Título: As relações do tesoureiro do PT com as agências contratadas pelo governo
Autor: Regina Alvarez
Fonte: O Globo, 26/06/2005, O País, p. 3

Marcos Valério, acusado de levar malas de dinheiro do PT para aliados, é um dos publicitários ligados a Delúbio

As relações do tesoureiro do PT, Delúbio Soares, com as agências de publicidade que atendem ao governo não se restringem a Marcos Valério Fernandes de Souza, sócio da DNA Propaganda e da SMP&B. Nestes dois anos e meio do governo Lula, o tesoureiro construiu e cultiva relações e amizades nessa área que vão além de Valério, apontado como o seu braço direito e acusado de levar malas de dinheiro para o PTB, em nome do PT, nas eleições do ano passado.

O Banco do Brasil é um dos principais elos das relações de Delúbio com a publicidade oficial. Além da DNA de Valério, Delúbio mantém relações próximas com o publicitário Mauro Montorin, diretor da Ogilvy, uma das três agências que atendem ao BB. Montorin também é próximo de Ivan Guimarães, outro amigo de Delúbio, que até abril deste ano era presidente do Banco Popular do Brasil, subsidiária do BB criada no governo Lula para atender à população de baixa renda e excluída do sistema bancário. Guimarães e o tesoureiro do PT se conhecem há 18 anos. Juntos e com a ajuda do atual diretor de Marketing do BB, Henrique Pizzolato, trabalharam na última campanha do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva arrecadando fundos.

A amizade de Montorin com Guimarães também é antiga. Eles foram fundadores da empresa NetCash, criada no fim dos anos 90, que desenvolve sistemas de comunicação de dados para correspondentes bancários, e trabalharam no Lemon Bank, que também atua na área. No fim de 2003, Montorim foi convidado para trabalhar no Grupo Total, que reunia as agências Calia Assumpção e Fischer América. A Calia ganhara a conta do BB, junto com a Ogilvy e a DNA. Montorin passou a atender ao BB pela Calia (que virou D+ Brasil) até ir para a Ogilvy.

- Gosto do Delúbio e, se ele me considerar um amigo, vou achar muito bom - disse Montorin.

Ele afirma que tem relações sociais com Delúbio e atribui à sua competência profissional a indicação para dirigir a agência D+ Brasil, do Grupo Total, e, mais recentemente, a Ogilvy. As empresas do Grupo Total abocanharam durante o governo Lula as contas do BB e da CEF. O publicitário Eduardo Fischer, das agências D+ Brasil e Fischer América, não vê problema em suas agências atenderem a dois bancos concorrentes e diz que mal conhece Delúbio. Teria se encontrado com ele duas vezes.

Já as relações de Delúbio com o publicitário Duda Mendonça, guru de marketing do presidente Lula, são também cordiais, e nos bastidores do governo a informação é que atuam em campos independentes. No feriado da Semana Santa de 2003, Duda e Delúbio se encontraram no Condomínio Estrela Vermelha, em Porto Murtinho (MS), para uma pescaria patrocinada pelo governador do estado, Zeca do PT, um dos proprietários do local. Ali teriam selado um acordo de convivência pacífica nessa área da publicidade.

Duda atende à Presidência e, juntamente com as agências Lew, Lara e Matisse, é responsável por toda a publicidade institucional do governo, concentrada na Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica (Secom). No ano passado, só através dessa conta as três agências receberam R$150 milhões, embora seja um valor bruto, pois inclui os repasses aos veículos de comunicação. O publicitário atende ainda à Petrobras e ao Ministério da Saúde.

As relações entre as agências que atendem às contas do governo e das estatais são cercadas de códigos de boa convivência. Prevalece a percepção de que ninguém consegue fazer parte do seleto grupo sem as bênçãos de dois grupos influentes. De um lado, estariam o ministro Luiz Gushiken, da Secom, responsável por ditar as linhas e monitorar as campanhas do governo, e o publicitário Duda Mendonça. Do outro, o tesoureiro Delúbio e seu fiel escudeiro Valério.

O governo gastou ano passado com publicidade oficial R$867,1 milhões. Todas as agências são contratadas por licitação, mas alguns critérios de seleção têm elevado grau de subjetividade. No início do governo Lula, a Secom centralizou a publicidade e boa parte dos ministérios perdeu a autonomia sobre a verba. Este ano, está acontecendo movimento inverso e pelo menos três ministérios fizeram licitação para contratar agências. A Secom diz que nunca houve interferência de Delúbio e que as relações com Montorin e Valério se restringem à sua condição de representantes de agências.