Título: CRISE DE QUALIDADE
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Fonte: O Globo, 03/07/2005, Opinião, p. 6

Pelos dados da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em uma década foi multiplicado por mais de oito o número de cursos privados de direito no Brasil, que hoje somam nada menos de 864, formando a cada ano cerca de 70 mil advogados. Mas apenas uma pequena minoria poderá de fato exercer a profissão. Porque, juntamente com essa impressionante proliferação, veio também uma deterioração de qualidade generalizada.

Em São Paulo, por exemplo, 87,8% dos mais de 20 mil inscritos no exame da OAB-SP foram reprovados na primeira fase, em maio ¿ recorde absoluto de reprovações desde que foi instituído o exame, em 1971.

Encontrar as origens desse quadro não é difícil. Como informa a própria OAB, nos últimos três anos ela deu parecer favorável à criação de não mais de 19 cursos, enquanto o Ministério da Educação permitiu que fossem criados 222. Esse número absurdamente alto já seria indício claro de que há algo de inadequado com os critérios do MEC; e as reprovações em massa no exame da Ordem são a comprovação definitiva dessa insuficiência.

O ministro Tarso Genro criou ao fim de maio uma comissão com a tarefa de fiscalizar a qualidade dos cursos de direito. O MEC pretende também estabelecer mecanismos permanentes de fiscalização e tornar mais rigorosas as exigências para permissão de abertura de cursos.

São medidas adequadas e necessárias, mas insuficientes. Porque não basta impedir a abertura de novas fábricas de diplomas, é necessário também punir as já existentes ¿ e se em alguns casos é possível um esforço de recuperação, na maioria a única saída possível é o fechamento.

Nesse sentido, a avaliação por meio do Enade, como por seu antecessor, o Provão ¿ instrumento de avaliação melhor que o Enade ¿ de pouco tem valido, pois até hoje nem um nem outro serviu de base para tais decisões duras mas necessárias.

É certo que o exame da OAB não permite que exerçam a atividade de advogado aqueles que, embora tendo recebido o diploma, não estão qualificados para tal.

Mas isso não justifica que se permita que continuem existindo cursos de baixíssimo nível ¿ nos quais esse problema da qualidade provavelmente sequer é levado em consideração.