Título: O cerco se fecha
Autor: Ilimar Franco
Fonte: O Globo, 04/07/2005, O Globo, p. 2

Há 12 anos a cúpula do PMDB na Câmara foi desmantelada pela CPI do Orçamento. Agora é a vez de o PT passar pelo mesmo processo. A CPI dos Correios está apenas engatinhando, a CPI do Mensalão nem saiu do forno, e cabeças petistas já estão rolando. O PT não tem mais comando, está atolado no terreno da ética e sua fragilidade resulta no enfraquecimento político do governo Lula.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva cada vez depende mais de seu próprio carisma, de seus aliados, sobretudo do PMDB governista, e da boa vontade da oposição. O PT perdeu a capacidade política de ser o fiador da sustentação do governo Lula. Os seus principais dirigentes estão acuados. O ex-ministro José Dirceu (PT-SP) se recolheu aos bastidores para não ter um enfrentamento direto, e eventualmente letal, com o presidente licenciado do PTB, Roberto Jefferson (RJ). O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP), por causa de suas ligações com o empresário Marcos Valério de Souza, resolveu submergir.

No plano interno a situação é a mesma. As tendências Democracia Socialista, Articulação de Esquerda, Ação Popular Socialista e Movimento PT vêem no episódio a oportunidade de acabar com a hegemonia da Articulação, grupo que comanda o PT desde 1995. Não é à toa que seus membros estão defendendo o adiamento das eleições internas marcadas para 18 de setembro. O presidente do PT, José Genoino, candidato à reeleição, foi torrado por causa das relações financeiras com Marcos Valério. Muitos petistas consideram insustentável sua permanência na presidência, bem como a de Delúbio Soares, Silvio Pereira e Marcelo Sereno. Dizem que o PT precisa sair do imobilismo e isso requer uma direção que não esteja comprometida pelo passado e que atue pensando no futuro.

Os partidos de oposição estão indo com tudo para cima do governo e do PT. Eles querem o que for possível: um presidente fraco nas eleições de 2006 ou um presidente que não termine o mandato. O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), sugere que o presidente Lula renuncie a uma candidatura à reeleição. Já o deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA), no depoimento de Roberto Jefferson na CPI dos Correios, não dissimulou intenções. Na sua intervenção afirmou que o presidente Lula foi conivente com o mensalão, pois se ele tivesse agido depois da audiência de janeiro, Jefferson não teria voltado a se queixar em 23 de março.

Frase do líder do PT na Câmara, Paulo Rocha: ¿A situação é difícil, mas não é impossível. Os fatos calaram fundo na militância. Mas ninguém roubou, ninguém enriqueceu¿.

A reforma política empacou

Apesar de ter sido aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, ainda não será desta vez que haverá um esforço coletivo dos partidos para aprovar a reforma política. O PFL e o PSDB não concordam com a redução da cláusula de desempenho de 5% para 2% dos votos nacionais à Câmara. O presidente do PFL, Jorge Bornhausen (SC), quer que seja cumprido acordo firmado entre os presidentes do PT, do PMDB, do PSDB e do PFL.

Este acordo previa votar a fidelidade partidária e a federação de partidos para entrar em vigor nas eleições gerais de 2006. O financiamento público, o fim das coligações nas eleições para o Legislativo e a votação em lista valeriam a partir das eleições de 2008. Pelo acordo seria mantida a cláusula de desempenho, que garante aos partidos acesso ao horário de propaganda na TV e o recebimento do Fundo Partidário.

A redução da cláusula era defendida pelo PCdoB, pelo PPS e pelo PV, mas depois dos escândalos dos Correios e do mensalão ganhou o reforço dos partidos que ficaram na lama: PTB, PP e PL.

CPI aprovada

As CPIs no Congresso são o melhor instrumento da investigação para 46,2% dos ouvidos em pesquisa telefônica feita pelo DataSenado. Foram entrevistadas 506 pessoas de 16 a 20 de junho. Em segundo lugar, com 37,9%, vem a Polícia Federal; 74,5% dos ouvidos disseram que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), deve dar apoio relativo ao governo. Outros 22,5% afirmaram que ele deveria dar apoio irrestrito.

O PRESIDENTE do PL, Valdemar Costa Neto (SP), passou o domingo reunido com advogados, em São Paulo, preparando um discurso que deve fazer hoje no plenário da Câmara. Seus assessores dizem que será tão bombástico quanto o de Roberto Jefferson.

A ASSESSORA especial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva Clara Ant esclarece que não participou de nenhum grupo de trabalho sobre reforma administrativa.

E-mail para esta coluna: ilimar@bsb.oglobo.com.br

No sal

Candidato a presidente do PT pela Democracia Socialista, o ex-prefeito de Porto Alegre Raul Pont diz que o tesoureiro Delúbio Soares perdeu a confiança do partido. Lembra que na última reunião do diretório nacional, Delúbio garantiu que não havia relação entre o PT e o empresário Marcos Valério de Souza. Eles seriam apenas bons amigos. O aval num empréstimo, revelado por ¿Veja¿, jogou a versão de Delúbio no lixo.