xiitas e curdos triunfaram.

A queda de Faluja não quebrou a espinha da resistência. Os rebeldes foram lutar em outros lugares e capturaram a maior parte de Mossul, cidade bem maior. Na entrega do poder, o número de guerrilheiros estrangeiros era estimado em ¿algumas centenas¿. Agora, em pelo menos mil, sendo o total de rebeldes estimado em 16 mil.