Título: CONFRONTO NA ROCINHA FECHA A LAGOA-BARRA
Autor: Ana Cláudia Costa e Gustavo Goulart
Fonte: O Globo, 28/06/2005, Rio, p. 15

Estudante de 15 anos é morto na laje do barraco e 3 pessoas saem feridas no tiroteio entre polícia e traficantes

Mais um tiroteio na Favela da Rocinha levou pânico a moradores de São Conrado na manhã de ontem. Um estudante de 15 anos morreu e três pessoas ficaram feridas no morro durante o confronto entre policiais da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) e traficantes. Bandidos jogaram morteiros em direção à Auto-Estrada Lagoa-Barra, que precisou ser fechada ao trânsito nos dois sentidos por volta das 9h10m durante dez minutos. O congestionamento chegou à Gávea. Um helicóptero da polícia, que participou da operação, foi atingido por três tiros de traficantes. A troca de tiros é mais um episódio da guerra entre traficantes da Rocinha e do Morro do Vidigal, que começou em abril de 2004. A operação da polícia tinha o objetivo de capturar o chefe do tráfico na favela, Erismar Rodrigues Moreira, o Bem-Te-Vi. O tiroteio na Rocinha começou por volta das 7h, quando cerca de 70 homens da Core subiram a favela com a informação de que o bandido estaria numa casa próxima a uma creche. O delegado-titular da Core, Marcos Reimão, disse que a operação foi para evitar que Bem-Te-Vi invadisse o Morro do Vidigal, para tomar as ¿bocas-de-fumo¿ da parte baixa da favela. Remoção impede a realização de perícia Durante a troca de tiros, o estudante Lucas Batista de França, de 15 anos, foi baleado no rosto quando estava na laje de sua casa. A vítima, que ficou estendida no chão e coberta com um cobertor, foi retirada da favela por policiais da Core e levada para o Hospital Miguel Couto. Segundo Reimão, o jovem foi transportado para o hospital na carroceria de uma picape da polícia porque ainda estava respirando. Moradores e parentes, no entanto, choravam em desespero e diziam que ele estava morto. Quando uma vítima morre em área confronto, a Polícia Civil deve fazer perícia do local e o corpo precisa ser recolhido pelo Corpo de Bombeiros. Marcos Reimão informou que o pai da vítima e um amigo do rapaz que também estava na laje constataram que a vítima ainda estava viva quando foi socorrida. Segundo ele, a perícia no Instituto Médico-Legal não conseguiu identificar o calibre da arma que matou o jovem porque o projétil estava fragmentado. O delegado, no entanto, disse que as armas dos policiais usadas na operação estão à disposição para qualquer confronto balístico. O tiroteio fez com que moradores, assustados, corressem para se abrigar. Parte do comércio próximo ao local do confronto, após a Rua do Valão, fechou as portas. O soldado Júlio Cesar de Andrade Barbi ficou ferido ao cair de um barranco, próximo ao Posto de Policiamento Comunitário (PPC) da PM, quando tentava se proteger das balas. Policiais do 23º BPM (Leblon) reforçaram o policiamento nas entradas da Rocinha. Na troca de tiros, o pedreiro José Ricardo da Silva, de 22 anos, foi baleado de raspão na cabeça quando ia para o trabalho. Houve correria e o pedreiro foi socorrido pelo próprio delegado Reimão, sob a passarela, no meio de intenso tiroteio. O pedreiro foi levado para o Hospital Miguel Couto e teve alta no início da tarde. Uma moradora, identificada como Cláudia de Mendonça, de 27 anos, baleada de raspão na barriga, foi levada para o Miguel Couto e também liberada em seguida. Michael Duarte de Souza, de 24 anos, também foi baleado na perna esquerda e levado por moradores da favela para o Hospital Lourenço Jorge, na Barra. De acordo com informações da polícia, ele seria ligado ao tráfico. Na operação, a polícia apreendeu, numa laje próxima ao local onde estaria o traficante Bem-Te-Vi, um colete, um radiotransmissor, dois revólveres calibre 38, duas granadas e nove carregadores (pentes de balas) de fuzil 7,62. Nove pessoas foram detidas. Revoltado, o pai do estudante, Fernando da Silva Gonçalves de França, de 41 anos, disse que o filho cursava o ensino médio no Ciep Ayrton Senna da Silva. Segundo Fernando, que é lanterneiro e mora desde que nasceu na Rocinha, o filho tinha subido na laje para ligar a bomba da caixa d¿água. ¿ Eu cansei de avisar a ele para não subir na laje quando a polícia está no morro porque é perigoso. Meu filho foi atingido com um tiro no rosto¿ disse. Ao tomar conhecimento de que o jovem era estudante, o delegado Marcos Reimão fez um apelo para que moradores fiquem dentro de casa quando a polícia entrar no morro. ¿ Quando a polícia estiver no morro, não fiquem nas lajes, fiquem dentro de casa. Na laje, ficam os ¿olheiros¿, os traficantes. Quando a polícia atira, quem está na laje pode ser atingido ¿ disse o delegado. À tarde, policiais da Core voltaram a subir a Rocinha. Segundo Reimão, havia informações de que traficantes estavam escondidos na mata entre as favelas da Rocinha e do Vidigal. Novamente traficantes fizeram disparos e soltaram fogos. Policiais da Core deixaram o morro no fim da tarde, sem novas prisões.