Título: BNDES SOCORRE A LIGHT
Autor: Mirelle de França/Ramona Ordoñez/Deborah Berlinck
Fonte: O Globo, 30/06/2005, Economia, p. 21

Banco libera R$727 milhões, porém, impõe mais exigências para ser sócio

Depois de uma longa negociação, o BNDES anunciou ontem uma ajuda de R$ 727,2 milhões à Light. Para liberar o financiamento, no entanto, a instituição tornou mais duras as regras originais do programa de apoio às distribuidoras de energia elétrica, lançado em 2003, e ao qual apenas a Light aderiu. Agora, o empréstimo somente será transformado em ações do banco na Light se a empresa ganhar dinheiro novo de seu controlador ou reduzir suas perdas operacionais (com furto de energia, sobretudo) - ou fizer os dois juntos. Além disso, caso a gigante francesa EDF, acionista majoritária da Light, decida vender o controle, o BNDES deverá ser consultado. Se não concordar, pode pedir a quitação antecipada do financiamento.

Apesar de falar inicialmente em transformar até 50% do empréstimo em participação acionária, o BNDES admite converter até 100%, o que deixaria o banco com 30% da Light. Mas essa outra metade fica a critério - este não divulgado - do banco. Hoje, a EDF tem 95% e acionistas minoritários, 5%. Se o BNDES se tornar sócio, a participação da francesa pode cair para 65%.

Proteção contra risco do negócio

A Light, que espera receber os recursos em dez dias, não escondeu sua frustração pelo fato de o BNDES não entrar de imediato como acionista. A conversão do empréstimo de US$400 milhões, dado pela EDF à Light há dois anos, em capitalização da distribuidora - uma das condições do programa - será imediata. Mas o presidente da distribuidora, Jean Pierre Bell, disse que a EDF ainda não decidiu se vai injetar dinheiro novo para ter o BNDES como sócio. E, segundo ele, esse aporte tanto poderá vir da EDF como de um novo acionista:

- Continuamos achando fundamental ter um sócio brasileiro no capital da empresa e querendo o BNDES como nosso parceiro.

Outra das condições para acessar a linha de crédito do BNDES era a renegociação das dívidas da Light com os bancos credores. Ela já renegociou US$660 milhões e precisa apenas assinar o acordo. A dívida total da Light é de US$1,5 bilhão, ou cerca de R$4 bilhões.

A linha de ajuda ao setor, de R$3 bilhões, foi lançada em 2003 e o prazo para adesão termina hoje - mas a Light será a única contemplada. A mudança nas regras, feita sob medida para a distribuidora fluminense, é uma forma de proteger o banco, além de forçar a companhia a melhorar sua situação financeira, disse o vice-presidente do BNDES, Demian Fiocca.

- Todos esses detalhes compõem uma segurança do banco diante de uma operação que tem risco. Trata-se de uma reestruturação. Mas acreditamos que a empresa vai ingressar num período de melhoria - explicou Carlos Kawall, diretor da área Financeira do BNDES.

As garantias do empréstimo continuam sendo os recebíveis da empresa, ou seja, a receita com a venda de energia aos consumidores.

Segundo Fiocca, oito empresas chegaram a ser enquadradas no programa de ajuda ao setor elétrico, mas apenas quatro tiveram os projetos aprovados: Coelba (Bahia), Cosern (Rio Grande do Norte), Celpe (Pernambuco) e a própria Light. As três primeiras desistiram porque conseguiram se recuperar.

O mercado especula sobre a venda total do controle da Light, e ontem a EDF deu um mau sinal à distribuidora. A empresa anunciou um acordo para vender ao Grupo Dolphin, um fundo de investimento argentino, 65% de seu capital na Edenor, a principal distribuidora de eletricidade na Argentina, mantendo 25%. Isso confirma os planos do grupo de encerrar maus investimentos na América Latina e se concentrar no mercado europeu. A operação com o BNDES poderá evitar o pior: a saída brutal da EDF do Brasil. A empresa não fala sobre planos de venda.

Ontem, o mercado não se animou com o anúncio do financiamento do BNDES. As ações ordinárias (com direito a voto) da Light encerraram o pregão em queda de 0,17%, cotadas a R$56,60.

(*) Correspondente

COLABOROU Patricia Eloy

inclui quadro: entenda a operação / o programa original / o acordo fechado ontem com a light / a light em números